25 de Dezembro

PORQUE A GUERRA TAMBÉM TEM DESTAS COISAS

25 de Dezembro

Os primeiros cristãos celebravam a Páscoa, precedida pela Quaresma, mas só alguns séculos mais tarde sentiram a necessidade de festejar o Natal e de o preparar ao longo do Advento. A cronologia dos últimos dias de Nosso Senhor é bem conhecida, mas o dia em que Ele nasceu permanece um mistério. Qual o critério para fixar uma data?

Não sabemos ao certo, mas textos antigos, seguindo uma tradição judaica, fazem coincidir o aniversário da concepção de Jesus com o da sua Ressurreição e o nascimento ocorre nove meses depois da concepção. As tradições litúrgicas oriental e ocidental estimam a data da Páscoa do ano em que Jesus morreu com uma diferença de alguns dias, o que explica a diferença correspondente relativamente às respectivas festas de Natal.

Ainda hoje, a Igreja Latina comemora a Anunciação a Nossa Senhora, o dia em que Jesus foi concebido, a 25 de Março (dia em que teria ocorrido a Páscoa do ano em que Jesus ressuscitou) e o Natal nove meses depois, a 25 de Dezembro. A tradição ortodoxa coloca a Páscoa do ano em que Jesus ressuscitou a 6 de Abril e, portanto, celebra o Natal a 6 Janeiro.

A data de 25 de Dezembro foi uma coincidência feliz, prontamente aproveitada. É que Aureliano, imperador romano, instituíra a comemoração do “Sol Invictus” (Sol Invencível), uma divindade importada da Pérsia, no dia 25 de Dezembro, data aproximada do Solstício de Inverno no Hemisfério Norte. O Solstício de Inverno, que ocorre a 21 ou 22 de Dezembro, conforme os anos, marca o momento em que o Sol está mais baixo e as noites são mais longas. Até então, o Sol perde altura e a escuridão da noite parece vencê-lo, mas, a partir do Solstício, brilha cada vez com mais força, com uma trajectória cada vez mais alta, triunfando sobre as forças contrárias. Para os cristãos, Jesus é o verdadeiro Sol, «a luz verdadeira, que vindo a este mundo ilumina todos os homens», como diz o Evangelho de São João. Por isso, vinha a propósito que o Natal substituísse a festa do Sol Invencível.

Acresce que Jesus ressuscitou no primeiro dia da semana, que no mundo antigo se chamava dies Solis, o dia do [deus] Sol. Em Inglês ainda hoje se diz “Sunday” e em Alemão “Sonntag”. Ora, também esta associação parecia sugestiva.

É difícil reconstituir com certeza a formação dos calendários litúrgicos, que têm apenas um valor convencional, embora este ano tenham adquirido um novo simbolismo.

Mesmo depois da independência, a maioria dos ucranianos manteve-se ligada à Igreja Ortodoxa Russa, sob a autoridade do Patriarca de Moscovo. Inclusivamente, metade das paróquias do Patriarcado estava na Ucrânia, porque os ucranianos são, em geral, mais cristãos. No entanto, quando o Patriarcado de Moscovo instigou a invasão da Ucrânia, a hierarquia e os fiéis deste país romperam a ligação a Moscovo. Este ano, a regra foi cada paróquia escolher autonomamente o dia em que queria celebrar o Natal e o resultado foi a maioria preferir o 25 de Dezembro.

É bom que todos nos juntemos numa mesma data, ainda que as circunstâncias em que a mudança se deu sejam deploráveis. O Papa protesta todos os dias contra «esta guerra sem sentido», que aflige a «querida e martirizada Ucrânia». «Que o nosso olhar se encha dos rostos dos irmãos e irmãs ucranianos que vivem este Natal às escuras, à intempérie, ou longe de suas casas, devido à destruição causada por dez meses de guerra», afirmou o Santo Padre.

José Maria C.S. André 

Professor do Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *