Um entardecer sobrenatural

Um entardecer sobrenatural

RECORDAMOS O MOMENTO MAIS GLORIOSO DA PÁSCOA QUE AGORA TERMINA

Foi um Domingo de Páscoa diferente para a Igreja, para as famílias, para todos os cristãos.

A dor é muita, por tudo o que se está a passar no mundo.

E, num entardecer, quase a chegar à Páscoa, sentados em nossas casas, olhando ansiosamente para a televisão, aparece o Santo Padre numa praça, mais precisamente a Praça de São Pedro – enorme, lindíssima –, com o peso da Humanidade toda às costas, num caminhar lento e difícil. Foi sobrenatural.

Estávamos a ver todo o sofrimento do mundo, todo o sofrimento da Paixão de Cristo. Estas imagens provocaram emoções: por um lado, a estranha beleza de uma praça sem ninguém, uma praça que costuma estar cheia de gente, o que é, já por si, uma emoção diferente; por outro lado, as dores que o Papa trouxe, que pesavam e transfiguravam o espaço.

Assim é uma obra de arte: à beleza do que nos é mostrado, junta-se a emoção daquilo que essa obra nos transmite. A imagem na Praça de São Pedro não era para ser bela, mas a emoção que tivemos ao vê-la transformou-a em algo sobrenatural, algo único. A televisão quis transmitir um facto, nós ficámos com a extraordinária beleza de todo um momento.

Também a obra de arte é bela quando a emoção com que o artista a fez é compreendida por quem a vê. O belo constitui-se, assim, por uma fruição despertada juntamente com a ideia que nos é transmitida. Mesmo uma obra triste, uma representação de um momento triste, pode ser bela. Porque a beleza emociona, e o mundo da arte, como o mundo real, que serve de inspiração, permite ao artista estabelecer um diálogo connosco e com ele acerca da vida.

A arte clássica não pretendia retratar a realidade do mundo onde os artistas viviam; por isso, o belo era considerado pela harmonia, a simetria, o equilíbrio e a proporcionalidade, e a beleza era avaliada apenas com critérios de aparência, era confundida com a aparência.

Mas o prazer estético é muito mais do que isso, e, juntamente com o prazer de olhar e ver formas e composições, pode ser suscitado por uma emoção profunda e subtil.

Ana Maria Figueiredo

Pintora

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