PROJECTO “UMA FAIXA, UMA ROTA”

PROJECTO “UMA FAIXA, UMA ROTA”

Um comboio perdido

Em 1996, na qualidade de residente de Macau e jornalista de profissão, integrei, pela primeira e única vez, um grupo de profissionais da Comunicação Social que a convite da Xinhua visitou uma província para se inteirar do seu acelerado desenvolvimento. Era uma visita totalmente organizada, com um programa definido que incluía a deslocação a uma unidade fabril (ainda em construção) de uma empresa da minha terra natal, Caldas de São Jorge, concelho de Santa Maria da Feira. A Sobrinca, especializada em produtos para bebé, era das poucas empresas portugueses que tivera a visão e a coragem para investir na China.

Até então o conhecimento que eu tivera do Império do Meio era o da China profunda, a China das etnias, a China que pouco ou nenhum contacto tivera com estrangeiros, e a zona costeira, muito mais desenvolvida, desconheci-a.

Banhada ao longo de setecentos quilómetros pelas águas lamacentas do Rio Amarelo, a província da Henan, considerado o berço civilizacional da nação chinesa, preparava-se para entrar no século XXI com ousadia e determinação. Em singular coexistência com uma modernização acelerada e o orgulho próprio dos seus habitantes, permaneciam intactos – dir-se-ia um universo paralelo – marcos de uma herança histórica-cultural multissecular. Das sete capitais que o Império do Meio teceu, três delas, Kaifeng, Luoyang e Anyang, situam-se em Henan, a mais populosa província da China, terra natal do tai-chi, do i-ching (Livro de Mutações), do wushu e de Deng Yaping, a imbatível campeã de ténis de mesa de quem se tanto falava.

A cidade de Zhengzhou, então com seis milhões de habitantes, era o centro administrativo da província e uma das quarenta cidades da China com melhores condições de investimento. Tirando partido de uma situação geográfica privilegiada – no centro da China, principal ponto de confluência viário e ferroviário – Zhengzhou estava empenhada, desde 1992, altura da sua abertura ao mundo exterior, em continuar a marcar presença no topo das vinte ou dez cidades com maiores índices de crescimento da China.

Anfitriões ao longo de uma semana de visita programada, os dirigentes locais, responsáveis da província e das principais cidades, da bolsa de valores ou das principais unidades industriais que nos receberam, não se cansaram de nos fornecer números e estatísticas, para que os anotássemos nos nossos blocos de apontamentos. Eram números que falavam por si, quer se tivesse ou não gosto e aptidão para a matemática. «Temos a maior estação ferroviária da Ásia, com ligações a Roterdão, na Holanda. Por enquanto, apenas ao nível de transporte de mercadorias mas que queremos também que sirva passageiros», garantia Yue Hiu Ming, um desses dirigentes que nos pôs ao corrente da estatística uma hora após a nossa chegada ao velho aeroporto de Zhengzhou. «As obras do novo aeroporto estarão concluídas em Julho próximo», acrescentava esse quadro do Partido cujo sonho – confessava ele – era ser jornalista.

O conhecido pragmatismo chinês manifestou-se em todos os encontros que mantivemos com as autoridades locais e fora do âmbito das reuniões, também os excelentes banquetes (imperiais) com que éramos presenteados, serviam para que nos fossem fornecidos mais dados acerca da província em que todos pareciam ter tanto orgulho. Era esse pragmatismo que fazia com que a China registasse um desenvolvimento económico a todos os níveis notável.

Vem isto a propósito do projecto “Uma Faixa, Uma Rota” e o papel de Portugal nele. Apesar de ser o nosso país, nas palavras do embaixador chinês em Lisboa, «um parceiro endógeno», o certo é que não tem estações nem apeadeiros naquela que é maior via-férrea do mundo: o dito “caminho de ferro da Rota de Seda”, que começou por ligar a cidade de Yuwi a Madrid, num total de treze mil e 52 quilómetros, e agora se estende a muitos outros pontos da China.

Joaquim Magalhães de Castro

 

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