A polémica levantada em torno do Primeiro-Ministro Passos Coelho, a propósito das suas relações laborais com a Tecnoforma, empresa de que foi consultor, sendo a principal mecenas da organização não-governamental com o nome de Centro Português Para a Cooperação (CPPC), de que foi presidente entre 1997 e 1999, período em que se encontrava como deputado em regime de exclusividade, tem levantado as maiores interrogações sobre o passado ético do actual chefe do Governo.
Perante uma denúncia anónima de um intitulado “Vasco”, Passos Coelho foi acusado de em finais dos anos 90 e enquanto exercia o cargo de deputado ter recebido rendimentos mensais da CPPC (cerca de mil contos por mês), sem os declarar à Assembleia da República, como seria sua obrigação.
Incomodado com a publicidade que foi feita em torno desta questão, o PM titubeou inicialmente algumas palavras para justificar o seu esquecimento sobre um assunto do passado, mas confrontado com a insistência dos partidos da oposição e com a pressão mediática, para além de requerer um esclarecimento da Presidente da AR, que acabou por ser um “não esclarecimento”, acabou mais tarde por confessar que, de facto, tinha recebido «ajudas de custo» para suportar despesas de representação em nome da CPPC.
Para que não restassem dúvidas sobre o assunto, o PM, sentindo-se ferido na sua boa honra, decidiu submeter ao Procurador Geral da República a apreciação da situação, para confirmar que não teria feito qualquer ilícito. A resposta foi – como qualquer advogado saberia – de que a PGR não poderia investigar uma acção que, a haver ilícito, já havia prescrito.
Instado a revelar se havia recebido tostões ou milhões da CPPC, através da consulta do seu histórico bancário, Passos Coelho recusou fazê-lo, rejeitando fazer um «striptease» das suas contas bancárias, até porque, segundo afirmou, «o orçamento da ONG era diminuto».
Entretanto (e como “cães que não largam o osso”) a Imprensa foi expondo algumas contradições em todo este processo.
Luís Brito, o director-geral da Tecnoforma, que foi responsável pela empresa entre 2001 e 2008, afirma que o Centro Português para a Cooperação custou cerca de 200 mil contos por ano à Tecnoforma. Ou seja, um milhão de euros.
Fernando Madeira, presidente da Tecnoforma na altura em que o actual Primeiro-Ministro era deputado e esteve envolvido na fundação daquela ONG, garantiu que os valores referidos por Luís Brito são «absurdos e falsos». Mas também não adiantou quanto é que foi gasto com o CPPC, para o qual Passos Coelho diz ter trabalhado sem remuneração.
Mais tarde veio a saber-se que a Tecnoforma manteve durante pelo menos 15 anos, entre 1986 e 2001, uma companhia “offshore” na ilha de Jersey, onde eram depositados vários milhões de dólares por ano provenientes de Angola. A companhia em Jersey – a Form Overseas Limited – funcionaria assim como uma espécie de “saco azul” para as despesas não declaradas em Portugal e não constantes das contas da empresa.
No meio de toda esta trapalhada ainda por esclarecer, quer quanto à actividade empresarial e situação fiscal da Tecnoforma (alimentada igualmente por dinheiros vindos de Bruxelas), quer quanto à ONG de Passos Coelho que, segundo já foi afirmado, apenas contribuiu para a formação de duas dezenas de costureiras de um bairro pobre de Portugal e da qual ainda se ignora onde param as suas contas, subsiste a memória de um “déjà vu” em 2011, que se repete agora em vésperas de eleições.
Refiro-me a todo o rol de acusações de que foi alvo o então Primeiro-Ministro José Sócrates, por parte da oposição, nomeadamente do PSD, e de uma certa Imprensa manipuladora que fizeram dele (e ainda fazem) o inimigo público n°1. De todas as acusações que lhe fizeram (excepto as atoardas reles e injuriosas que não merecem ser citadas) foi investigado e, até agora, inocentado!
Resta saber se Passos Coelho cometeu algum crime punido por lei, embora hoje saibamos que se tal aconteceu já prescreveu. Ficará manchada a sua imagem política e os princípios morais exigidos a um qualquer Primeiro-Ministro.
No entanto, e curiosamente, relacionando a semelhança dos acontecimentos, o que parece estar na origem de tudo isto é a confirmação de um velho ditado popular: “Quem com ferro mata, com ferro morre!”.
Luis Barreira