O Poder da Palavra de Deus

4º DOMINGO COMUM – Ano B – 28 de Janeiro

O Poder da Palavra de Deus

Com palavras de despedida, o meu pai reforçou-me a firmeza e a perseverança perante a missão que o Senhor me confiou. Fê-lo a 17 de Maio de 1998, três dias antes da sua morte. Neste mesmo dia, nós, o primeiro grupo dos Sacerdotes do Sagrado Coração de Jesus enviados às Filipinas, chegámos à capital, Manila. Corri a fazer uma chamada telefónica de longa distância para os meus pais. Então, o meu pai disse-me com entusiasmo: «– Filho, as suas mãos estão no arado, não olhe para trás», citando, assim, as palavras de Jesus a um discípulo que se queria despedir dos pais (Lc., 9, 62). Estas últimas palavras do meu pai reflectem também a sua vida de compromisso e fidelidade a nós, à sua família, ao seu trabalho, ao seu ambiente, à paróquia e aos seus amigos. Ajudaram-me a continuar a crescer na minha vocação missionária e a reafirmá-la nos momentos de tentação e crise.

Pergunto-me: Como é possível que algumas palavras ditas do outro lado do planeta, há mais de trinta anos, tenham penetrado tão profundamente em mim e ainda tenham tanto poder? Acredito que seja porque as palavras que ouvi do meu pai são as palavras de Jesus, o «Autor e Consumador da nossa fé» (Hb., 12, 2). Além disso, são palavras que foram acompanhadas pelo amor de alguém que, sentindo a sua breve partida deste mundo, a mim as quis entregar como testamento.

Sim, é o poder criador e recriador da Palavra de Deus que, como o arado, fere a terra para que se torne fecunda. É como aquela espada de dois gumes que penetra até ao fundo do nosso ser e nos revela a nossa verdadeira identidade e vocação (Hb., 4, 12), no meu caso, a de semeador do Evangelho nestas terras distantes da Ásia.

Foi essa mesma Palavra que fez com que aqueles pescadores da Galileia deixassem os barcos na praia para segui-Lo incondicionalmente, como meditámos no passado Domingo (Mc., 1, 18).

Já no Domingo que se aproxima (28 de Janeiro), Marcos revela o início do ministério de Jesus, que logo após chamar os seus discípulos entra com eles na sinagoga de Cafarnaum num sábado. A primeira acção do ministério público de Jesus é ensinar o povo e libertar o homem da escravidão do diabo. Esta dupla acção surpreende as pessoas em dois momentos: primeiro, maravilham-se com a autoridade do seu ensinamento (Mc., 1, 23), que não era como o dos escribas. Este texto mostra o cumprimento da profecia que Deus faz a Moisés na Primeira Leitura: «Suscitar-lhes-ei um profeta como tu (…). Colocarei as minhas palavras na sua boca (…)» (Dt., 18, 18). Não são as palavras de Moisés, mas as palavras de Deus, que despertam a admiração do povo. A autoridade do autor da vida fala e se conecta com a essência mais íntima do nosso ser. Uma palavra que nos alimenta e recria: “O homem não vive só de pão, mas de toda palavra que sai da boca de Deus” (cf. Dt., 8, 3; Mt., 4, 3-4).

Num segundo momento, Jesus confronta o poder que nos escraviza e nos leva ao isolamento e à morte: o poder de Satanás, o inimigo de Deus. É o poder da mentira e do engano, a velha serpente que o filho de Deus veio derrotar (Gén., 3, 15). A primeira parte do Evangelho de Marcos apresenta Jesus como o Messias, o Ungido de Deus. E esta é a primeira prova da sua vocação messiânica: o seu ensinamento – este é o significado da lei ou da Torá, o ensinamento de Deus – e o seu poder contra o maligno.

Na semana passada, numa entrevista ao Papa Francisco, um jornalista perguntou-lhe: «– Por que há tantas guerras neste Século XXI: na Ucrânia, no Médio Oriente, no Iémen, em África…?». O Papa respondeu de forma espontânea: «– Tudo começa no coração do homem». As estruturas ajudam, mas tudo depende de corações puros e livres. Portanto, a luta contra o mal deve ser travada primeiro dentro de nós, nos nossos corações. Aí está a origem do orgulho e das guerras. É aí que o engano do maligno causa estragos. Só o poder da Palavra de Deus pôs fim à fúria das ondas do mar (Jó., 38, 8-11) e derrotou o príncipe das trevas (cf. Jo., 1, 5). Jesus tem o poder de silenciar as vozes ressentidas, invejosas, ciumentas, orgulhosas e egoístas que existem em nós: «Fique quieto [cale a boca] e saia dele!» (Mc., 1, 25). Então, a multidão reage pela segunda vez: «O que é isto? Um novo ensinamento!» (Mc., 1, 27).

O ensinamento de Jesus tem a autoridade da Verdade, é coerente com a sua acção, com a sua vida e com a sua identidade como Palavra de Deus. A sua palavra e a sua vida mostram-nos o amor incondicional de Deus, porque como diz o diabo: embora sem fé, Ele é “o Santo de Deus”.

Estas leituras desafiam-nos a deixar-nos recriar e libertar pela Palavra de Deus para que, como os primeiros discípulos de Jesus, sejamos transformados em «Pescadores de Homens» (Mc., 1, 17). É a Sua Palavra que nos revela a nossa verdadeira identidade e vocação. Depois de ouvi-lo, podemos dizer como Pedro: «Senhor, para quem iremos? Vós tendes as palavras de vida eterna. E nós temos crido e reconhecido que Tu és o Cristo, o Filho do Deus Vivo» (Jo., 6, 68-69).

Pe. Eduardo Emilio Agüero, SCJ

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