Igrejas perdem fulgor
O Líbano é um pequeno país do Médio Oriente, com capital em Beirute. Tem uma área de dez mil 230 quilómetros quadrados, para uma população estimada, em 2016, em pouco mais de seis milhões de habitantes, o que dá uma densidade de 560 habitantes por quilómetro quadrado. É de facto um país pequeno, mas multicultural e multi-religioso. Muitos pensam no Líbano como um país maioritariamente árabe do ponto de vista étnico, e islâmico em termos religiosos. Mas não é assim quanto à religião.
O Islão não é maioritário no Líbano. Há cerca de dois mil anos que a fé de Cristo, não apenas a Sua pessoa, mas também o Seu legado, assentaram e prosperaram no Líbano, o país dos cedros milenares, até hoje. Faz parte até da designação geográfica da Terra Santa, estando geopoliticamente a norte de Israel e vizinho de tantos lugares bíblicos. A Bíblia, em boa verdade, cita o Líbano 92 vezes, no Antigo Testamento. Por ali passaram muitos profetas e figuras bíblicas, como também islâmicas e judaicas. É, como terra de encruzilhada entre a Ásia, a Europa e a África, um lugar especial e de encontro de culturas e religiões. Se tal o torna tão especial, não deixa igualmente, na história, de o tornar um lugar de conflitos sangrentos e de desunião.
Os cristãos, de vários ritos, refira-se, já foram maioritários na história do Líbano, ou pelo menos mais de cinquenta por cento. Muitos descendem de grupos perseguidos no Médio Oriente e que aqui encontraram refúgio, pela tolerância e também pelas características topográficas – uma espécie de Suíça, montanhosa portanto, com mar –, que permitiram o seu escondimento. Não existem estatísticas oficiais e com rigor censitário actualmente, mas podemos referir que em 2017 o CIA World Factbook especificava que entre os residentes no Líbano (porque a diáspora libanesa no mundo é superior à população residente) se contavam 57,7 por cento de muçulmanos (28,7 por cento sunitas, 28,4 por cento xiitas, 0,6 por cento alauitas e sufis), 36,2 por cento de cristãos (a maior parte maronitas, ortodoxos orientais, greco-melquitas católicos, arménios ortodoxos, arménios católicos, Igreja Assíria do Oriente, protestantes, siríacos ortodoxos, siríacos católicos e católicos caldeus), 5,2 por cento de druzos e 1,3 por cento “outros”. Além destes, pequenas comunidades de budistas, baha’is, hindus, mórmones e judeus.
Entre os grupos religiosos, os muçulmanos têm crescido, ao contrário dos cristãos, em decréscimo ligeiro. Os refugiados muçulmanos (Palestina, Síria e outros países islâmicos do Médio Oriente) são os grandes responsáveis por esse crescimento populacional, ao passo que a emigração libanesa tem sido essencialmente cristã. Do ponto de vista étnico, os árabes constituem 95 por cento da população e os arménios quatro por cento, além de um por cento de “outros”.
UM OÁSIS NO MÉDIO ORIENTE
O Cristianismo surgiu no Líbano logo no século I, sendo provavelmente uma das terras no mundo onde apareceu mais cedo. Dividiu-se em vários ramos, sendo os mais importantes a Igreja do Ocidente (Católica) e a do Oriente (Ortodoxa). O ramo oriental está dividido em vários ritos, que são igrejas independentes, “sui iuris”. Depois de 1054 surgiu a designação de “igrejas ortodoxas”, ligadas aos seus patriarcas ortodoxos. As igrejas católicas estão ligadas à Igreja Romana, devendo obediência ao Papa e ao patriarca católico. As primeiras comunidades cristãs foram fundadas pelos Apóstolos.
As igrejas ortodoxas no Líbano são as seguintes, actualmente:
– Greco-ortodoxa, que professa a doutrina dos primeiros concílios, distinguindo-se de Roma em alguns dogmas e dela separada desde 1054. O seu líder é o “Patriarca de Antioquia e de todo o Oriente”, residente em Damasco, na Síria;
– Siríaco-ortodoxa (ou “jacobitas”), de doutrina monofisita (Cristo não tem as duas naturezas, humana e divina, mas apenas uma), surgida no século V; tem como chefe o “Patriarca de Antioquia e de Todo o Oriente”, residente também em Damasco;
– Arménio-ortodoxa, cristãos originários da Arménia; têm três patriarcas (Arménia, Cilícia e Jerusalém), sendo o segundo o que detém autoridade nos seus fiéis no Líbano, onde aliás reside. Daqui brotou uma Igreja evangélica arménia;
– Assíria, ou Nestoriana, também monofisita, seguindo a doutrina de Nestor, século V, condenada no concílio de Éfeso em 431; tem como líder o “Patriarca da Antiga Igreja do Oriente”, residente em Bagdade, no Iraque;
– Copta, de rito alexandrino, fundada no Egipto pelo Apóstolo São Marcos; o seu líder é o “Patriarca de Alexandria e de todo o Egipto”, que reside no Cairo;
– Evangélica, agrupando os protestantes do Líbano e da Síria, formando doze Igrejas oficialmente reconhecidas em Beirute e em Damasco.
No que toca à Igreja Católica Apostólica Romana, existem no Líbano os seguintes ritos (“igrejas”):
– Maronita, fundada pelo eremita São Maron, do século IV, na Síria; os maronitas chegaram ao Líbano no século VII e estão ligados a Roma; têm como chefe o “Patriarca de Antioquia e de Todo o Oriente”, residente em Bkerke, Líbano, sendo a única igreja oriental no Médio Oriente que não tem uma homóloga ortodoxa; é a mais numerosa;
– Greco-Melquita, oriunda dos greco-ortodoxos, ligada desde 1724 à Igreja Romana; tem como líder o “Patriarca de Antioquia e de Todo o Oriente, de Jerusalém e de Alexandria”, residente em Damasco, na Síria, e Raboue, no Líbano;
– Arménio-católica, originária da Igreja Arménia Ortodoxa, tendo como líder o “Patriarca Arménio Católico da Cilícia”, residente em Beirute e Bzoumar, no Líbano;
– Siríaco-católica, advém da siríaco-ortodoxa; em 1797 ligou-se a Roma, tendo como chefe o “Patriarca de Antioquia dos Siríaco-Católicos”, com sede em Beirute e Charfé;
– Caldeia, um cisma dos nestorianos, ligado desde 1828 a Roma, tendo como líder, abaixo do Papa, claro, o “Patriarca da Babilónia dos Caldeus Católicos”, em Bagdade;
– Igreja Católica Apostólica Romana, constituída pelos católicos de rito latino dependentes da Santa Sé, tendo um núncio apostólico no Líbano, em Harissa.
Há pois 24 circunscrições religiosas sujeitas à Santa Sé. São elas três patriarcados, igual número de arquidioceses metropolitanas, nove arquidioceses, oito dioceses e um vicariato apostólico. Este último é precisamente o católico de rito romano, com sede em Beirute. Em 2015 contabilizavam-se cerca de dez mil fiéis centrados no Vicariato Apostólico de Beirute, cifra que parece crescer. Em 2015, o Vicariato tinha oito paróquias, 138 sacerdotes (dois diocesanos e 136 religiosos) e mais de mil religiosas. Da Igreja Arménia Católica regista-se um patriarcado (Cilícia) e uma arquidiocese (Beirute, com doze mil e 500 fiéis).
Os católicos caldeus contam com uma arquidiocese, Beirute (vinte mil fiéis); os greco-melquitas (450 mil fiéis) com arquidioceses em Baalbek, Bāniyās, Beirute–Biblos, Saïdā, Tripoli, Tiro e Zahleh–Furzol; os maronitas com um patriarcado (Antioquia), quatro arquidioceses (Antélias, Beirute, Tripoli e Tiro) e as dioceses de Baalbek–Deir Al-Ahmar, Batroun, Jbeil, Jebbeh–Sarba–Jounieh, Saïdā e Zahlé (ao todo, cerca de um milhão e 600 mil fiéis); e o patriarcado de Antioquia e a diocese de Beirute dos Siríacos (quarenta mil).
Vítor Teixeira
Universidade Católica Portuguesa