Uma tradição, várias práticas
O Advento de 2022 começa Domingo e termina a 24 de Dezembro, este ano num sábado. O termo deriva do Latim “Adventus” [Redemptoris], ou seja, “chegada” [do Redentor]. No uso actual, trata-se de um tempo litúrgico inscrito no ciclo do Natal, que se inicia nas Primeiras Vésperas do Domingo mais próximo à Festa de Santo André Apóstolo (30 de Novembro), terminando antes das Primeiras Vésperas da Solenidade do Natal, englobando quatro Domingos. O primeiro Domingo pode ser adiantado até 27 de Novembro, e então o Advento tem 28 dias, ou atrasar-se até ao dia 3 de Dezembro, tendo desta forma 21 dias. Nas Igrejas Ortodoxas, o Advento dura quarenta dias (de 28 de Novembro a 6 de Janeiro).
Com o Advento inicia-se o ano eclesiástico nas Igrejas ocidentais. Neste tempo litúrgico exortam-se os fiéis a prepararem-se dignamente para celebrar a Natividade do Senhor, Jesus Cristo, numa forma de preparação espiritual. As figuras cristãs mais evidenciadas neste tempo do Advento são o profeta Isaías, São João Baptista e Maria. É uma liturgia que intensifica a expectativa do Natal.
A origem histórica não é exacta. A preparação para a Festa de Natal não deve ser anterior à existência da própria Festa. Assim, desta não encontramos evidência antes do final do Século IV, quando era celebrada em toda a Igreja, por alguns no dia 25 de Dezembro, por outros a 6 de Janeiro. Sabemos, de facto, que se foi formando entre os Séculos IV e VI, de diversas maneiras, em várias famílias litúrgicas do Oriente e do Ocidente. Na Hispânia, por exemplo, temos uma menção na Acta do Concílio de Saragoça (cerca de 380 d.C.) em que já se fala de três semanas de preparação para a Epifania (desde 17 de Dezembro a 6 de Janeiro), com cunho baptismal e recomendação de presença nas igrejas. No Oriente, por seu turno, foi-se formando no Século V. Há também duas homilias de São Máximo, Bispo de Turim (415-466), intituladas “In Adventu Domini”, que referem essa expectação do Natal, mas não fazem menção concreta a nenhum tempo especial. O título, contudo, pode ter sido adição de um copista. Em Roma, todavia, a primeira menção só surge no Século VI, através de São Gregório Magno (Papa entre 590 e 604), que já refere o Advento que hoje conhecemos, de quatro semanas. Com efeito, a colecção de homilias deste Papa começa com um sermão para o Segundo Domingo do Advento. Na liturgia ambrosiana de Milão, são, no entanto, seis os Domingos do Advento, tal como na hispânico-moçárabe. Ambos estes ritos observam jejum no Advento.
Existem algumas homilias, provavelmente a maior parte de São Cesário, Bispo de Arles (502-542), nas quais se encontra menção de uma preparação antes do Natal; todavia, a julgar pelo contexto, não parece que existisse qualquer determinação superior e geral sobre a matéria. Em 581, num sínodo reunido em Macon, na Gália, no nono cânone ordena-se que desde o dia 11 de Novembro até ao Natal o Sacrifício fosse oferecido de acordo ao Rito Quaresmal nas Segundas, Quartas e Sextas-feiras da semana. Por outro lado, no Sacramentário Gelasiano anotam-se cinco Domingos para o tempo; estes cinco foram reduzidos a quatro pelo Papa São Gregório VII (1073-1085). Antes ainda, no ano de 650, o Advento era celebrado em Espanha com cinco Domingos. Vários sínodos lavraram também cânones sobre os jejuns a observar durante este tempo, alguns começando no dia 11 de Novembro, outros a 15, e outros com o Equinócio de Outono (23 de Setembro). Noutros sínodos proibia-se até a celebração do Matrimónio no Advento. Na Igreja Grega não encontramos documentos sobre a observância do Advento até ao Século VIII. São Teodoro, o Estudita (morreu em 826), por exemplo, que falou das festas e jejuns celebrados entre os Gregos, não fez menção alguma deste tempo. No Século VIII refere-se que o tempo entre o dia 15 de Novembro e o Natal é observado não como uma celebração litúrgica, mas como um tempo de jejum e abstinência que seria posteriormente reduzido a sete dias.
Nos dias que antecedem o Natal, na oração das vésperas, rezadas de tarde, a Igreja reza as Grandes Antífonas do “Ó”, por começarem todas com essa expressão (“Ó Sabedoria”, “Ó Adonai”, “Ó Raiz de Jessé”, “Ó Chave de David”, “Ó Sol Nascente”, “Ó Rei das Nações” e “Ó Emanuel”). As antífonas dirigem-se a Cristo e “terminam com um pedido específico ao Senhor”. Estas antífonas são uma das fontes de onde surgem as chamadas “alegrias” ou estrofes que se cantam ou rezam na Novena de Natal, de 16 a 24 de Dezembro. Por causa dessas antífonas a Virgem da Expectação, devoção a Nossa Senhora nos últimos dias de sua gestação, é conhecida como Nossa Senhora do Ó. Durante o Advento, uma coroa de ramos de pinheiro, chamada Coroa do Advento, é colocada nas igrejas e também em algumas casas, com quatro velas, uma para cada Domingo do Advento. Existe uma pequena tradição do Advento: a cada uma dessas quatro velas é atribuída uma virtude que deve ser observada na sua semana, por exemplo: a primeira, o amor; a segunda, a paz; a terceira, a tolerância e a quarta, a fé.
Vítor Teixeira
Universidade Fernando Pessoa