Filosofia, uma dentada de cada vez (43)

O que são os Sentidos Internos?

Agora estamos a explorar a imprevisibilidade do Homem, mas ainda há muitas coisas que temos que aprofundar antes de podermos responder a essa questão. Hoje veremos como nós e os animais processamos a aquisição dos estímulos sensoriais.

Da última vez examinamos o acto de Conhecer através dos nossos sentidos externos. Mas a nossa própria experiência leva-nos a descobrir não apenas os sentidos externos mas também os sentidos internos (ver São Tomás de Aquino, “Summa Theologiae” I, q 78, a 4).

Tanto os animais como o Homem têm a capacidade não apenas de distinguir o estimulo particular de cada sentido externo, mas também de combinar os estímulos dos diferentes sentidos e identificar esses estímulos vindos de um objecto.

Por exemplo, os olhos vêem a cor de uma maçã, o nariz sente o seu cheiro, a língua prova-a, as mãos sentem-na, mas existe algo em nós – um sentido interior – que junta todas estas diferentes sensações e identifica-as como pertencendo a um objecto: a maçã. Isto é o que Aristóteles chamou de “koine aisthesis”, a qual São Tomás traduzia como “sensus communis”, ou literalmente “senso comum”. Para evitar confusões, normalmente chamo-lhe de “sentido coordenador” ou o “sentido central”. Uma das funções do “sensus communis” é distinguir o estímulo específico de cada sentido. Esta função é importante, especialmente por distinguir o estímulo da imaginação (outro sentido interior) e os sentidos exteriores. Sabemos que existem algumas doenças psicológicas que afectam esta função, tais como o facto de uma pessoa não ser capaz de distinguir entre o que vê no mundo real e o que apenas imagina. Conhecemos muitas pessoas “normais” que dependem mais daquilo que imaginam do que da realidade.

A imaginação é outro sentido interior ao qual somos bastante familiares. Ela tem um duplo papel. Um é o de reproduzir a imagem de algo quando essa coisa não esta presente. Além disso, não apenas reproduz uma imagem, como também tem a capacidade de juntar imagens que viu anteriormente. Esta é a sua segunda função, à qual podemos chamar de função criativa. Um artista, na realidade, não cria uma obra de arte a partir do nada. Ele baseia-se em obras de arte anteriores ou na sua própria observação directa da beleza na natureza para compor uma peça. Quanto mais observador ele for, maior é a possibilidade de criar arte “nova”.

A imaginação criativa também é muito activa quando sonhamos. Durante esses momentos o nosso intelecto (o qual devemos estudar mais tarde) não supervisiona ou controla a acção da imaginação. Isto porque muito frequentemente os nossos sonhos são do-outro-mundo, irracionais ou fantásticos.

Além do “sensus communis” e da imaginação, ainda temos um outro sentido que identifica um objecto como passado. É aquilo a que chamamos de memória. Também ajuda os animais e o Homem a identificarem entre os objectos que são úteis e os que são perigosos. Esta função da memória é uma ajuda ao quarto sentido interno: aquilo que São Tomás chamava de poder “estimativo” (para os animais) ou poder “cogitativo” (para o Homem).

O poder estimativo é também chamado de “instinto”. Como sabemos o instinto ajuda-nos a diferenciar entre algo que nos é perigoso do útil. É isso que diz a um animal como deve reagir a um certo estímulo. No Homem o poder cogitativo tem funções mais elevadas. Ele prepara a imagem que se formou nos sentidos interiores para ser accionada pelo intelecto, de forma a que o intelecto possa abstrair a essência da imagem.

Pe. José Mario Mandía

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