Cristo Ressuscitado é o nosso caminho de casa
A habitação a preços acessíveis é um dos maiores problemas que afectam Macau. Embora devido à pandemia os preços do arrendamento e para aquisição de imóveis tenham caído significativamente, os preços da habitação actualmente em vigor ainda são tão altos que o sonho de comprar um apartamento é quase considerado uma utopia, especialmente para os jovens. O Governo tem planos para aumentar o número de projectos para habitação pública, mas levarão anos a concretizar.
Ter um tecto decente sobre a cabeça é um direito humano básico, mas por si só não é suficiente. Precisamos também de espaços onde nos sintamos acolhidos e protegidos. Precisamos de lugares onde sintamos pertencer. Por outras palavras, precisamos de um lar e de alguém que nos ame.
Olhando para os arranha-céus ao meu redor, com milhares de apartamentos empilhados uns sobre os outros, pergunto quantos deles são genuinamente “casas”. O estilo de vida moderno (longas horas de trabalho e estudo, dependência dos “smartphones”, competição stressante na escola ou no local de trabalho) empobreceu tanto as relações familiares que muitos apartamentos se tornaram dormitórios. Hoje em dia, os jovens encontram mais sentido de pertença nas redes sociais do que nas suas famílias.
Na famosa pirâmide das necessidades, elaborada por Maslow, as necessidades fisiológicas e a necessidade de segurança devem estar em primeiro lugar, por forma a permitir o desenvolvimento da personalidade e alcançar a realização pessoal. Mas um número crescente de especialistas vem questionando esta lógica. O sentimento de pertença e outros valores espirituais são igualmente importantes e ainda mais proeminentes no processo de crescimento. Quando os nossos lares e comunidades carecem de relacionamento humano, esse vazio costuma ser preenchido com muitos tipos de vícios. Os professores estão cada vez mais conscientes do facto de que é impossível lidar com os problemas dos alunos sem primeiro considerar as relações familiares. Ninguém recupera de traumas e cura feridas internas apenas em ambiente comunitário. É necessário estabelecer relacionamentos afectivos e amorosos com pessoas em quem confiamos e que se preocupam connosco. Não precisam ser pessoas perfeitas (ninguém é!), mas devem ser consistentes na sua presença e carinho.
Deus criou-nos para vivermos em comunhão, com Ele e uns com os outros. Infelizmente, o pecado entrou tragicamente na história, rompendo vínculos relacionais e isolando os indivíduos. A história do Pecado Original, nos primeiros capítulos do Génesis, descreve como, passo a passo, fomos perdendo a nossa verdadeira casa, o nosso sentido de pertença original: falta de fé em Deus, ganância, desconfiança uns dos outros, violência, solidão…; e vamos perpetuando este padrão comportamental.
Mas, no Evangelho deste Domingo (João 14, 1-12), Jesus profere palavras verdadeiramente reconfortantes: «Na casa de meu Pai há muitos aposentos; se não fosse assim, Eu o teria dito a vós. Portanto, vou para preparar-vos lugar. E, quando Eu me for e vos tiver preparado um lugar, virei de novo e vos levarei para mim, a fim de que, onde Eu estiver, estejais vós também». Jesus não está a dizer que nos dará uma “casa”, ou seja, um lugar físico para vivermos na vida após a morte terrena. É verdade que costumamos imaginar o Paraíso como um local idílico, cercado por paisagens maravilhosas. No entanto, trata-se de uma realidade que está fora da nossa concepção espaço-temporal, pelo que qualquer descrição é apenas simbólica. Jesus não nos está a anunciar um projecto imobiliário. Está, sim, a referir-se a levar-nos “para casa”, para o abraço amoroso do Pai, dentro da vida da Trindade, o único lugar ao qual realmente pertencemos.
Cristo morreu e ressuscitou dos mortos para que possamos receber a graça de nos tornarmos filhos de Deus, participantes do amor que flui entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Como diz o Catecismo da Igreja Católica: “A graça é uma participação na vida de Deus, introduz-nos na intimidade da vida trinitária” (CIC nº 1997).
A referida “intimidade” é o lar que Jesus nos oferece para nossa morada eterna. Segundo o Catecismo, o Céu é uma “comunhão de vida e de amor com Ela, com a Virgem Maria, com os anjos e todos os bem-aventurados. […] é o fim último e a realização das aspirações mais profundas do homem, o estado de felicidade suprema e definitiva” (CIC nº 1024).
Jesus passou toda a Sua vida a oferecer-nos uma relação de amor e um sentido de pertença a quem se encontrava excluído, perdido, solitário, abandonado. Antes de ascender ao Pai, Ele queria ter certeza de que continuaríamos a segui-Lo para encontrarmos o caminho de casa. Um caminho que se faz através da Igreja, onde cada um de nós é membro do Seu Corpo.
O Evangelho deste Domingo é um convite para construirmos paróquias, famílias e comunidades que sejam um reflexo (ainda que imperfeito) da nossa morada final: «Eis que o Tabernáculo de Deus agora está entre os homens, com os quais Ele habitará. Eles serão o seu povo e o próprio Deus viverá com eles, e será o seu Deus. Ele lhes enxugará dos olhos toda a lágrima; não haverá mais morte, nem pranto, nem lamento, nem dor, porquanto a antiga ordem está encerrada!» (Ap., 21, 3-4). Este é o único empreendimento imobiliário no qual vale a pena investir e, graças a Cristo, está acessível a todos!
Pe. Paolo Consonni, MCCJ