Da má-língua às ameaças

Numa semana Portugal passou a ser motivo de comentários internacionais e nem sempre por motivos que o justifiquem positivamente.

No futebol, ao eliminarmos a Polónia, foi por sorte!?… A nossa selecção não presta,… Ronaldo está acabado,… a equipa nacional é um perfeito desastre,… não merecemos o lugar a que chegámos,… etc. Todos estes “inocentes” comentários, veiculados pela imprensa desportiva internacional, cheiram a “dor de cotovelo” de alguns países eliminados e a uma tentativa de desmoralização da nossa Selecção.

Se os comentários maldosos sobre a “bola” têm consequências fortuitas e emocionais na auto-estima dos portugueses, já as ameaças de sanções europeias sobre Portugal e os portugueses, por termos ultrapassado o défice de 3% em 2015 (3,1, sem os prejuízos provocados pelo Banif), têm consequências muito mais perniciosas sobre todos nós.

Os partidos políticos portugueses responsáveis pela governação do País em 2015, o PSD e CDS, tal como todos os outros partidos, incluindo o Presidente da República, consideram absurdo que Portugal seja penalizado por ter seguido escrupulosamente a política económica e social determinada por Bruxelas.

Dombrovskis, um letão, vice-presidente da Comissão Europeia, veio a público sugerir o congelamento dos fundos estruturais a Portugal, como castigo por termos derrapado no orçamento previsto para 2015. Klaus Regling, o director do Mecanismo Europeu de Estabilidade, disse que independentemente do Brexit o único país com que está preocupado é com Portugal. Para fechar o leque de outros comentários semelhantes, produzidos por burocratas europeus, o “dono disto tudo”, o ministro das Finanças alemãs, Schäuble, disse que Portugal vai pedir outro resgate, considerando posteriormente que a sua frase tinha sido mal traduzida…

Também em Portugal, como a cereja no topo de um bolo podre, a anterior ministra das Finanças em 2015 (ano que está a ser objecto de promessas de sanções), Maria Luís Albuquerque, afirmou despudoradamente que se hoje fosse ministra das Finanças Portugal não sofreria sanções.

Mais recentemente, a Comissão fez saber por “fonte anónima” que vai dar mais três semanas ao Governo espanhol e ao Governo de António Costa para imporem um conjunto de medidas que os convençam da fiabilidade das respectivas contas públicas.

Todas estas reacções levantam um conjunto de dúvidas substantivas ao comum dos mortais portugueses:

Então a “derrapagem” do défice que está a ser alvo de críticas não diz respeito a 2015? Será que Maria Luís, a antiga ministra das Finanças, anda perdida no tempo e “não compreendeu” que o que está a ser avaliado é a sua má gestão em 2015 ? Não foi o ano em que o Governo de Portugal era constituído por partidos pertencentes ao PPE, grupo político europeu actualmente maioritário na União Europeia e que determinaram a acção do Governo de Passos Coelho? Mas afinal as eventuais sanções são para penalizar o Estado português em 2015 ou o actual Governo, que nada teve a ver com esse período?

Perguntas que nos conduzem a uma dolorosa compreensão do que é a actual União Europeia. Só aceitam Governos dos países soberanos, se eles forem da mesma cor da maioria da UE, ou se a sua dimensão política e económica for relevante, independentemente de terem “furado” os limites do défice, como foi o caso recente da França em 2015.

Goste-se ou não do actual Governo de Portugal, a sua atitude governativa tem sido a de cumprir tudo aquilo que prometeu na campanha eleitoral, situação que já não se via há muito tempo, nomeadamente na prática do anterior Governo de Passos Coelho. Será por isso que tem de ser penalizado?

Reconhece-se que o crescimento económico verificado no País, até agora, é inferior ao previsto no orçamento, consequência do marasmo em que se encontra esta Europa e os países de destino habitual das nossas exportações, mas o crescimento da colecta fiscal minimizou o efeito, permitindo um controlo rigoroso do Orçamento de Estado, que Bruxelas anteriormente não rejeitou. O que é que mudou?

Temos de ser colocados a “pão e água” para concluirmos que o melhor é sair do euro e deixar que esta “União Europeia” se transforme apenas num clube de ricos? Esta é a reforma que se impõe fazer para prevenir outros brexits, ou a ideia é provocá-los?

LUIS BARREIRA

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