6º DOMINGO COMUM – Ano B – 11 de Fevereiro

6º DOMINGO COMUM – Ano B – 11 de Fevereiro

A “Grande Limpeza” espiritual que precisamos antes (e depois) do Ano Novo Chinês

Este fim-de-semana, os chineses de todo o mundo comemoram, com alegria, o Ano Novo Chinês. Tangerinas laranja-brilhante, pergaminhos da sorte de papel vermelho e muitas luzes decoram as nossas ruas, casas e até as igrejas. É hora de agradecer a Deus pelas bênçãos que recebemos e invocar a Sua protecção e orientação para o Ano Novo. É também uma ocasião para nos (re)conectarmos, com alegria, às nossas famílias e amigos, e para além da comida deliciosa e farta, compartilharmos um pouco das nossas vidas, experiências e esperanças.

O espírito das comemorações passa por “remover o velho e acolher o novo”. Por isso, poucos dias antes do Ano Novo (no 24.º dia do mês lunar, para ser mais preciso), os chineses têm a tradição de fazer a “Grande Limpeza” (大掃除·) – a limpeza fina, ao pormenor, das casas e locais de trabalho. É hora de deitar fora tudo aquilo que não presta, o que é lixo, principalmente muito do que se vai acumulando nos cantos escondidos dos armários e das gavetas; é hora de deitar fora aquelas coisas velhas, sem qualquer tipo de valor, ou que estão partidas e nem sequer compensa mandar arranjar. Se a nossa casa e escritório estiverem limpos e arrumados, será mais fácil acolher toda a energia positiva e as esperanças e novas oportunidades trazidas pelo Ano Novo. Mas não é tudo! A aparência ou aspecto exterior de uma pessoa também deve reflectir este espírito novo e positivo. Por esta razão, muitos chineses dão as boas-vindas ao Ano Novo com roupa nova e um novo corte de cabelo.

O Evangelho deste Domingo (Marcos 1, 40-45) começa com a estória de um leproso que necessita de uma “grande limpeza”. Embora a lepra seja hoje uma doença curável, quando diagnosticada nos estágios iniciais, foi no passado considerada uma terrível doença contagiosa. Para proteger a comunidade em geral, a Lei de Moisés determinava um conjunto muito rigoroso de regras para os leprosos. Assim que a doença era diagnosticada, as pessoas eram imediatamente declaradas impuras e posteriormente colocadas em quarentena fora das cidades e aldeias. Para evitar que os cidadãos saudáveis se aproximassem dos impuros, estes eram obrigados a rasgar as roupas e anunciar a sua presença aos altos gritos.

Após a pandemia de Covid-19, todos compreendemos a dor e a solidão causadas por este tipo de medidas – não iguais, obviamente, mas igualmente perturbadoras a nível psíquico. Para piorar a situação, a lepra (também ela uma doença pandémica, a determinado momento da História Universal) era considerada um castigo de Deus: os leprosos eram isolados não só das outras pessoas e dos seus entes queridos, mas também de Deus. Eram considerados (e autoconsideravam-se) impuros de mais para serem dignos de permanecer diante Dele. Na verdade, estas pobres pessoas sentiam-se (e assim se mostravam) miseráveis e sujas, por dentro e por fora.

«Certo leproso aproxima-se de Jesus e suplica-lhe de joelhos: “Se for da tua vontade, tens o poder de purificar-me!”» (versículo 40), gritou ajoelhado diante de Jesus. E Jesus fez o impensável: estendeu a mão e tocou-o. Além de se correr o risco de infecção, tocar uma pessoa impura significava tornar-se ritualmente impuro, o que era algo a ser evitado a todo custo. Mas Jesus, o Filho de Deus, veio revelar o rosto misericordioso do Pai aos que se sentiam mais distantes Dele. Ao tocar no leproso, Jesus fez uma declaração do amor radical de Deus a quem sofre e sente solidão. Nenhuma impureza é grande demais que a misericórdia de Deus não possa curar e limpar.

«Movido de grande compaixão, Jesus estendeu a mão e, tocando nele, exclamou: “Eu quero. Sê purificado!”. No mesmo instante toda a doença desapareceu da pele daquele homem, e ele foi purificado» (versículos 41-42). Dá para imaginar que depois de se ver curado o leproso tenha corrido para casa, a fim de reunir com a família e amigos, depois de ter tomado um bom banho e mudado a roupa suja e rasgada. Que alegre banquete devem ter tido! Este homem foi renovado em espírito, finalmente reuniu com a família e reconciliou-se com Deus: a cura de Jesus tornou a sua vida novamente completa. Rezemos para que possamos receber a mesma Graça, por meio da acção de graças, enquanto comemoramos o Ano Novo que se avizinha com a nossa família e amigos.

Segundo a tradição chinesa, no dia do Festival da Primavera não é permitido varrer o chão ou deitar fora o lixo. Se o leitor seguir esta tradição, terá fortuna nos próximos doze meses. Volvido este dia, as limpezas diárias podem ser retomadas.

Espiritualmente falando, o mesmo poderá acontecer, pois este ano a Quarta-feira de Cinzas calha no quinto dia do Ano Novo lunar. Embora possa causar alguns inconvenientes devido ao jejum, o início da Quaresma é um bom lembrete para o facto de que necessitamos, continuamente, da Graça de Deus para manter os nossos corações limpos e as nossas vidas íntegras. A disciplina da Quaresma (oração, jejum, obras de caridade, sacramento da reconciliação) ajudar-nos-á a sentir Jesus nas nossas vidas, evitando que a poeira do egoísmo, da superficialidade e da indiferença se instale muito rapidamente nos cantos ocultos de nossa existência. Só assim, a nossa vida não se tornará opaca e insalubre. Por outras palavas, a Quaresma ajudar-nos-á a não voltarmos ao “velho eu”, do qual nos havemos de livrar com a “Grande Limpeza” antes do Ano Novo.

Pe. Paolo Consonni, MCCJ

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