CARNE DE VACA, FEMINISMO E POPULISMOS

CARNE DE VACA, FEMINISMO E POPULISMOS

Certa luta ideológica sem lógica, perverte a ordem e promove a desordem

Santo Agostinho relaciona a paz com a tranquilidade da ordem. Quando as coisas estão ordenadas segundo Deus, há paz; criando-se desequilíbrios, surgem os conflitos. Ora, quando existe uma determinada ordem, e começam a criar-se sofismas para alterar a razão das coisas, cria-se um desequilíbrio que pode conduzir à ruína de toda a harmonia pré-existente. É como uma pequena mentira motivada por interesses, que tende consequentemente a mentiras maiores para fortalecer a falsa posição inicial. O problema é que o mentiroso compulsivo começa a viver na sua pseudoverdade, e à custa de tanto repetir as mesmas inverdades, começa a acreditar nelas. O alienado começa então a encerrar-se na sua posição como a única que está certa. Se o problema fosse somente dele, seria um mal menor, mas à medida que ele começa a enganar todos ao seu redor, fazendo parecer que apenas a sua pessoa e as suas opções estão certas, torna-se um perigo para a sociedade. Ora, este é o problema de certas ideologias contemporâneas. Trazem a subversão a uma ordem preexistente, começam com pequenas e inofensivas mentiras que vão acarretando outras maiores… inicialmente estranham-se, mas depois entranham-se, falsidades que à custa de tanto serem repetidas começam a parecer verdades, e toda uma minoria, convicta e barulhenta, começa a impor-se a toda a sociedade. Com a oposição começa um combate, entre princípios aparentemente lógicos e fundamentados, mas que facilmente degeneram para a acusação mútua, a luta ideológica, inescrupulosa, repleta de “fake news”, de linguagem torpe, violência até, e começa a desviar-se o busílis da questão para o superficial, o brejeiro, e sobretudo, o interesseiro.

Tem sido assim em quase tudo… o feminismo, por exemplo, adopta uma posição radical e começa a manipular e condicionar a verdade para os seus próprios interesses, toldando a serena e saudável reflexão sobre a violência familiar, os direitos da mulher e a igualdade de oportunidades para questões que tocam extremos e impedem que o diálogo aporte à verdade. Dali a pouco, o feminismo radical degenera em ódio aos homens, lesbianismo, manifestações violentas e imorais, postagens radicais e difamatórias nas redes sociais… Perde-se então a serenidade, trocam-se acusações, revelam-se incongruências, escandalizam-se os povos, perdem-se as oportunidades. A discussão simplesmente degenera e não alcança resultados favoráveis para nenhuma das partes. O mesmo acontece com a ideologia extremista ecológica que entra em particularidades desnecessárias, impedindo uma visão ampla e real sobre o assunto. Começa então o ridículo, como o de uma Universidade Pública e livre em Portugal que proíbe a carne bovina do seu menu semanal, devido ao CO2 que o animal produz para o Meio Ambiente. Diria o “conselheiro Acácio”, que se nós não comermos o gado, ele vai abundar ainda mais pelos campos, e mais dióxido de carbono vai produzir… diriam os que estão preocupados com a extinção dos bichinhos, que a médio prazo não sendo um animal de companhia, como um cãozinho ou um gatinho, vão entrar em extinção, pois vacas não entram em apartamentos. Dirão outros que o lixo que a dita Universidade produz nas suas festas tão apreciadas pelos estudantes são um atentado muito maior à Natureza. Certo grupo até já está a promover uma grande churrascada à porta da Universidade… Atitudes populistas atraem outras… É fácil perceber que se um avião que cruza os céus produz mais CO2 que vacas e bois com flatulência, o que será do intenso tráfego aéreo que cruza os nossos ares? Mas do lucrativo turismo, ninguém quer abdicar… até um aeroporto a mais queremos acrescentar. Uma medida irracional como esta de proibir a carne bovina em nome do Meio Ambiente irá desencadear tantas discussões “bobas” que perdemos de vista a seriedade dos problemas ecológicos e a razoabilidade das coisas. Devemos diminuir o consumo de carne, talvez, até para bem da nossa saúde, e para bem do Planeta em geral, e seguir um conselho dado há muito pelos nutricionistas e cientistas. Devemos cortar radicalmente? Uma estupidez que nenhum “vegan” em nome da “santa soja” deveria impor. Uma loucura realizada em nome do extremismo ideológico e ecológico…

O autor deste artigo não é grande carnívoro. Evita até as carnes vermelhas, devido a questões de saúde. Não defende a carne pela carne, nem crítica a Universidade por obscurantismo da Idade Média. Mas porque no meio está a virtude. As coisas devem ser feitas com equilíbrio, prudência – uma virtude importante – e muito bom senso. O problema é que enquanto as minorias quiserem continuar a impor as suas agendas ideológicas, os populismos no nosso mundo continuarão a crescer como atracção, radicalização e oposição, tal como as “fake news” e as demagogias, os extremismos políticos e os totalitarismos. E continuaremos a perder aquele olhar sereno e atento para os verdadeiros problemas da nossa sociedade, as suas raízes, e as soluções para sanar os males que contaminam as democracias e o mundo actual secularizado onde estão a penetrar tantos falsos dogmas. Muitos recursos financeiros empregues na manipulação e influência das massas poderiam ser encaminhados para as causas sociais, muito tempo perdido em debates supérfluos poderia compensar em proximidade com as realidades sociais, muitos livros e jornais com barbaridades propagandísticas das ideologias poupariam árvores… Muitos esforços realizados por grupelhos que querem tomar conta do mundo e formar um pensamento único, numa espécie de “colonização ideológica”, na expressão do Papa Francisco, são verdadeiramente desnecessários para as presentes questões que mais devem ocupar os esforços conjuntos da Humanidade. Devemos focar-nos naquilo que é verdadeiramente importante, e não nos deixarmos levar por alguns que fazem um barulho irritante….

Pe. José Victorino de Andrade 

 Sacerdote ao serviço do Santuário de Fátima

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