No Ovo de Colombo
A nossa passagem pelas Bahamas não foi planeada, mas devido ao mau tempo que encontrámos na travessia entre o Haiti e Cuba decidimos enveredar por uma rota dentro da cadeia de ilhas que constituem este país.
Inicialmente a ideia era seguirmos directamente para a Flórida, parando apenas para abastecer e descansar, sem nunca proceder aos trâmites legais de entrada oficial nas Bahamas. Aos veleiros é permitido pararam num país para abastecerem e as tripulações descansarem, sem entrarem oficialmente em território nacional. Era o que tencionávamos fazer.
A primeira paragem foi numa ilha chamada Atkins, onde ficámos um dia para descansar e nos restabelecermos do mau tempo que apanhámos até lá. Feitas as contas ao gasóleo e aos mantimentos a bordo, e já com a informação meteorológica actualizada, graças a dois veleiros que ancoraram na mesma ilha, chegámos à conclusão que teríamos de parar na primeira marina. Tal aconteceu no dia seguinte, na ilha de Long Island, mais concretamente na localidade de Clarence.
Chegámos de manhã cedo e atracámos. Depois de verificarmos se o cartão ATM (Multibanco) funcionava, abastecemos e tomámos um táxi para irmos ao supermercado e a uma agência bancária. Como também acabou o gás, aproveitámos para encher a botija.
De volta à marina, tendo a Maria visto que havia uma piscina, perguntámos se havia espaço para ficarmos um dia. A falta de educação e o foco extremado em fazer dinheiro com barcos maiores, levou o gerente da marina a dizer que sim, numa primeira abordagem, para depois dar-nos “ordem de despejo” quando já estávamos a manobrar o veleiro. Foi o suficiente para ficarmos com uma péssima impressão do local e disso fizemos saber quando ancorámos na zona de baixios. É que para além de se terem comportando infantilmente, colocaram em perigo a tripulação e a embarcação. Por exemplo, na manobra que tivemos de executar, chegámos a bater no fundo. Felizmente não houve estragos.
Após esta experiência e de descansarmos dois dias ancorados, rumámos a outra ilha, a Cat Island, onde chegámos depois da noite de vela que vos relatei na última edição. No ancoradouro ficámos perto de outros veleiros, que nos acolheram de braços abertos. Ao ancorarmos na segunda vez – na primeira tentativa o barco não ficou bem preso – surgiu um problema com o veio de transmissão que deixou de funcionar. Felizmente, a tripulação da embarcação ao nosso lado ofereceu-se para ajudar. O final deste dia um pouco atribulado foi vivido a bordo, de rebarbadora na mão, a maquinar uma cavilha para o veio de transmissão.
Volvidos dois dias, já com o problema mecânico resolvido, zarpámos em direcção à Flórida, com paragem programada na ilha de Eleuthera, onde Cristóvão Colombo chegou às Américas, ao contrário do que dizem as fontes oficiais.
A História conta que foi na ilha de São Salvador, mas um investigador e velejador português, o nosso amigo Walter Gameiro, já provou que se trata de um erro e que Cristóvão Colombo, que também defende ser português, chegou a Eleuthera, mais precisamente ao ancoradouro que baptizou de Spanish Wells. Ali o navegador abasteceu a frota de água doce. Segundo Walter Gameiro, a primeira ilha a ser visitada foi Egg Island, a qual os marinheiros de Colombo circum-navegaram, a remos, em apenas sete horas. Aliás, essa é uma das bases da sua argumentação, uma vez que é impossível circum-navegar São Salvador em apenas sete horas. E, ainda hoje, não tem água potável.
Combinámos parar no ancoradouro de Egg Island até que uma frente fria passasse e pudéssemos continuar a viagem. Acontece que na aproximação ao local o motor do Dee pregou-nos mais uma partida e deixou de funcionar. Perdeu toda a potência a apenas umas centenas de metros do ancoradouro. Como estávamos contra a corrente e o vento, e era impossível chegar ao destino, decidimos pedir auxílio via rádio. Fomos então ajudados por um senhor que nos rebocou com o seu barco a motor. Como tinha uma doca para alugar, no dia seguinte solicitámos às autoridades das Bahamas permissão para entrarmos no País de forma oficial, ao abrigo da “entrada de emergência”. Tivemos que recorrer a este subterfúgio porque a NaE, sendo portadora de passaporte tailandês, tinha obrigatoriamente de solicitar visto antes de chegar ao País. Contudo, ao abrigo das regras internacionais, em caso de emergência esse requisito pode ser ultrapassado. Concederam-nos dez dias de estadia, o que permitiu resolver o problema mecânico e meter a conversa em dia com o Walter Gameiro. Este estava na ilha com a esposa. Para que conseguíssemos estar mais tempo juntos, e assim partilhássemos novas histórias, teve a amabilidade de mudar o seu barco para o nosso cais.
Walter Gameiro é engenheiro de formação. Neste momento está reformado, depois de ter trabalhado em Moçambique, África do Sul, Portugal e nos Estados Unidos. Actualmente dedica o tempo à investigação histórico-marítima. No ano passado, graças aos dados que descobriu e que desmentem a história oficial da chegada de Cristóvão Colombo ao Novo Mundo, foi convidado para se deslocar a Portugal a fim de participar em diversas conferências.
Quando não está a investigar algo ligado à história das navegações, visita lugares, mais ou menos remotos. Fá-lo no seu catamaran, na companhia da esposa.
João Santos Gomes