O “Super” Mário. De besta a bestial

Se há dois anos alguém me dissesse que o ministro das Finanças de Portugal, Mário Centeno, iria ser escolhido, como foi, para presidente dos dezanove ministros das finanças da Zona Euro, acharia que se tratava de uma piada depreciativa para o sujeito. Isto porque, nessa altura, a desconfiança e difamação para com a actual solução governativa e para com as propostas do projecto do Governo imperava entre a imensa maioria dos restantes ministros das finanças da União Económica e Monetária, para quem a nossa política económica e social se afastava do rigor das regras estabelecidas por eles.

No entanto, ao longo do tempo, face aos sucessos deste Governo em conciliar as regras europeias do euro com a estabilidade governativa e ao aumento dos índices económicos e a melhoria das condições de vida das camadas mais desprotegidas da população portuguesa, foram sendo visíveis as alterações de “humor” de alguns dos ministros europeus, de onde se destacou o inflexível ministro das Finanças alemão, que veio recentemente a declarar que Mário Centeno era o “Ronaldo do Ecofin”.

E afinal, dois anos depois e apesar do então presidente do Eurogrupo, o holandês Jeroen Dijsselbloem, ter declarado que “os portugueses gastam o dinheiro em copos e mulheres” (e nunca ter pedido desculpa por esta ofensa), Mário Centeno veio a ser eleito para presidente do Eurogrupo, reconhecido pelos seus pares pelo excelente trabalho que tem feito em Portugal.

Se bem que esta importante e nova responsabilidade do nosso ministro seja prestigiante para Portugal, para a credibilização do Governo e tenha de ser conciliada com as suas funções nacionais, enquanto ministro das Finanças de Portugal, esta situação tem levantado algumas questões quanto ao futuro da sua eficácia.

Todos os portugueses, que querem continuar na União Europeia e a ter o euro como moeda, habituaram-se a ter um ministro atento às contas nacionais, às necessidades da economia e a reconhecer a sua motivação social. No entanto, este novo ciclo governativo, até às próximas eleições legislativas portuguesas, vai ser extremamente reivindicativa por parte dos actuais parceiros do Governo e politicamente difícil de sustentar, no quadro da estabilidade social que se tem vivido. Tais circunstâncias vão requerer uma atenção muito especial das finanças públicas, para que não haja derrapagens orçamentais. Estarão Mário Centeno e os respectivos quadros do Ministério das Finanças preparados para este desafio, com o ministro assoberbado de trabalho no Eurogrupo?

Trabalho que, em Bruxelas, não vai ser fácil! Para além dos assuntos actualmente em discussão, que abrangem alguns desvios orçamentais de vários países e a normalização da situação grega, todos esperam que se concretize agora a reforma da zona euro, com uma clarificação do futuro papel e transparência do Eurogrupo, anulando as suas actuais disfuncionalidades, estabelecendo um conjunto de novas regras para a moeda única e impedir que se repita, pelos mesmos motivos, a crise que afectou recentemente os países da União Europeia, nomeadamente os do Sul.

Uma outra matéria que justifica alguma expectativa é saber como Mário Centeno vai conciliar a sua atitude crítica para com algumas das regras impostas aos países que aderiram ao euro, nomeadamente aqueles que, como Portugal, não dispõem ainda de uma máquina económica forte, em eventual confronto com a pressão de outros grandes países europeus que têm assumido uma posição de dureza na aplicação de algumas das regras que então estabeleceram?

Ou as suas eventuais críticas e alternativas são perfeitamente diluídas nos consensos que vai ter de aceitar por maioria dos seus pares, aceitando todas as implicações, mesmo que eventualmente gravosas para Portugal. Ou defende forte e publicamente as suas posições alternativas, no seio do Eurogrupo e em Portugal, opondo-se claramente às posições contrárias às suas, o que lhe pode valer o mesmo desfecho que teve o anterior ministro das Finanças grego. Ou, evocando a célebre rábula da saudosa Ivone Silva, Mário Centeno terá uma dupla posição, cá e lá, ou seja: “Olívia costureira, em Portugal, Olívia patroa, em Bruxelas”.

Sejam quais sejam, no País e na Europa do euro as implicações da investidura do nosso ministro das Finanças nesta instituição europeia nada, até ao momento, pode ser negativamente diagnosticado.

Mário Centeno tem dado provas da sua capacidade de gestão equilibrada das contas nacionais, da justeza da sua argumentação e do seu sentido de responsabilidade social, e queremos acreditar que o irá manter em Portugal e na Europa. Como o irá fazer? Vamos ver!

O que não desejaríamos era que esta “promoção europeia” fosse um presente envenenado, com a intencionalidade de anular o homem e um excelente ministro das Finanças de Portugal, que teve a coragem de encontrar novos rumos para o País e a ousadia de desafiar alguns tabus das normas orçamentais da União Europeia.

LUIS BARREIRA

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