Colocar a Eucaristia no centro da formação católica
Uma tese académica que é também uma proposta de formação eucarística. O padre Daniel Ribeiro, SCJ, responsável pela pastoral de língua portuguesa da igreja da Sé Catedral, defendeu com sucesso, a 8 de Julho, a sua tese de Doutoramento, na Universidade de São José.
O missionário da Congregação dos Sacerdotes do Sagrado Coração de Jesus (Dehonianos), que já se havia debruçado sobre a identidade das escolas católicas de Macau no âmbito dos estudos de Mestrado, propôs-se desta feita perceber de que forma o pensamento teológico do Papa Bento XVI sobre a Eucaristia pode reforçar a missão evangelizadora dos estabelecimentos de Ensino de matriz católica e preparar alunos para uma vida ao serviço da sociedade. Ao longo dos últimos anos, o padre Daniel escrutinou o currículo, a dinâmica, os métodos de ensino e a performance de três dos mais conceituados colégios católicos de Macau – Colégio Diocesano de São José n.º 6, Colégio Yuet Wah e Colégio de Santa Rosa de Lima –, com o objectivo de compreender de que modo a identidade católica dos estabelecimentos molda as convicções e o comportamento dos alunos que lá estudam.
«Logo quando cheguei a Macau, apercebi-me de que pelo menos 35 por cento dos estudantes locais estudam em colégios católicos. O número mostra bem a relevância das escolas católicas», começou por sublinhar o vigário paroquial da Sé Catedral para a comunidade de língua portuguesa, em declarações a’O CLARIM.
O resultado do extenso trabalho de investigação conduzido pelo sacerdote está condensado em “A Teologia da Eucaristia nos escritos do Papa Bento XVI e as suas implicações para a formação de adolescentes nas escolas secundárias de Macau”, a tese que defendeu no início do mês. Nela, argumenta que a qualidade da educação assegurada nos três estabelecimentos de Ensino pode ser melhorada através da adopção de um programa de formação que coloque a Eucaristia no centro do processo educativo. «Uma das conclusões a que cheguei é que a formação religiosa nos colégios católicos é muito boa, o conteúdo teórico é muito bom, mas pode ser melhorado. Apresentei, por isso, uma proposta a que chamei de programa de educação eucarística. Não se trata apenas de criar um espírito e uma cultura de ensino, mas de colocar a Eucaristia no centro da formação católica, mesmo para aqueles alunos que não são católicos e que não recebem a Eucaristia», explicou.
«Qual é a abordagem específica do Papa Bento XVI em relação à Eucaristia? Ele diz que a Eucaristia é um mistério para ser acreditado, celebrado e vivido. Estes três aspectos adequam-se, em grande medida, à vida dos jovens. Quando falamos em Eucaristia, para o Papa Bento, primeiro, entra a parte intelectual, a compreensão. Depois, entra a parte celebrativa, a parte comunitária, o aspecto do relacionamento entre as pessoas e, por fim, a parte da aplicação da vida, que é a Doutrina Social da Igreja, o impulso para se viver aquilo que se celebra. Estes três aspectos são muito práticos e vão ao encontro daquela que é a missão dos colégios católicos», acrescentou o padre Daniel.
MAIS DO QUE UMA CARREIRA
Apesar de defender que o currículo ministrado nas escolas católicas de Macau cumpre o propósito fundamental de educar com valores, o padre Daniel identifica, na sua tese, uma lacuna entre a teoria e a prática. O sacerdote atribui a lacuna, precisamente, à ausência de formação no aspecto sacramental e eucarístico da vida da Igreja e considera que o alinhamento do propósito educativo das escolas com a teologia eucarística do então cardeal D. Joseph Ratzinger não só elimina essa lacuna, como propicia aos alunos uma educação mais sólida, mais holística e mais humana. «Um colégio católico tem três missões: a evangelização, a vida em comunidade – que é mais do que uma instituição, é uma comunidade – e, ainda, preparar os alunos para que estejam ao serviço da sociedade. Não se trata apenas de lhes proporcionar uma carreira», argumentou. «Estes três aspectos também estão relacionados com a teologia eucarística do Papa Bento XVI. Quando digo que a Eucaristia é um mistério para ser entendido, corresponde à necessidade da Escola de evangelizar. Quando digo que a Eucaristia é um mistério para ser celebrado, corresponde à necessidade de o Colégio viver em comunidade, de as pessoas se encontrarem. Quando falo de a Eucaristia ser uma realidade para ser vivida, mostra a necessidade da caridade e dos colégios prepararam os alunos para estarem ao serviço da sociedade», especificou.
O necessário realinhamento, reforçou, pode ser conduzido sem que uma revolução no currículo e nas práticas de ensino actualmente em vigor se faça necessária. A forma como o currículo religioso das escolas católicas de Macau está estruturado permite destacar a natureza eucarística dos ensinamentos da Igreja sem que se sacrifiquem outras facetas e valores: «A minha proposta não é que se mudem os currículos das escolas, até porque o currículo que já existe dá para enfatizar a temática da Eucaristia. Por exemplo, os currículos aqui dão ênfase à temática da Cristologia, a Cristo. O aspecto central da Cristologia é o mistério da Paixão de Cristo, os três últimos dias da vida de Cristo. E não há como falar disso sem referir a Eucaristia. Quando no currículo se fala sobre Igreja e sobre o aspecto da Eclesiologia, a Igreja e a Eucaristia são, também, realidades inseparáveis. Através do currículo que já existe é possível destacar a temática da Eucaristia».
Para o padre Daniel, mesmo que as recomendações que emite não sejam acatadas, circunstância alguma rouba um poder transformador à empreitada intelectual a que se dedicou ao longo dos últimos anos. O estudo, garantiu, fez dele um melhor sacerdote: «Este trabalho ele teve um valor muito grande na minha vida como padre. Ajudou-me a compreender melhor a Eucaristia, celebrá-la melhor e vivê-la melhor. Para mim foi um grande fortalecimento na minha vocação».
Marco Carvalho