Olhando em Redor

Uma mão lava a outra

«Entre um projecto dos anos 60, cuja fachada considero que não tem grande interesse, do que me lembro e pelas fotos que enviou, e um projecto do arquitecto Álvaro Siza [Vieira], do século XXI, prefiro um projecto novo», disse Souto de Moura, em declarações prestadas por e-mail ao Hoje Macau.

A reacção do conceituado arquitecto português veio na sequência do que fazer ao velho Hotel Estoril, sendo ponto assente que Álvaro Siza Vieira, detentor de um prémio Pritzker (tal como Souto de Moura), e futuro autor do novo projecto para zona do Tap Seac, defende a total demolição da fachada e do edifício que alberga o hotel.

Ao admitir que a sua opinião foi baseada no que se lembra e também pelo que viu em algumas fotos, Souto de Moura mostrou uma inqualificável ignorância pelo significado histórico que o antigo Hotel Estoril representa para Macau.

Se a sua conclusão teve o intuito de dar mais uma achega a favor de um colega de profissão, sem ter em conta outros aspectos relativos às especificidades da área envolvente, foi pior a emenda do que o soneto. O reconhecimento internacional e as obras premiadas pelo Homem pouco valem quando a pessoa não está à altura. E Souto de Moura não esteve à altura.

Alexis Tam, secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, deve ouvir as opiniões das gentes de Macau, e não de quem denota perceber pouco deste território. Ou não fosse “Macau governada pelas suas gentes”, conforme se lê num bom livrinho de capa verde.

Tivesse Souto de Moura outra postura, mesmo que continuasse a defender a demolição total do antigo Hotel Estoril, e então dava-lhe crédito. Como tal não aconteceu, só tenho que condenar a sua posição.

 

É preciso TER lata

A Polícia Judiciária mostrou, mais uma vez, grande eficiência ao deter na passada segunda-feira cinco indivíduos responsáveis pelos graffiti que foram pintados com lata de spray, em meados de Julho, nos muros exteriores da Galeria 10 Fantasia e do edifício com o nº 23, nas escadarias em frente ao Albergue Santa Casa da Misericórdia.

Após queixa apresentada pelo Instituto Cultural, foi através das imagens de videovigilância que a PJ conseguiu chegar aos alegados autores das sete inscrições de tinta negra nos edifícios classificados como património histórico.

Saúda-se o empenho e a eficácia da PJ em levar os infractores à justiça, do mesmo modo que se saúda o papel interventivo do IC, como forma de preservar um legado que nos pertence. Lamenta-se a actuação dos indivíduos que vandalizaram o património histórico, até porque não reflecte a postura da comunidade a que pertencem.

Embora os sete gatafunhos muito dificilmente pudessem ser considerados “arte urbana”, conforme atestou o Ponto Final, aproveito o momento para instar o Governo a pensar numa alternativa para que artistas em potência possam dar asas ao seu talento e que os graffiti, quando devidamente enquadrados, sejam considerados uma expressão de arte criativa.

Nesse sentido, sugiro que o Governo utilize parte do novo aterro da denominada “Zona E” para construir um espaço destinado a alguns desportos radicais, que inclua uma parede vertical para escalada e outra para os graffiti.

Desta forma, todos os artistas em potência, com paixão pelo graffiti, terão um espaço adequado, deixando assim de ser vistos como marginais aos olhos da sociedade.

Por outro lado, espero muito sinceramente que a eficácia da PJ se estenda, por exemplo, à solicitação de serviços sexuais em determinados pontos do território, onde os proxenetas estão descansadamente perto das suas “protegidas”, bem à vista dos transeuntes, mas invisíveis ao olhar das autoridades policiais.

 

Ar fresco

A indústria discográfica é insignificante em Macau, quando comparada, por exemplo, com Hong Kong ou com a China continental. O mesmo pode dizer-se do cinema ou, em termos gerais, de outras expressões artísticas. Poucos são os músicos, ou as editoras, a arriscar o lançamento de álbuns para um mercado de dimensão tão reduzida, seja porque não vale a pena, ou porque ninguém dá importância ao trabalho realizado, o que à partida revela uma mentalidade acanhada e preconceituosa.

A lufada de ar fresco chegou-nos através dos artistas “Made in Macau”, Josie Ho, Hyper Lo e AJ, da editora SP Entertainment, com o lançamento, na passada terça-feira, de um livro e novos álbuns. Com efeito, Macau ganha importância com o arrojo e empreendedorismo das novas gerações, mas para que tal possa ter o efeito desejado também é preciso que as entidades competentes e o sector privado tenham uma visão mais abrangente, em vez de serem estritamente selectivos.

No caso do Governo, que as oportunidades sejam iguais para todos, em vez de serem usados, por vezes, critérios muito pouco transparentes na selecção dos apoios. No caso do sector privado, que o envolvimento em outras áreas que não a do seu âmbito preferencial de negócio também ajude a projectar a imagem de Macau, aquém e além fronteiras, à imagem do que tem feito a Sands China.

Quanto a Josie Ho, Hyper Lo e AJ, não tenho dúvidas que parte do seu sucesso também estará nas mãos da TDM, que pode prestar um grande serviço público na divulgação dos seus trabalhos, seja através da transmissão de “video clips” musicais (incluindo no Canal Macau), seja através de outras formas de fazer chegar o seu trabalho ao público local. Aos artistas, desejo-lhes boa sorte e muitos sucessos.

PEDRO DANIEL OLIVEIRA

pedrodanielhk@hotmail.com

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