Herdeiros do Reino dos Céus

A pobreza que os cristãos vulgares podem viver

Deus fez o Mundo para todos, e todos têm o direito de usufruir o que Deus fez.

Todos nós temos a responsabilidade de gerir o que foi criado por Deus, de tal forma que ninguém nunca tenha falta do que necessita para ter uma vida humana e digna. No Antigo Testamento, dizia-se às pessoas: «Não roubarás» (Exodo 15:20). Mas no Novo Testamento Jesus eleva os requisitos para um nível superior: «Bem aventurados os pobres em espírito, porque deles será o Reino dos Céus» (Mateus 5:3). Ele pede-nos que não sejamos possessivos, de forma a sermos livres para dar.

Ainda no mesmo capítulo, Jesus diz aos que o ouvem: «Não pensem que vim para abolir a lei e os Profetas; Não vim para os abolir, mas sim para os enaltecer» (v 17). Ele sublinha aos seus ouvintes que devem ter objectivos mais elevados: «Em verdade Vos digo, a menos que a vossa rectidão exceda a dos escribas e a dos Fariseus, vós nunca entrareis no Reino dos Céus» (v 20). E depois apresenta-lhes exemplos, contrastando o que «vos foi dito pelos anciãos» (v 21) com aquilo que «Eu vos digo» (v22).

O Papa Bento XVI disse que «os ensinamentos de Jesus [sobre a pobreza] mesmo se verdadeiros e válidos para todos, é praticado de diferentes formas, de acordo com as nossas diferentes vocações: um frade franciscano poderá segui-la mais radicalmente, enquanto que um pai de família deverá tomar em consideração os seus deveres para com a sua esposa e filho» (Mensagem do Angelus, de 27 de Fevereiro de 2011).

Como podem os cristãos vulgares viver na pobreza de espírito? Quais são as características da pobreza cristã? Deixem-me elaborar alguns pontos a seguir extraídos dos ensinamentos de São Josemaría.

1– Efectuar um trabalho honesto e competente. São Paulo avisou: «Se alguém não trabalhar, deixem-no sem comer. Ouvimos dizer que alguns de vós vivem sem trabalhar, meros parasitas, sem qualquer tipo de trabalho. Assim nós ordenamos e exortamos em Nosso Senhor Jesus Cristo para fazerem o seu trabalho calmamente e auferirem o seu próprio sustento» (II Tessalónios 3:10-12). Auferir o nosso sustento é o reconhecimento de que não possuímos nada. Isso é obediência à ordem do Criador para que cuidássemos e tratássemos da Terra (Génese 2:15).

2– Não criando necessidades para nós próprios. Algumas pessoas sentem-se valiosas, apenas porque possuem as ultimas novidades ou as coisas mais caras.

Mas São João Paulo II afirmou que o Homem tem valor, não pelo que tem, mas pelo que é. Nós degradamo-nos quando desejamos possuir o último objecto da moda.

3– Tomar conta das coisas para que durem. Nós gostamos de coisas novas, e abominamos coisas velhas. O Santo Padre tem falado muito sobre a nossa cultura do despesismo. Deitamos fora as coisas, deitamos fora as pessoas, e deitamos fora os bebés, ainda no ventre materno.

Adquirir coisas baratas não é, necessariamente, um sinal de pobreza. Quando algo é barato devido a fraca qualidade, poderá não durar muito, levando a maiores despesas.

4– Não guardando coisas supérfluas. São João Paulo II tinha o hábito de dar a terceiros todos os presentes que recebia das outras pessoas, ao ponto de que os outros deixaram de lhe oferecer presentes! Deixem-nos fazer um simples teste. Abram os vossos guarda fatos, agora, e olhem conscientemente para o vêm no seu interior. “Existe aqui algo que eu não tenha usado a mais de um ano?”

Quando o Papa Francisco estava ainda há poucos dias no Vaticano passou por uma sala que tinha todas as luzes acesas. Ele perguntou a quem o acompanhava se havia alguém que trabalhasse nessa sala. A resposta foi não, habitualmente ninguém costumava trabalhar ali. O Santo Padre perguntou então porque é que as luzes estavam todas acesas, e o seu acompanhante respondeu-lhe que era um procedimento habitual. Aí, o Santo Padre, disse: «Vamos apagar as luzes. A economia que fizermos poderá pôr um rapaz pobre a estudar num seminário».

5– Não reclamando quando se tem poucos bens essenciais. Quando Jó estava privado de tudo com os seus filhos, o que diziam? «Nasci nu do ventre da minha mãe, e será nu que deverei regressar. O SENHOR deu, e o SENHOR tirou, abençoado seja o nome do SENHOR» (Jó 1:21).

6– Ser generosos para com os outros. Pobreza não é miserável ou mesquinha. Há aquela história do milionário que foi a uma agência funerária comprar flores já usadas para oferecer à sua esposa no dia do seu aniversário. Isto não representa pobreza cristã. Isto representa amor pelo dinheiro. Uma pessoa pobre de espírito não é um miserável. Ele sabe como receber e dar generosamente.

Madre Teresa de Calcutá uma vez relembrou uma lição que aprendeu com uma família Hindu, pobre. «Um homem veio à nossa casa, e disse: Madre Teresa, há uma família com oito crianças que não têm nada para comer há muito tempo – faça algo. Por isso agarrei num punhado de arroz e fui imediatamente a essa casa. E vi as crianças – os seus olhos brilhando com fome – não sei se alguma vocês viram FOME. Mas eu tenho-a visto muitas e repetidas vezes».

E ela continuou: «A mãe das crianças agarrou no arroz, dividiu-o em porções mais pequenas e saiu. Quando ela regressou perguntei-lhe, onde fora, o que fizera? E ela deu-me uma resposta muito simples: “Os meus vizinhos também têm fome”. Mas o que mais me espantou foi que ela sabia bem que eles eram, e eles eram uma família muçulmana».

Numa outra ocasião, a Bem Aventurada Madre Teresa contou esta história: «Há algum tempo, em Calcutá, estávamos a ter grandes dificuldades para arranjar açúcar: e um rapazinho de quatro anos de idade, um rapaz Hindu, em sua casa, disse as pais: “Não vou comer açúcar durante três dias, e darei o meu açúcar a Madre Teresa para as crianças dela”. Ao fim dos três dias os seus pais trouxeram essa criança à nossa casa. Nunca os tinha visto antes, e esse rapazinho mal conseguia pronunciar o meu nome, mas sabia exactamente o que o levara a até ali. Ele sabia que ele queria partilhar o seu Amor».

Pe. José Mario Mandía

(Tradução: António R. Martins)

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