Introspecção num calendário de emoções
No último Domingo, dia 1 de Dezembro, entrámos no Advento. Um tempo de espera, de esperança, de expectativa adiada. É uma época importante do ano, na matriz cristã, mas não apenas. Uma época para aproveitar, principalmente se se pensar nos seres humanos mais jovens. É uma época de mudanças, no tempo, no clima, na luz, na fruição do ar livre. Todos sentimos, uns mais que outros, que há uma mudança para o horário de Inverno, com diferentes graus de adaptação, os dias diminuem até 21 de Dezembro, escurecendo mais cedo até então. Luz que falta, rareia ou perde intensidade. Falamos de luz física, natural ou artificial. Porque parece que a luz espiritual e afectiva do Advento vem contrapor esse défice luminoso e aquecer o coração. Ensina a esperar, a ter paciência, perseverança e a desmediatizar a vida, um pouco… Os dias ficam mais curtos, ao contrário da esperança e da alegria. Muitos saem de casa na escuridão e regressam em plena escuridão. Mas não têm de ficar às escuras sempre, nem sentir que o tempo foge. O Advento ensina a esperar, recorda a importância do tempo, de que afinal aquela escuridão natural vem todos os anos. Mas recorda-nos de que há sempre algo novo para ensinar. Veremos depois como o Calendário do Advento nos pode ensinar sobre o tempo. E sobre como reconhecer a nossa própria luz interior. Este é o período do ano em que apreendemos a regressar, lentamente, para dentro. Com tempo. Nas quatro semanas com os dias mais escuros do ano, a luz acende-se em cada um. Na pouca luz e nos dias solares curtos, nas longas noites de Inverno, há tempo para algo que cada vez mais rareia, a contemplação, a reflexão, que nos ajudam a recordar afinal o que é verdadeiramente importante nesta vida.
O Advento também pode ser encarado, na realidade, como um festival de quatro semanas, das quatro semanas que antecedem o Natal e o Solstício de Inverno, com um começo simbólico na quarta-feira antes do Primeiro Domingo do Advento. Muitas religiões celebram a mesma mensagem neste período do ano, nos festivais do regresso da luz. Ou da procura e enaltecimento da luz. Entre esses festivais estão o Solstício de Inverno, o islâmico Eid al Adha, o Kwanzaa (festival afro-americano nos Estados Unidos, de valorização da comunidade, das crianças e da Vida, com sete velas), o Hanukkah (festa judaica das Luzes), o Diwali (festa hindu da Luz), e o mais conhecido no Ocidente, o Natal do Senhor. Por aqui se afere da importância intercultural desta época do ano.
O Advento é, por isso, um tempo mágico, cheio de expectativa, uma celebração muito importante. São as quatro semanas antes do Natal encaradas como um período de expectativa. Espera-se literal e figurativamente pelo Natal, de contagem regressiva até àquele dia da Festa em que se celebra um nascimento muito especial, de uma criança divina, o Menino Jesus (para os cristãos), símbolo de um novo nascimento, uma nova vida, uma nova Luz, ou seja, um novo recomeço no novo ano que se anuncia. Todavia, neste tempo da História da Humanidade em que vivemos, marcada pelo consumismo, materialismo e excessos, muitos esquecem o simbolismo da Festa, bem como a magia de cada época do ano e a razão de todas as celebrações e das tradições criadas ao longo dos séculos. Assim acontece com o Advento, como com o Natal, cada vez mais uma festa mundana e materialista. Mas não o é para todos ainda, felizmente.
Hoje trago-vos uma breve história, desconhecida de quase todos. Algo que começou no Século XIX, na Alemanha, no Natal. A história do esperado e desejado doce Calendário do Advento, uma tradição antiga. Remonta a Lutero, figura central na Reforma Protestante. Lutero, que recusou o culto dos Santos, mudou a tradição dos presentes de Natal: até ao Século XVI eram abertos no dia de São Nicolau (6 de Dezembro), tendo passado a sê-lo no dia de Natal. Para “compensar” o tempo de espera, os luteranos desenvolveram vários costumes e tradições, como o “Adventskalender” (Calendário do Advento), para se aguardar o dia em que abririam os presentes.
Antes do chocolate ser símbolo da contagem decrescente para o Natal, a tradição apresentava outras formas. Na altura, as famílias mais pobres faziam 24 marcas com giz numa porta que iam sendo apagadas, uma por dia, pelas crianças. Havia também quem acendesse uma vela por dia, arrancasse tiras de papel ou colocasse pedaços de palha na manjedoura. Nas famílias mais ricas, a contagem decrescente era celebrada com biscoitos de gengibre para as crianças. A tradição foi-se criando e as velas passaram a ser colocadas numa estrutura, o “Relógio do Advento”. Apesar de ser uma prática familiar em algumas regiões de língua germânica da Europa desde o Século XVII, a primeira Coroa do Advento foi colocada em Dezembro de 1839 na capela da Rauhes Haus, um orfanato em Hamburgo. As famílias católicas acabaram por adoptar o “Adventskalender” e a tradição espalhou-se por toda a Alemanha. Da Alemanha, ganhou a Europa e galgou os mares. A primeira impressão de um Calendário do Advento é incerta, mas pensa-se que tenha sido em 1851. Sim, na Alemanha, expandindo-se depois na Áustria. Os chocolates no Calendário impõem-se a partir de 1820: primeiramente eram apenas pequenas janelas para abrir, que os nazis substituíram por contos de fadas ou divindades germânicas. Depois o chocolate impôs-se. O tamanho dos Calendários variou também. O maior e mais famoso “Adventskalender” situa-se no centro de Leipzig e ocupa uma área de 857 metros quadrados, quase um campo de futebol. Todos os dias, durante o Advento, às 16 horas, do dia 1 ao dia 24 de Dezembro, abre-se uma janela, onde aparecem motivos de Natal. Na próxima semana, há mais (sobre o) Advento.
Vítor Teixeira
Universidade Fernando Pessoa