MARLON PAREJA, PROFESSOR DA UNIVERSIDADE DE LA SALLE-DESMARINÃS

MARLON PAREJA, PROFESSOR DA UNIVERSIDADE DE LA SALLE-DESMARINÃS, ESPECIALISTA EM SUSTENTABILIDADE E PROTECÇÃO AMBIENTAL

«As pessoas querem mudança, mas não querem ser mudadas»

É considerada, dentro e fora das Filipinas, como um exemplo em termos de sustentabilidade e protecção ambiental. A Universidade de La Salle-Desmariñas, em Cavite, foi considerada como a mais ecológica das Filipinas durante nove anos consecutivos e o sucesso das políticas adoptadas já galgou fronteiras. O bom desempenho trouxe a Macau um dos mentores da transformação da Universidade num exemplo a seguir. Em entrevista a’O CLARIM, o professor Marlon Pareja defende que na longa caminhada para a sustentabilidade o mais difícil é mesmo alterar comportamentos.

O CLARIM – Talvez não seja muito errado afirmar que ainda há muitas pessoas que não compreendem totalmente a ideia de sustentabilidade. Ao que nos referimos quando falamos de desenvolvimento sustentável?

MARLON PAREJA – O conceito de desenvolvimento sustentável abarca muitas facetas. Por exemplo, enquanto residente de uma cidade altamente urbanizada como Macau, uma das questões para onde se pode olhar é para a questão do consumo. Veja-se a questão do consumo de alimentos. Que tipo de detritos são produzidos? Detritos alimentares? Qual a origem da água que é consumida em Macau? E dos alimentos? Para onde vai o que não é consumido? De que forma são recolhidos e que fim é dado aos detritos que produzimos? Acho que estas são perguntas simples que vão ao encontro de um pensamento sustentável. A sustentabilidade tem três facetas: o impacto no ambiente, obviamente, o impacto social e, ao mesmo tempo, a ideia de rentabilidade. Estes são os três grandes propósitos da sustentabilidade. No que diz respeito à produção e ao consumo de alimentos, o primeiro passo para a sustentabilidade é o de procurar conhecer a origem dos alimentos à venda nos supermercados. É produzida longe ou perto de Macau? Como é que estes alimentos são armazenados e conservados? A tomada de consciência em relação a estas e a outras questões pode ajudar a mudar comportamentos.

CL – Mesmo numa cidade como Macau, altamente urbanizada e que pouco produz?

M.P. – A sustentabilidade por ser medida de muitas maneiras. Podemos ter muitos espaços verdes ou, no caso de uma cidade como Macau, onde a taxa de urbanização é elevada, podemos olhar para a sustentabilidade do prisma do tratamento de resíduos e da gestão de águas residuais, mas também a partir da perspectiva da monitorização do clima, das condições atmosféricas, com o propósito de garantir a segurança da população. Isto remete para outro tipo de questão, a forma como a utilização do solo é planeada. Estive, durante esta minha visita a Macau, numa área de zonas húmidas. Era uma área lindíssima, com a qual as autoridades das Filipinas podiam aprender. Mesmo com todos os arranha-céus e todas as infraestruturas construídas, a cidade conseguiu desenvolver espaços verdes e ecossistemas cuja manutenção beneficiou o público. Isso é admirável. Creio que ser capaz de planificar, de monitorizar esses planos e de implementar medidas que possam reduzir o impacto do Homem sobre o ambiente, são passos essenciais para se conseguir edificar uma cidade sustentável ou uma comunidade sustentável. Nas Filipinas, as áreas verdes são um bom barómetro de sustentabilidade, mas em Macau, onde o espaço é muito mais limitado, a eficácia dos processos e poder garantir que a poluição criada por esses processos é acautelada, são aspectos muito mais relevantes.

CL – Já que fala em processos, a Universidade De La Salle – Dasmarinãs é considerada uma das mais avançadas do mundo em termos de sustentabilidade e protecção ambiental. Como alcançou este estatuto?

M.P. – Antes de qualquer outra coisa, importa dizer que a sustentabilidade é para nós um aspecto crucial. Um dos factores mais relevantes neste processo é mudar o nosso comportamento. E mudar de comportamento significa que não podemos continuar a fazer mais do mesmo. A mudança de comportamentos é uma das tarefas mais difíceis em todo o processo. As pessoas querem mudança, mas não querem ser mudadas. Isto é algo que é necessário ter em conta.

CL – De qualquer forma, conseguiram mudar comportamentos e, por vezes, com recurso a medidas drásticas…

M.P. – A principal razão pela qual aconteceu foi porque conseguimos associar uma imagem de credibilidade ao processo. Fizemos questão de dar o exemplo antes de dizermos ao Governo, às empresas ou à comunidade que deviam agir desta ou daquela maneira. Garantir credibilidade não foi algo que tenha acontecido da noite para o dia. Este processo iniciou-se em 2001 e neste momento ainda não podemos dizer que o sistema é perfeito. Como dizia, o comportamento é o maior dos desafios e é necessário tempo para que se altere. Um exemplo clássico que posso dar prende-se com a utilização de sacos de plástico. No exterior das instalações da Universidade, temos uma loja de conveniência e essa loja oferecia sacos de plástico aos alunos para transportar os produtos que adquiriam. A determinada altura, a Universidade proibiu os sacos de plásticos nas suas instalações e os clientes da loja, que eram sobretudo nossos alunos, começaram a queixar-se porque não podiam entrar com sacos de plástico no campus. O que fez o 7-Eleven? Substituiu os sacos de plástico por sacos de papel e esse foi um dos impactos positivos que as nossas políticas ambientais tiveram. Depois disso, escrevemos a diferentes empresas de “fast food” a clarificar que os funcionários dessas empresas não seriam autorizados a entrar no campus da Universidade se levassem sacos de plástico. O que foi que eles fizeram? Mudaram também as suas embalagens.

CL – E no que diz respeito às garrafas de plástico? Também as proibiram?

M.P. – O uso das garrafas é regulamentado. A utilização de garrafas durante as aulas e as reuniões não é autorizada. Podem ser adquiridas nas nossas cantinas e cafetarias, mas os recipientes não podem sair do campus. Deixámos claro que as garrafas de plástico pertencem à Universidade e encorajamos os nossos alunos a colocarem as garrafas vazias em caixotes destinados para esse efeito. Estes recipientes plásticos têm como destino o nosso Centro Ecológico. Criámos um repositório para detritos recicláveis recolhidos dentro das instalações universitárias e assinámos um contrato com uma empresa privada para a recolha destes materiais – a empresa paga à Universidade um montante específico todos os meses. A Universidade ganha algum dinheiro com estes materiais recicláveis e as receitas são direccionadas para um fundo ambiental.

CL – A que se destina esse fundo?

M.P. – É usado para financiar bolsas de estudo e de investigação, mas também para outro tipo de investimentos. Conseguimos instalar um número significativo de postes de iluminação alimentados com painéis solares com os rendimentos obtidos com este programa de reciclagem.

Jasmin Yiu com Marco Carvalho

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