PAIS DA IGREJA (30)

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Cirilo de Alexandria: defensor da Theotokos

Hoje vamos falar de São Cirilo de Alexandria, que desempenhou um papel fundamental na confirmação da doutrina de que Maria é Theotokos (Mãe de Deus) e não apenas Christotokos (Mãe de Cristo).

Cirilo era sobrinho de Teófilo, que se tornou Patriarca e Arcebispo de Alexandria em 385. Não se sabe muito sobre a sua infância. “Cirilo nasceu provavelmente na mesma metrópole egípcia entre 370 e 380, foi depressa iniciado na vida eclesiástica e recebeu uma boa educação, tanto cultural como teológica” (Papa Bento XVI, Audiência Geral de 3 de Outubro de 2007).

Em 403, Cirilo acompanhou o seu tio, o Patriarca Teófilo, para participar de um sínodo em Constantinopla que depôs o bispo daquele lugar. O bispo era João Crisóstomo! Este facto mostra-nos que os santos não eram como anjos inocentes que nunca cometeram erros, nem tinham defeitos ou preconceitos. De facto, o rancor de Cirilo contra João Crisóstomo durou até 417 (cf. Quasten, III, pág. 117), dez anos depois da morte de João, quando Cirilo teve um sonho. Nessa altura, Cirilo já era bispo, tendo sucedido ao seu tio Teófilo como Patriarca de Alexandria em 412.

“Uma vez, num sonho, Cirilo viu um templo maravilhoso, no qual a Mãe de Deus estava rodeada por uma série de anjos e santos e João Crisóstomo estava entre eles. Quando Cirilo quis aproximar-se da Santíssima Senhora e venerá-la, João Crisóstomo não o deixou. A Theotokos [Mãe de Deus] pediu a João que perdoasse Cirilo por ter pecado contra ele por ignorância. Vendo que João hesitava, a Mãe de Deus disse: ‘Perdoa-o por mim, já que ele trabalhou muito pela minha honra e me glorificou entre o povo, chamando-me Theotokos’. João respondeu: ‘Por vossa intercessão, Senhora, eu perdoo-lhe’, e depois abraçou Cirilo com amor. Cirilo arrependeu-se de ter mantido a ira contra o grande Santo de Deus. Tendo reunido todos os bispos egípcios, celebrou uma festa solene em honra de João Crisóstomo” (“The Reconciliation Between St Cyril of Alexandria and St John Chrysostom”, https://www.johnsanidopoulos.com/2010/06/reconciliation-between-st-cyril-of.html).

Os santos não são pessoas sem pecado. Também eles são pecadores, mas pecadores que sabem arrepender-se.

No entanto, as relações entre Alexandria e Constantinopla voltaram a deteriorar-se quando Nestório se tornou Patriarca de Constantinopla em 428. Nestório seguiu a doutrina cristã de que Jesus Cristo tinha duas naturezas, humana e divina. Mas, ao contrário da crença cristã, ele também ensinou e pregou que havia duas pessoas em Jesus Cristo: a Pessoa do Logos e a pessoa humana na qual o Logos habitava. Foi a pessoa humana que Maria concebeu, não a divina. Assim, ela podia ser chamada Christotokos (Mãe de Cristo), mas não Theotokos (Mãe de Deus), porque não tinha nada a ver com a divindade de Cristo.

Cirilo escreveu várias cartas a Nestório, admoestando-o sobre a necessidade de ensinar a crença correcta. Na Segunda Carta a Nestório, escreveu: “É essencial explicar o ensino e a interpretação da fé ao povo da maneira mais irrepreensível, e lembrar que aqueles que causam escândalo, até mesmo a apenas um dos pequeninos que acreditam em Cristo, serão submetidos a um castigo insuportável”.

Para alcançar esta fidelidade na doutrina, São Cirilo recomenda: “O meio mais eficaz para alcançar este fim será ocuparmo-nos zelosamente com as palavras dos santos padres, estimar as suas palavras, examinar as nossas palavras para ver se estamos a manter a sua fé tal como está escrita, conformar os nossos pensamentos com o seu ensinamento correcto e irrepreensível”.

Na mesma carta, explicava que “duas naturezas diferentes se juntam para formar uma unidade, e de ambas surgiu um Cristo, um Filho”.

“Assim, aquele que existia e foi gerado pelo Pai antes de todos os séculos, também é dito ter sido gerado de uma mulher, segundo a carne”.

“Se, porém, rejeitarmos a união hipostática por ser impossível ou demasiado imprópria do Verbo, caímos na falácia de falar de dois filhos…. Não devemos, portanto, dividir em dois filhos o único Senhor Jesus Cristo”.

“Porque a Escritura não diz que o Verbo uniu a si a pessoa de um homem, mas que se fez carne. O facto de o Verbo se ter feito carne não significa outra coisa senão que participou da carne e do sangue como nós; fez do nosso corpo o seu próprio corpo e saiu homem de uma mulher, sem abandonar a sua divindade ou a sua geração de Deus Pai, mas permaneceu como Deus enquanto assumiu a carne”. Cirilo repetirá este ensinamento muitas vezes até à sua morte, a 27 de Junho de 444.

Nestório apelou ao imperador romano Teodósio II para que ajudasse a resolver o conflito, pelo que este último convocou o Concílio de Éfeso (o terceiro concílio ecuménico ou concílio de toda a Igreja) em 431. O Concílio confirmou os ensinamentos do Credo Niceno e – contrariamente às expectativas de Nestório – condenou a posição de Nestório. Aceitou os doze anátemas propostos por Cirilo, o primeiro dos quais diz: “Se alguém não confessar que Emanuel é Deus em verdade, e, portanto, que a santa virgem é a mãe de Deus (pois ela deu à luz de forma carnal o Verbo de Deus feito carne), que seja anátema”.

Pe. José Mario Mandía

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