Mudança de ares
A vida é feita de ciclos e a nossa nunca fugiu à regra. Quem me conhece sabe que, desde sempre, optei pelo caminho menos percorrido. Primeiro, indo para o Oriente sem qualquer amparo; depois, optando por ingressar numa entidade sob a alçada do Governo de Macau, a qual – passados alguns anos de estabilidade – troquei por aquilo que apelidaram de uma “completa maluqueira”: uma viagem e experiência de vida que, ainda hoje, não trocaríamos por nada…
E depois, por ironia do destino, regressei ao país onde nasci e aqui optámos por nos dedicarmos a uma actividade num ramo completamente diferente do que conhecíamos até então. Agora, quando todos pensavam que estaríamos acomodados, decidimos fazer as malas e mudar de ares, novamente.
Depois de cinco anos a gerir uma bem sucedida empresa de “catering” e de eventos, e de um ano a gerir um restaurante de comida tailandesa, que desde o primeiro mês apresentou lucros acima do esperado, achámos que chegou a altura de vivermos num país em que a língua seja o Francês. Tanto a NaE como eu dominamos a língua francesa e somos licenciados; o mesmo queremos para a nossa filha. Sendo que a Maria se aproxima, a um ritmo galopante, dos dez anos de idade, consideramos ser este o momento ideal para abraçarmos outro projecto.
Desta vez o incentivo partiu da NaE, que foi convidada para gerir a cozinha de um novo restaurante tailandês que inaugurou na Cidade do Luxemburgo, a capital do país com o mesmo nome. Isto depois de ter ponderado, durante semanas, um convite semelhante que recebeu para a Suíça. Daí a razão da nossa recente viagem a este país.
No entanto, depois de ponderadas várias condicionantes, a opção pelo Luxemburgo acabou por vingar.
Se me perguntarem se o Luxemburgo era a minha primeira escolha, confesso que não! Mas como em tudo na vida, e em especial na vida de um casal, tem de haver compromissos. Como me adapto muito bem onde quer que esteja, que seja então o Luxemburgo. Seremos mais três a engrossar as já numerosas comunidades portuguesa e tailandesa ali existentes.
O único requisito para a nossa mudança de vida foi um destino onde se fale Francês, pois a Maria precisa de ingressar no sistema oficial de ensino francês. No caso do Luxemburgo até será mais do que isso, uma vez que irá também aprender Alemão e Luxemburguês. Quanto ao Português, terá aulas em horário nocturno, desde que consiga conciliar com todas as outras actividades extracurriculares, nomeadamente com o violino que já lhe ocupa dois dias por semana – um instrumento de que gosta cada vez mais.
Posto isto, aqui em Portugal estamos a encerrar mais um capítulo da nossa vida, depois de o termos feito em Macau e nas Caraíbas. Como a maioria dos nossos leitores sabe, nunca nada é simples, ainda para mais quando se trata de Portugal onde a burocracia parece não acabar. A agravar (entre aspas) a situação, assim que foi tornada pública a nossa saída e o consequente encerramento do Dee Thai Eatery, todos decidiram vir comer ao nosso restaurante.
É que se foi algo complicado abrir o restaurante, mais complicado está ser o seu encerramento. Há contratos assinados a longo prazo, o que obriga à sua renegociação com os fornecedores. As reuniões vão-se sucedendo e parecem não ter fim, mais não seja porque os contratos foram assinados com o objectivo de fornecer o restaurante e não a empresa que o detém. Esta é proprietária de muito mais do que apenas o restaurante, mas infelizmente estas cabeças não conseguem entender a diferença entre o que é o restaurante e o que é a empresa sua proprietária. Se a empresa continua a operar, mesmo com o restaurante fechado, por que razão nos querem obrigar a continuar a pagar o alarme, o material de limpeza, o tratamento de óleos, etc., etc. Isto que sirva de alerta para quem tenciona instalar-se e abrir um negócio em Portugal.
Quando a realidade é deixarmos, dentro de pouco tempo, este “paraíso” à beira mar plantado, começamos a olhar para trás e para o trajecto que cumprimos desde Setembro de 2016 e sentimos alguma nostalgia. Para nossa alegria e conforto, temos a convicção de que não faríamos nada de diferente.
A razão porque viemos para Portugal não foi a mais positiva, mas nem por isso nos arrependemos de termos assentado arraiais neste país maravilhoso. Infelizmente, cada vez mais é mal gerido, politicamente falando. O facto de termos dado à nossa filha a oportunidade de conviver de perto com os avós paternos, durante anos tão importantes para a formação da sua personalidade, é algo insubstituível – e ela bem sabe disso.
Já a partir do final deste mês estaremos a viver no Grão-Ducado do Luxemburgo. É ali que a 1 de Novembro a NaE irá assumir as suas novas funções, ficando a Maria com os avós. Não fazia sentido estar a ser transferida a meio deste trimestre. A ida para ao pé dos pais e o ingresso na nova escola acontecerá depois do Natal; esperamos que seja uma transição suave ou pelo menos sem grandes sobressaltos. Aliás, a Maria tem sido parte integrante neste processo. Nada foi decidido sem que ela participasse com a sua opinião. A mudança de país, de escola, de colegas e de ambiente é feita com o seu total consentimento.
Quanto a mim, inicialmente cabe-me ser o pilar de suporte da NaE. Mais tarde, tendo em conta o mercado de trabalho no Luxemburgo, encontrarei algo para fazer em termos profissionais. Felizmente, neste aspecto, o País oferece bastantes oportunidades de emprego, mesmo em Português. No entanto, sendo este um novo ciclo nas nossas vidas, quiçá até possa surgir um novo desafio em Francês, a minha língua de eleição.
João Santos Gomes