CAPELA DE SÃO ROQUE

CAPELA DE SÃO ROQUE

Culto de olhos na Ria

Os nossos últimos dias têm sido uma enorme correria, embora no período que Portugal atravessa tal não seja muito aconselhado. No entanto, apesar de toda a pandemia, sempre defendemos que a economia não pode parar, e para os pequenos investidores num dia sem trabalhar são muitas as perdas que dificilmente se conseguem recuperar. Ora, contra todas as marés e perante a incredulidade de muitos, apesar de todas as restrições e de uma economia estrangulada, decidimos, mais uma vez, voltar a apostar e abrimos o primeiro restaurante de comida tailandesa de Aveiro! Sempre acreditámos que é em tempos de crise que se deve investir. Se o negócio e os seus gestores conseguirem sobreviver neste cenário, pois quando tempos melhores vierem mais fácil será.

Teremos três dias de portas abertas quando este texto for lido e estaremos, certamente, a fazer contas à vida a um projecto que terá seis meses para provar se sobrevive neste ambiente atípico.

Escolhemos Aveiro porque nesta cidade ainda não havia um restaurante de comida tailandesa e também porque fica relativamente perto do local onde habitamos. E não menos importante, temos uma boa base de clientes nesta zona, pelo que nesta altura – em que não há visitantes – podemos concentrar mais as atenções no desenvolvimento do mercado local. Quando os turistas voltarem a aparecer, cá estaremos preparados para os receber.

Para a escolha do local, dois critérios foram preponderantes: centralidade e fácil acesso. Por isso, e como queríamos um estabelecimento totalmente equipado, acabámos por optar pelo Canal de São Roque, uma zona histórica da cidade em que um dos canais está do outro lado da estrada, onde temos a nossa esplanada.

O pitoresco da zona, que mesmo em época de pouca circulação conta com inúmeros residentes e visitantes durante o dia, é o bairro da Beira-Mar, um dos mais carismáticos da denominada “Veneza Portuguesa”. Aliás, disso vos falei no artigo anterior.

A pouco mais de cinquenta metros da nossa porta, numa rua transversal, encontra-se um templo católico, porventura o mais curioso de toda a área circundante. Trata-se de uma pequena capela forrada a azulejo, um item tão característico de Aveiro.

A Capela de São Roque ou de Nossa Senhora das Febres celebra os seus festejos na altura do fim da safra do sal. Toda a zona do antigo Canal de São Roque era onde o sal, das salinas que se encontram do outro lado do curso de água, era armazenado antes de ser embalado, transportado e vendido.

O pequeno templo, construído num dos extremos da rua que demarca o bairro piscatório pelo lado norte da cidade, ainda é conhecido pelo nome do seu titular, São Roque, santo que também dá o nome ao canal.

De acordo com a escassa bibliografia existente, o nome foi provavelmente instituído pelo padre Gabriel Gonçalves Varela, no terceiro quartel do Século XVI. A invocação a São Roque, padroeiro da construção naval, faz neste caso pleno sentido, já que por aqui habitariam mestres, carpinteiros, calafates, tanoeiros, entre outros, que trabalhavam junto ao Canal de São Roque e ao Canal Central. No que respeita à arquitectura, como seria de esperar num bairro de tão parcos recursos, a capela tem traço e construção modestos.

Já a sua reconstrução, em 1853, encontra-se bem documentada, tendo acontecido por força da estrutura original apresentar mau estado de conservação. Em 1936 foi alvo de novos melhoramentos, dos quais resultaram a sua actual fisionomia e aparência.

A data da construção original não é consensual mas tudo aponta para finais do Século XVI. Como referimos, é uma construção simples, destacando-se o altar principal com a imagem de Nossa Senhora das Febres. Esta imagem, como se pode ler no interior da capela, foi adquirida por subscrição pública com o objectivo de substituir a escultura quatrocentista da Virgem, que foi transferida para a igreja paroquial da Vera Cruz, a poucos metros dali.

No interior estão sepultados os primeiros proprietários da Capela de São Roque, bem como alguns moradores da Rua de São Roque.

Quanto ao Canal de São Roque, é um dos vários canais de água que atravessam a cidade de Aveiro, lugar dos antigos estaleiros, onde gerações de homens trabalharam na arte da construção naval e tiveram lugar inúmeras actividades ligadas ao lazer e diversão, com as peculiares regatas de bateiras e caçadeiras a remos ou a pás (de emprego salícola). Ali se travaram muitos despiques entre as tripulações, agrupadas por mesteres (marnotos, salineiras, pescadores, calafates, carpinteiros…), que deslizavam pelo canal sob o olhar da população que enchia as margens.

O actual percurso do canal, que passa mesmo em frente do Dee Thai Eatery, tem início na Ponte de São João, sendo transversal ao Canal das Pirâmides, e percorre um curso paralelo à A25, no sentido norte; passa pelo bairro da Beira-Mar, separando a malha populacional da Ria e das marinas de sal. Ao longo do canal existe o Cais das Falcoeiras, o Cais dos Mercanteis, o Cais dos Botirões e o Cais de São Roque – este último junto à nossa esplanada.

Mais uma vez, estão todos convidados para virem apreciar a beleza da Ria de Aveiro, passear pelas ruas e ruelas do bairro da Beira-Mar, e visitar muito do património religioso que por aqui existe.

João Santos Gomes

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