Igreja na China afirmou-se há cem anos
Uma oportunidade única para aprofundar conhecimentos sobre a realidade da Igreja Católica na China e a relação entre o Catolicismo e a Cultura Chinesa. É deste modo que Thomas Cai, director do Centro Xavier para a Investigação da Memória e da Identidade, projecta o Simpósio Internacional que no final deste mês, e ao longo de três dias, vai assinalar o centésimo aniversário do Primeiro Concílio da Igreja Católica na China.
Organizada pelo Centro Xavier e pela Faculdade de Estudos Religiosos e Filosofia da Universidade de São José, a conferência decorre entre 26 e 29 de Junho, reunindo em Macau alguns dos principais especialistas da actualidade em história da evangelização do povo chinês. Académicos, sinólogos e investigadores, como Gianni Criveller, Anthony Lam Sui Ki, Li Peng Yiu, Leo Leeb, Zhu Xiao Hong e Bibiana Wong Yee Ying, vão analisar a história, o significado e o impacto do chamado “Sínodo de Xangai”, com o intuito de procurar entender de que forma o encontro, promovido por D. Celso Constantini, primeiro delegado apostólico da Santa Sé no antigo Império do Meio, moldou o desenvolvimento e a afirmação da Igreja Católica na China nas décadas que se seguiram.
A conferência, sustentou Thomas Cai, foi essencial para compreender melhor o esforço desenvolvido pela Igreja Católica em fazer penetrar a mensagem de Cristo no contexto sócio-cultural chinês. «A nossa perspectiva é a de que o simpósio seja um fórum para que tanto académicos conceituados, como jovens investigadores, possam examinar a história do Concílio e reflectir sobre o significado que o encontro teve nos esforços globais para tornar o Catolicismo mais “chinês”. O tópico da “inculturação” e da “sinificação” ainda tem bastante relevância hoje em dia», disse o director do Centro Xavier para a Investigação da Memória e da Identidade, em declarações a’O CLARIM.
O primeiro Concílio da Igreja Católica na China, que decorreu entre 15 de Maio e 12 de Junho de 1924, pautou um ponto de viragem na forma como o Vaticano concebia a relação com o povo e a cultura chinesa. O encontro marcou o arranque do processo de “descolonização” eclesial da Igreja na China e gerou os primeiros frutos efectivos após dois anos, com a consagração, pelo Papa Pio XI, de seis bispos chineses na Basílica de São Pedro. Os epíscopos foram os primeiros bispos chineses a servirem a população do País em mais de 250 anos da presença da Igreja Católica em território chinês.
LANÇAR AS SEMENTES DO FUTURO
A ordenação dos primeiros bispos chineses, a 28 de Outubro de 1926, deverá ser um dos eventos históricos recordados no Auditório D. Bosco durante os três dias da conferência. Logo no primeiro dia, a iniciativa traz a Macau o arcebispo D. Savio Hon Tai Fai. O actual Núncio Apostólico da Santa Sé em Malta vai debater a “história e a inspiração” que levaram à realização do Primeiro Concílio da Igreja Católica na China. No debate vão participar Gianni Criveller, director da revista Mondo e Missione; Wang Mei Xiu, professor da Academia Chinesa de Ciências Sociais; Anthony Kam Sui Ki, docente da Universidade Shue Yan de Hong Kong; Li Tian Gang, da Universidade de Fudan; Li Peng Yun, da Universidade de Sun Yat-sen; e Bibiana Wong Yee Ying, investigadora da Academia Sinica.
Depois de discutir as origens e os motivos que levaram à realização do chamado “Sínodo de Xangai”, a conferência tenciona abordar o significado e o impacto que o Concílio teve na afirmação de um Catolicismo com características chinesas e na transmissão da mensagem de Cristo ao povo chinês.
No segundo dia do simpósio são aguardadas intervenções de Cindy Chu Yik Yi, da Universidade Baptista de Hong Kong; Zhu Xiao Hong, da Universidade de Fudan; do sinólogo austríaco Leo Leeb, professor na Universidade de Renming; Pan Zhi Yuan, da Universidade de Xangai; e de Claire Chan Mo Chun, do Instituto Tecnológico e do Ensino Superior de Hong Kong. Na qualidade de anfitriã, a Universidade de São José irá estar representada no painel pelo professor Andrew Leong e pelo padre Franz Gassner, antigo director da Faculdade de Estudos Religiosos e Filosofia da USJ. Benedict Keith Ip, director do Arquivo Histórico da Diocese de Macau vai levar à conferência uma perspectiva local sobre a forma como o Concílio foi recebido e interpretado no território.
Para 29 de Junho, terceiro e último dia da conferência, está agendado um painel de discussão sobre a influência que o Concílio de Xangai teve sobre o desenvolvimento da música-sacra chinesa. O tema vai ser abordado por dois investigadores de renome, David Francis Urrows, da Universidade Baptista de Hong Kong, e Lionel Hong Li Xing, da Universidade de Fu Jen.
Até ao momento, o Simpósio Internacional já despertou o interesse de mais de trinta pessoas, mas deverão ser muitos mais as que vão acompanhar a iniciativa por meio das plataformas digitais. «Algumas [pessoas] são de Hong Kong, mas também temos participantes provenientes do Continente. Vamos transmitir o simpósio através da plataforma “Zoom” para que os contributos e as perspectivas dos nossos oradores possam estar acessíveis a pessoas que não têm a oportunidade de viajar para Macau», explicou Thomas Cai.
O primeiro Concílio para a China colocou a presença católica na China na senda da renovação, ao colocar em segundo plano os interesses das forças que procuravam salvaguardar o domínio europeu nas Igrejas do Extremo Oriente. D. Celso Constantini fez, no entanto, muito mais do que apenas relativizar a influência estrangeira. O então futuro cardeal confiou os destinos da Igreja Católica na China ao clero chinês e promoveu a inculturação, uma aposta que o Concílio Vaticano II viria a confirmar mais de trinta anos depois.
Marco Carvalho