CRISE MIGRATÓRIA A NÍVEL MUNDIAL

CRISE MIGRATÓRIA A NÍVEL MUNDIAL

O alerta de um bispo da Guiné Equatorial

Pelo menos oito mil 565 pessoas morreram nas rotas migratórias em todo o mundo, no ano de 2023, tornando-se este o mais mortífero já registado, segundo dados publicados no mês passado (6 de Março) pela Organização Internacional para as Migrações.

A Rota do Mediterrâneo continua a ser a mais perigosa, com pelo menos três mil 129 pessoas mortas ou desaparecidas. A maioria das mortes em África ocorre no Deserto do Saara e na rota marítima para as Ilhas Canárias. Convém, no entanto, ter em conta que os números oficiais estão subestimados, sendo o número real de mortos possivelmente muito mais elevado.

D. Miguel Ángel Nguema Bee, bispo da diocese de Ebibeyín, na Guiné Equatorial, durante uma visita à sede da Fundação Ajuda à Igreja que Sofre (AIS), sublinhou a necessidade de se encontrar uma forma mais eficaz de lidar com a pobreza global, que está na origem da esmagadora maioria da emigração ilegal.

Segundo D. Nguema Bee, o principal motor da migração é a pobreza, até porque, «devido a Governos corruptos e estruturas ineficientes», a ajuda enviada pelas organizações internacionais muito raramente chega aos mais necessitados. Em vez da dependência apenas dos Governos, este bispo africano sugere uma abordagem mais directa através de organizações locais como a Igreja, associações de mulheres ou jovens, e fundações. «Estas entidades poderiam prestar uma ajuda muito mais directa e eficiente, atribuindo, por exemplo, bolsas de estudo para jovens em situação de vulnerabilidade», disse o prelado.

D. Nguema Bee foi um dos três sacerdotes que a 20 de Maio de 2017 – etapa fundamental para a consolidação da Igreja Católica na Guiné Equatorial – foram ordenados bispos pelo cardeal D. Fernando Filoni, o então Prefeito da Congregação para a Evangelização dos Povos. Na concelebração eucarística, realizada na Catedral de Mongomo (D. Fernando Filoni seria coadjuvado por vários bispos de países vizinhos e pelo Núncio Apostólico, contando com a presença do Presidente da República e diversas outras autoridades), seriam inauguradas duas novas dioceses. Foram estas as palavras proferidas pelo Cardeal: «O novo rosto da Igreja na Guiné Equatorial é fruto de um trabalho missionário iniciado no passado por muitos evangelizadores corajosos que dedicaram a vida ao Evangelho e aos pobres», e visa «um desenvolvimento ulterior e adequado da Igreja neste país». D. Fernando Filoni, exortou então os três candidatos ao episcopado a serem «homens valentes e autênticos testemunhos de fé»; tendo convidado depois todos os presentes a amarem os seus bispos e sacerdotes, «não porque sejam perfeitos, mas porque o Senhor os chamou ao seu serviço». Dias depois, a 24 de Maio, por ocasião da Festa de Maria Auxiliadora, D. Nguema Bee, que integrou a Congregação dos Salesianos, tomaria posse da sua diocese, Ebibeyín.

Durante a conversa com o repórter da AIS, o Bispo insistiu numa outra questão que influi (e de que maneira!) na torrente migratória; ou seja, a insistente promoção de uma falsa imagem de tranquilidade e prosperidade no Ocidente. Facto que incentiva muitos africanos a migrar, quase sempre ilegalmente. «A publicidade enganosa e as promessas de dinheiro fácil feitas pela indústria desportiva são os principais responsáveis por promover esta ilusão», referiu, acrescentando: «O Ocidente apresenta uma falsa ideia de soluções fáceis, o que é uma miragem e contribui para uma falsa sensação de segurança. Os esquemas de dinheiro fácil que se apresentam contribuem directamente para esse problema».

Segundo ele, a verdade é que migrar é sempre uma decisão difícil e fazê-lo ilegalmente representa um risco enorme. Muitas pessoas nunca chegam ao seu destino e, para quem chega, podem levar de cinco a dez anos até conseguirem regularizar a sua situação. «É claro que também existem benefícios reais, como melhores oportunidades económicas e mais segurança, mas por vezes, quando viajo pela Europa, as pessoas pedem-me coisas como “por favor, traga-me um telefone”», lembrou. Até atingirem o seu “el-dorado” os migrantes não entendem as dificuldades que vão enfrentar. Não se apercebem de como a vida pode vir a ser difícil. «É essencial traçarmos um quadro mais realista das dificuldades que os migrantes enfrentam na sua procura de uma vida melhor», alertou ainda.

Voltando à questão da ajuda internacional ao desenvolvimento, D. Nguema Bee apontou a necessidade de estimular a actividade económica local, em vez de encorajar a dependência. «É crucial ajudarmos a criar estruturas que impulsionem a auto-suficiência e o desenvolvimento sustentável para que as pessoas possam avançar sem terem de depender constantemente de ajuda externa», afirmou.

O prelado da Guiné Equatorial também insistiu na importância de uma abordagem não paternalista, dizendo que a ajuda não deve estar ligada à ideologia e às novas formas de colonialismo. «A ajuda muitas vezes está condicionada ao reconhecimento de valores que não estão presentes na cultura local. A imposição de questões como o aborto, a diversidade de género ou a penetração de seitas religiosas são sinais deste novo colonialismo», explicou, destacando a importância de se respeitar e valorizar a cultura local durante a prestação da ajuda.

Joaquim Magalhães de Castro

LEGENDA: D. Miguel Ángel Nguema Bee

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