“Respira em mim, ó Espírito Santo!” – A espiritualidade da respiração
«“Jesus disse, assim como o Pai Me enviou, também Eu vos envio”. Dito isto, soprou sobre eles e disse-lhes: “Recebei o Espírito Santo”» (Jo., 20:21-22).
No clima quente e húmido destes dias, que alívio quando posso tirar a máscara e respirar livremente um pouco de ar fresco. Não consigo imaginar como aqueles que têm complicações respiratórias conseguem suportar o seu desconforto. O Covid tem-nos ajudado a valorizar o simples, mas essencial acto de respirar.
Respirar é sinónimo de vida: inalar é a primeira coisa que fazemos quando entramos neste mundo, e exalar é a última coisa que fazemos quando partimos. Assim como o bater do coração, a respiração é uma função automática e normalmente não pensamos nisso. Mas, ao contrário das batidas do coração, a respiração pode ser controlada conscientemente. De facto, as técnicas de respiração são usadas especialmente para relaxamento.
Mas a respiração também tem um profundo significado religioso. Muitas religiões usam a respiração como uma ferramenta para facilitar a oração e a meditação. O simples acto de “inspirar, expirar” naturalmente conecta o nosso corpo com a nossa mente, o “eu externo” com o “eu interno”.
A fé cristã também atribui um significado sagrado à nossa respiração. No Génesis, lemos que «o Senhor Deus criou o homem do pó da terra e soprou nas suas narinas o alento da vida, e o homem tornou-se um ser vivo» (Gén., 2:7). No sopro de Deus, a Igreja sempre viu a acção do Espírito Santo, “o doador da vida”, através de Quem os seres humanos podem viver em comunhão com Deus. Além disso, no Evangelho que proclamamos na Solenidade do Pentecostes deste Domingo (Jo., 20,19-23), Cristo Ressuscitado soprou o Espírito Santo sobre os Apóstolos, enviando-os ao mundo para compartilhar a Misericórdia e a reconciliação de Deus. Da mesma forma, o Espírito Santo soprou sobre nós no baptismo e recriou-nos como novas criaturas.
Às vezes os católicos são um pouco cépticos quanto ao uso da respiração como forma de rezar. Estamos cientes dos perigos da auto-absorção. A oração cristã não visa simplesmente alcançar um bem-estar psicológico, mas é sempre relacional (dirigida a Deus e focada em ouvi-Lo) e tem carácter eclesial, mesmo quando rezamos sozinhos. Uma vez que isso esteja claro, a respiração pode realmente tornar-se numa forma poderosa de orar no Espírito Santo.
Na visão bíblica, uma pessoa não é uma alma aprisionada em um corpo que procura escapar, mas uma unidade integral dos dois. O corpo é importante para a oração e não um bloqueio para ela. Na verdade, oramos com o corpo e, especificamente, com a respiração, com mais frequência do que pensamos. Por exemplo: a proclamação das Escrituras, a nossa participação na oração litúrgica comunitária, a recitação de ladainhas, a interpretação de cânticos, tudo isso exige uma coordenação harmónica entre a nossa respiração e o nosso espírito.
Os Padres da Igreja compreenderam a importância da respiração no que respeita à espiritualidade, e até elaboraram algumas metodologias para unir a invocação e a respiração de modo a permanecermos em estado de oração, mesmo durante o trabalho. “Respirai sempre Cristo”, dizia Santo António (Século IV) aos monges. Mais tarde, os ensinamentos dos monges foram concretizados na “Oração do Coração” (ou “A Oração de Jesus”), a que muitos cristãos recorrem, especialmente na Igreja Ortodoxa.
A respiração também expressa o dinamismo da vida cristã na sua totalidade. Quando inspiramos, vivenciamos a nossa dependência a Deus e ao Seu poder salvador. Quando expiramos, confiamo-nos a Ele e manifestamos a nossa disponibilidade para compartilhar o Seu amor com o mundo.
Há alguns anos, o Papa Francisco disse: “A respiração é composta por duas etapas: a inspiração, a entrada de ar, e a expiração, a saída desse ar. A vida espiritual é alimentada e nutrida pela oração e expressa-se externamente através da missão. Quando inspiramos, pela oração, recebemos o ar puro do Espírito Santo. Ao exalar este ar, anunciamos Jesus Cristo ressuscitado pelo mesmo Espírito. Ninguém pode viver sem respirar. É o mesmo para o cristão: sem oração e missão não há vida cristã. […] O sopro dos cristãos atrai o ar novo do Espírito Santo e depois exala-o sobre o mundo: é a oração de louvor e de alcance missionário” (Discurso à “Fraternidade Católica das Comunidades e Irmandades da Aliança Carismática”, 31 de Outubro de 2014).
Santo Agostinho rezou com estas palavras:
“Respira em mim, ó Espírito Santo, para que os meus pensamentos sejam todos santos.
Age em mim, ó Espírito Santo, para que também a minha obra seja santa.
Desenha o meu coração, ó Espírito Santo, para que eu ame só o que é santo.
Fortalece-me, ó Espírito Santo, para defender tudo o que é santo.
Guarda-me, pois, ó Espírito Santo, para que eu seja sempre santo”.
No Espírito Santo, a santidade não é mais um ideal inalcançável, mas um caminho concreto ao longo da vida, possível para todos. Uma jornada de Amor, de Graça, de Misericórdia a ser feita um passo após o outro, uma escolha após a outra, um alento após o outro….
Pe. Paolo Consonni, MCCJ