Lágrimas por Fátima num lento regresso à normalidade

Lágrimas por Fátima num lento regresso à normalidade

COLOCAR A DIGNIDADE DA PESSOA E DO TRABALHO NA CENTRALIDADE DO MOMENTO

Ao iniciar este artigo resvala uma lágrima pelo meu rosto. Em primeiro lugar por não poder participar nas cerimónias do 13 de Maio em Fátima, uma época tão especial para a maioria dos portugueses e do mundo. Sei que seriam tomados todos os cuidados preventivos face à doença Covid-19. Creio mesmo que constituiria um verdadeiro exemplo. Mas aceito e respeito a decisão tomada com a certeza de que Nossa Senhora de Fátima intercederá por todos nós. Só quem não participou alguma vez nessas cerimónias desconhece o espírito sobrenatural e de comunhão que se vivencia no Santuário de Nossa Senhora de Fátima. A procissão das velas constitui um momento único. Pronto, já desabafei!

Contudo, as lágrimas insistem em cair, agora por outros motivos que partilho. Entrei há dias no elevador do prédio e olhei para o espelho. Não reconheci a imagem. O semblante algo triste, ar abatido, rosto branco como a cal, o cabelo por arranjar… Meu Deus, tenho de fazer algo pela minha auto-estima. Graças a Deus já se pode ir ao cabeleireiro. Telefonei e marquei antes que me arrependesse. Atendeu-me um técnico brasileiro que me foi confidenciando os momentos difíceis que vivenciara. Não tinha família em Portugal. Mas graças a Deus, ainda que lentamente e com toda uma série de regras que reconhecemos serem importantes, o trabalho recomeçava. Tinha passado algumas dificuldades. Quando paguei e ia a sair, ele passou à minha frente, feliz, com o dinheiro na mão e disse que ia comer um hambúrguer. Ainda se encontrava em jejum. Já tinha partilhado comigo que ia passar a trazer o almoço. Fiquei comovida. Tinha a certeza que iria fazer algumas compras de supermercado e recomeçar lentamente a sua rotina.

Resolvi andar um pouco a pé. Sentir a cidade. Já tinha tido alguma dificuldade em estacionar. Contudo, a cidade ainda se apresentava com pouco movimento. As poucas lojas abertas não tinham os clientes habituais. Era o recomeço. Os bancos da avenida estavam cobertos de fitas para que ninguém se sentasse. Alguns restaurantes tinham aberto para o serviço de “take away” mas já se encontravam fechados. Mais à frente, um mendigo dormia num banco sobre as fitas, com uma garrafa de vinho ao lado. Desolador mesmo. Uma das minhas irmãs telefonou-me, pedindo que visse se os jardins da Fundação Gulbenkian já se encontravam abertos ao público. Contudo decidi regressar para o carro e ir-me embora. Tinha-me apercebido de que a retoma iria ser muito complicada a diferentes níveis. É preciso, cada vez mais, não perder a esperança e o espírito de solidariedade, que vai ser muito necessário. Por esse motivo, Fátima constituiria um bálsamo muito importante para quem crê. «A fé é semelhante a um clamor, a esperança de ser salvo na certeza de que Deus escutará quem pede. Vem ao nosso coração com a sua paz e a sua alegria. Abramos o nosso coração ao Amor de Deus Pai que saberá ouvir-nos. Eu vim como luz para que aquele que crê em mim não permaneça nas trevas. Misericórdia e Paz ao Mundo inteiro» (Papa Francisco).

Regressei a casa. Passei pela sede da Fundação Gulbenkian. Já se encontravam abertos os seus belos jardins. Graças a Deus! Subitamente veio-me à memória o Dia da Mãe, primeiro dia de desconfinamento. O meu filho, a minha neta e a sua mãe vieram almoçar a minha casa. Há dois meses que a minha neta e a sua mãe não saiam de casa. A alegria da minha neta era contagiante. Queria ajudar, servir o almoço, levantar os pratos. Como estava feliz a trazer uma travessa com o prato quente! Depois fomos dar um passeio no parque. Não parou um momento. Correu, saltou, brincou, tirou fotografias, viu outras crianças na companhia dos pais e avós. Já de partida no elevador ouvi-a dizer: «Foi um dia muito feliz!». Ainda bem que na sua memória ficarão alguns momentos felizes deste período de confinamento social. O Papa Francisco num “tweet” referiu: “No meio deste isolamento que nos faz padecer a limitação de afectos e encontros e experimentar a falta de tantas coisas, ouçamos mais uma vez o anúncio que nos salva: Cristo ressuscitou e vive ao nosso lado”. Também em Fátima no dia 13 de Maio de 2017 proferiu as seguintes palavras aos milhares de fiéis, no recinto do Santuário de Nossa Senhora de Fátima: «Queridos peregrinos, temos Mãe, temos Mãe!».

Muito agarrados à Virgem Maria vivamos com esperança esta nossa etapa de vida para todos nós! Uma esperança real que procuraremos sempre manter viva, sobretudo em tempos de confinamento social e da grave pandemia que a tantos afectou. Santa Maria, esperança nossa, intercedei pelo seu terminus em prol do bem da Humanidade e de todos os que sofrem por diferentes motivos.

Maria Helena Paes

Escritora

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *