Ajudar os outros a ver e a viver o plano de bondade de Deus
O Evangelho de hoje leva-nos a Jericó, a cidade mais antiga do mundo. Se for lá, vai ver que é também um local turístico maravilhoso, porque por cima da Jericó antiga está a Jericó mais recente, e é um lugar bonito, numa zona de oásis com muita água à volta.
Em Jericó, a multidão junta-se rapidamente, pois Jesus de Nazaré tornou-se uma celebridade e, para onde quer que vá, as multidões apertam-no. E entre as multidões estão muitos dos seus inimigos que o querem ver destruído, mas também muitas pessoas que desejam ouvi-lo contar as suas histórias e encontrar-se com ele. De repente, um mendigo cego, de nome Bartimeu, grita do seu lugar à beira da estrada. É um mendigo. É um homem pequeno e esfarrapado. Não tem casa, não tem sítio, não tem esperança, não tem nada e, no entanto, é o herói da história de hoje.
Ele grita em voz alta: “Jesus, filho de David, tem piedade de mim”. Há um velho ditado que diz: a piedade é mais forte do que o amor. Se procurares o amor, ficarás terrivelmente desiludido, mas a piedade é algo que distribuímos muito bem. Então, ele pensa em apelar, não para o facto de ser um homem decente, mas para o facto de Jesus de Nazaré ter tido pena dele.
As pessoas dizem-lhe para ficar calado. Estão a ficar muito nervosas. Porquê? Porque “Filho de David” é um título messiânico e têm medo que os gritos do cego chamem a atenção de todos os seus inimigos, que estão a conspirar contra ele, por este dizer que é o Messias. O Messias é o Santo, o Ungido de Deus, que é esperado por todo o povo judeu ao longo dos tempos como o Salvador do mundo.
Mas, naquele tempo, chamar Messias a alguém é uma blasfémia, punível com a morte. Por isso, dizem-lhe para se acalmar, para se calar e ficar quieto, porque têm medo que os inimigos de Jesus ataquem. Mas o ceguinho gritava a plenos pulmões, agora ainda mais alto, até que finalmente o próprio Jesus o ouve, quando está a sair de Jericó, e pára. Vira-se e diz ao homem que está ao seu lado: “Chama-o. Chama-o para mim. Chama-o para mim”.
E há um momento de silêncio e o cego hesita, porque o estado de espírito da multidão passa agora da ameaça para o incitamento. E diziam coisas como: “Vá lá, tem coragem, levanta-te. O próprio Jesus está a chamar-te”. E o que é que o pequeno cego tem a perder? Não tem nada a perder e, por isso, atira fora o seu manto esfarrapado, como se fizesse parte de um passado e nunca mais o vestisse, e começa a correr em direcção à voz de Jesus, porque continua a não ver.
E depois lança-se aos pés de Jesus. E ouve a voz de Jesus a falar com ele e a voz diz: “Meu amiguinho, o que queres que eu faça por ti?”. E Bartimeu diz: “Senhor, que eu possa ver”. E Jesus logo lhe diz: “Vai-te embora. A tua fé salvou-te”. E imediatamente, diz Marcos, o mendigo recupera a vista e segue-o pelo caminho. Pelo caminho não significa que ele está a ir para casa. “Ao longo do caminho” significa caminhar com Jesus numa viagem para Jerusalém.
Uma história muito simples e encantadora contada por Marcos para nos fazer saber que também nós somos chamados a seguir o exemplo do corajoso ceguinho. E depois tu dizes: “O quê? Mas eu não sou cego”. E Jesus sorri e diz aquelas famosas palavras: “Tens olhos para ver, mas não vês. Tendes ouvidos para ouvir, mas não ouvis”. E talvez acrescente: “E tendes coração para amar, mas não amais”. E Jesus, ele próprio, veio para abrir os nossos olhos e abrir os nossos corações para o mundo de Deus, não para o nosso mundo, um mundo que é muito diferente. E ajudar-nos-á a ver como ele vê, a ouvir e a compreender como ele ouve e compreende. Mas, acima de tudo, Jesus ensinar-nos-á a amarmo-nos uns aos outros como Ele ama, como Deus ama.
O padre Raymund Gaspar é sacerdote filipino em Macau e trabalha no Centro Pastoral para emigrantes filipinos. Um sábado à noite, depois de ter celebrado Missa e de regressar ao seu centro pastoral, reparou num grupo de filipinas que caminhava pelas ruas. Iniciou uma conversa informal com elas e reparou que traziam algumas refeições embaladas, talvez o seu jantar. Informaram então o Padre que normalmente jantavam juntas antes de irem para casa, e que normalmente o faziam nalguns parques ou locais públicos. O padre Raymund ficou tão comovido que iniciou o programa “Lingap” (para chegar aos outros), um encontro aos sábados para os trabalhadores domésticos no Centro Pastoral Filipino. O programa Lingap inclui um jantar “buffet” quente, partilha de vida e encontro de oração – onde os trabalhadores domésticos podem comer confortavelmente juntos, acolhidos e em casa com pessoas atenciosas num ambiente familiar. O padre Raymund organiza os diferentes grupos da sua comunidade para se encarregarem da comida e de servir os trabalhadores domésticos.
E é isso que Marcos quer dizer quando afirma que o cego, que agora vê, segue Jesus ao longo do caminho – ao longo do caminho que conduz à vida eterna, um convite para caminhar com ele, um convite para nunca se separar dele e para enfrentar as coisas que ele enfrenta e para amar as pessoas que ele ama.
Pe. Leonard Dollentas