Polícias, quem os acode?

Confesso que tenho ficado agradavelmente surpreendido com o trabalho e a eficácia das nossas polícias e, porque “quem não deve não teme” (situação partilhada pela esmagadora maioria dos nossos cidadãos), é tempo de reconhecer o valor daqueles que têm por missão vigiar o cumprimento da nossa justiça.

Seja a PJ, a GNR ou a PSP, as polícias portuguesas têm demonstrado uma capacidade de trabalho a que muitos de nós não estávamos habituados e um resultado surpreendente nas suas investigações.

Num momento em que as atenções públicas, por razões que todos conhecem, estão cada vez mais voltadas para o crime, quer seja ele de natureza física, financeira ou qualquer outro tipo de corrupção, praticada em desfavor dos cidadãos cumpridores, a acção da nossas polícias tem correspondido àquilo que se espera delas mesmo.

Porque a lista de sucessos policiais é longa, passando pela descoberta de crimes financeiros, avultadas apreensões de droga, armas e dinheiro, até à detenção de perigosos criminosos, só vou referir os mais recentes que, pelo seu simbolismo e impacto público, encheram de orgulho os nossos cidadãos pela competência da nossa polícia.

Uma colaboração entre os nossos agentes policiais puseram a nu um vasto esquema de corrupção na Segurança Social de Lisboa, culminando com múltiplas acusações a pessoas e empresas, nomeadamente ao Coordenador do Centro de Acolhimento do Centro Distrital de Lisboa e ao director do núcleo de gestão do cliente do Instituto de Segurança Social da mesma cidade.

Uma mega operação da PJ e do Ministério Público, em várias repartições de finanças, empresas e escritórios de advogados teve, como consequência, cerca de 15 detenções por corrupção activa e passiva, entre funcionários do Estado e uma clientela empresarial, coadjuvada por advogados menos escrupulosos.

E, como “uma cereja no topo do bolo”, a PJ prendeu por corrupção um antigo procurador e alguns dos seus próprios agentes, acusados de desvio de drogas e negócios com grandes traficantes do narcotráfico.

Nesta última operação foram presos o Inspector-Chefe e um coordenador já reformado, pertencentes à Unidade de Combate ao Tráfico de Estupefacientes que, segundo a acusação e em troca de elevadas somas de dinheiro, permitiam a entrada de grandes quantidades de drogas em Portugal.

Resta agora esperar que os tribunais ajam em conformidade com a eficiência das nossas polícias e não deixem prescrever os respectivos processos…

Falar de polícias portugueses e dos seus sucessos, sem falar das impiedosas situações em que exercem as suas funções, concretamente os escalões mais baixos da PSP e da GNR, era esconder uma outra realidade que, embora dê mais valor às suas realizações, nos envergonha pela ingratidão com que são tratados.

Salários brutos estimados em cerca de 700 euros; semanas a fio a dormir em camaratas que mais parecem currais para porcos; sem protecção contra todo o tipo de prepotências das chefias; deslocados a centenas de quilómetros das suas casas e das suas famílias e sem dinheiro para uma segunda habitação; encharcados em dívidas e com enormes dificuldades para comer e sustentar as suas famílias; peditórios entre os colegas, em auxílio dos mais necessitados; sancionados com meses de suspensão e diminuição de rendimentos se, por “azar”, dão um tiro certeiro num criminoso que perseguem ou têm um acidente com um carro de serviço; famílias destroçadas pelas dificuldades económicas e pela distância; alterações psicológicas sem acompanhamento e tratamento; e, por fim, um frequente índice de suicídios nas suas corporações.

Esta é a outra realidade da grande maioria dos nossos polícias. Uma autêntica injustiça contra quem deve zelar pela nossa justiça.

Uma realidade que os faz temer, para além da sua própria vida, quando enfrentam os marginais.

Uma realidade económica que os sufoca e os enlouquece, conduzindo-os a actos extremos.

Uma realidade que os revolta contra a ingratidão dos poderes públicos, mas não lhes retira o sentido do dever.

Elogiar o trabalho das nossas polícias, sem denunciar a ausência de apoios e meios de que sofrem, é uma hipocrisia destinada a encobrir as próprias deficiências do Estado, numa das áreas mais importantes para todos os cidadãos, a sua segurança!

LUIS BARREIRA

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