Ou comem a “sopa”, ou levam com o Sócrates!

O debate da passada semana, entre o líder da coligação governamental Passos Coelho e o Secretário-Geral do Partido Socialista, António Costa, não veio acrescentar muito àquilo que os portugueses deveriam saber para decidirem o seu voto antes das eleições legislativas do próximo mês de Outubro. Apesar das múltiplas sondagens, da opinião da maior parte dos comentadores e dos “decifradores” de gestos e posições terem dado uma vitória a António Costa, pela sua firmeza e atacante iniciativa no debate televisivo, o que este disse e afirmou claramente não constituiu uma novidade para os milhões de espectadores que assistiam curiosos a este “frente a frente”. Ao longo destes quatro anos os cidadãos tiveram tempo suficiente para julgar as atitudes do Governo e as críticas e projectos da oposição e decidir o sentido do seu voto.

O que poucos estavam à espera é que Passos Coelho tivesse introduzido, de forma tão clara e continuada, um outro participante no debate que não estava em estúdio e, portanto, não se podia defender.

Após ter afirmado antes e repetidamente que “o PSD não deve usar o Sócrates” como “arma de arremesso”, porque “para nos defendermos não precisamos de atacar ninguém”, Passos Coelho chamou Sócrates para o debate, tentando responsabilizar António Costa pelas acções do antigo Primeiro-Ministro e pela pré-falência do País, há quatro anos atrás. A insistência de Passos foi de tal ordem que, a dada altura, o seu interlocutor, António Costa, o aconselhou, no caso de querer debater os casos do Governo anterior, a ir visitar Sócrates, agora em prisão domiciliária, expondo os seus argumentos.

Só há uma explicação para tal comportamento do actual Primeiro-Ministro. Perante o candidato António Costa, o único que apresentou um conjunto de posições e propostas de Governo, sustentadas por uma análise económica séria e independente, Passos Coelho não conseguia contra-argumentar e só lhe restava refugiar-se no “fantasma” de Sócrates para convencer os indecisos a votarem na sua “sopa”. Indecisos que não esquecem (ou não deverão esquecer) que o rendimento dos portugueses mais pobres desceu 24% entre 2009 e 2013, enquanto cresceu o número de multimilionários e aumentou o valor das suas fortunas (relatório da “Ultra Riqueza no Mundo 2013”) e, segundo estudos efectuados pela Universidade Católica, aumentou de 17% em 2010, para 31% em 2015, o número de utentes empregados que recorrem às instituições de solidariedade social para obter alimentos.

Entretanto, relacionado com o “fantasma Sócrates” e no contexto de uma acusação explícita de Passos Coelho, de que foi ele (Sócrates) que chamou a Troika e implícita a António Costa, tentando responsabilizá-lo por ser militante do mesmo partido, ressurgem revelações já há muito conhecidas, mas que os “indecisos” tendem a esquecer:

– Passos Coelho esteve inicialmente de acordo com o famigerado PEC 4 do Governo minoritário de José Sócrates e, à última hora, retirou-lhe o apoio… e o Governo caiu;

– não nos esquecemos das imagens televisivas em que, na Comissão Europeia, Angela Merkel “puxa as orelhas” a Passos Coelho por ter estado em desacordo com o tal PEC 4;

– e não nos esquecemos também do ar triunfante de Eduardo Catroga (braço direito de Passos Coelho nas negociações com a Troika e actual presidente da EDP, com um salário mensal superior a 45 mil euros, a acumular com uma pensão de 9.600 euros), quando se apresentou publicamente como o responsável por ter forçado o Governo de Sócrates a assinar o “memorando”.

– também não se esquece (embora o tempo às vezes pregue partidas aos indecisos) quando, em Maio de 2013, António Lobo Xavier (CDS) declarou que o PSD e o CDS é que forçaram a intervenção da Troika e que nem Merkel queria que o resgate tivesse acontecido assim.

Mas tudo isso são coisas de um passado que não convém esquecer mas, o que é muito mais importante em vésperas de eleições, é saber o que cada um dos candidatos quer para o futuro deste tramado país, em luta pela sobrevivência da sua independência e do bem estar dos seus cidadãos.

O “irrevogável” Paulo Portas, parceiro da coligação governamental e à falta de um programa próprio do seu Governo (que não seja o da Troika), já afirmou recentemente em Ovar as suas propostas para o futuro dos portugueses, pelo menos para as mulheres portuguesas, dizendo: «as mulheres sabem que têm de organizar a casa e pagar as contas a dias certos, pensar nos mais velhos e cuidar dos mais novos».

Será que lançou mais uma das suas fantasias? Desta vez o regresso ao passado (“Estado Novo”)?

LUIS BARREIRA

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