19º DOMINGO COMUM – Ano C – 7 de Agosto

19º DOMINGO COMUM – Ano C – 7 de Agosto

Olhe para cima e olhe para dentro: a necessidade da consciência vigilante

Durante as últimas semanas ao ficar em casa por causa das restrições do Covid-19, encontrei tempo para assistir a um filme, “Don’t Look Up” (2021). A longa metragem narra a história de dois astrónomos que descobrem um enorme cometa prestes a colidir com a Terra no espaço de seis meses, com potencial para destruir a civilização humana. Durante este período de tempo tentam alertar o Governo e o público em geral para que se tomem as precauções necessárias a fim de evitar uma catástrofe, mas em vão… No filme, os dados científicos desvanecem-se em propagandas superficiais usadas com fins políticos. “Não Olhe para Cima”, o título do filme, é o “slogan” do partido político no poder para justificar a sua inacção. Infelizmente, o negativismo não impede que o cometa continue o seu curso e finalmente embata na Terra. O não “olhar para cima” impediu as pessoas de “olhar para dentro” das suas consciências e de assim fazerem as escolhas certas.

O filme sublinha o endurecimento irracional da atitude de negação diante das responsabilidades. Muitas vezes, colectivamente, falhamos ao não percebermos que as nossas escolhas têm consequências, tanto na esfera social como no mundo natural. No entanto, um dia teremos que enfrentá-las. Nos Evangelhos, o dia final do acerto de contas é frequentemente descrito como a “chegada do mestre”.

No Evangelho do último Domingo, Jesus falou sobre a necessidade de nos tornarmos “ricos para com Deus” e não nos deixarmos absorver em demasia com a posse dos nossos bens materiais, como faz o “rico insensato”. O convite foi para sermos sábios sobre como investimos o nosso tempo, as nossas energias e os nossos recursos.

No Evangelho deste Domingo (Lc., 12, 32-48), Jesus continua na mesma linha, mas com uma afirmação surpreendente sobre o próprio investimento de Deus: «Nada temais, pequeno rebanho, pois de bom grado o Pai vos concedeu o seu Reino» (Lc., 12, 32). Ao enviar Jesus, Deus generosamente compartilha connosco os tesoureiros da Sua misericórdia e do Seu amor, como numa “joint venture”. É um investimento arriscado, cujo resultado dependerá da capacidade humana em administrar os dons de Deus com amor, justiça e misericórdia. Naturalmente, chegará o tempo em que cada um de nós terá que prestar contas de como administrámos os recursos que Deus nos confiou.

Por meio de parábolas, Jesus descreve alguns resultados possíveis desse acerto de contas. As personagens principais são o mestre e os servos encarregados de supervisionar os bens do mestre durante a sua ausência. Uma parábola que tem um final violento. Enquanto o mestre está ausente, o supervisor começa a espancar os outros servos e exagerar na comida e na bebida. Jesus conclui: «Entretanto, o senhor daquele servo voltará no dia em que ele menos espera e num momento totalmente imprevisível e o punirá com todo o rigor e lhe condenará ao lugar dos infiéis» (Lc., 12, 46). A lição da parábola é clara: seremos responsabilizados pela maneira como passarmos as nossas vidas, usarmos os nossos recursos e tratarmos as outras pessoas, porque não somos os donos absolutos das nossas vidas e tudo o que temos é presente de Deus.

A parábola descreve vivamente o castigo do servo não para sublinhar a vingança violenta de Deus, mas para nos lembrar que as nossas escolhas erradas têm consequências dolorosas e inevitáveis, tanto para as nossas vidas como para as vidas dos que estão ao nosso redor. Aqueles que recusam imitar o amor gratuito e imerecido de Deus optam por alimentar o ciclo de violência no ambiente em que vivem e na sociedade em geral e, por escolha própria, tornam-se vítimas dessa violência.

Pelo contrário, Jesus afirma: «Felizes aqueles servos a quem o Senhor, quando vier, os encontre vigilantes; com toda a certeza vos asseguro que Ele se vestirá para os servir, fará que se reclinem ao redor da mesa, e pessoalmente irá ao encontro deles para servi-los» (Lc., 12, 37). O oposto da negação é a consciência. Somente a consciência pode ajudar-nos, por um lado, a fazer escolhas certas para nós mesmos e para os outros e, por outro lado, a perceber a verdadeira natureza de Deus. Ele é o Mestre que só deseja servir-nos. Ele é o dono que só nos deseja tornar participantes da Sua Glória (2 Pe., 1, 3-4).

No filme que mencionei ao início é impressionante ver como a maioria das pessoas, especialmente aquelas com maiores responsabilidades, não conseguem fazer um exame de consciência honesto e enfrentam a morte por falta de consciência. É por isso que a Igreja continua a repetir que é importante “que cada um esteja suficientemente presente a si mesmo para ouvir e seguir a voz da sua consciência. Esta exigência deinterioridadeé tanto mais necessária quanto a vida nos leva muitas vezes a subtrair-nos a qualquer reflexão, exame ou introspecção: ‘Regressa à tua consciência, interroga-a […] Voltai, irmãos, ao vosso interior, e, em tudo quanto fazeis, olhai para a Testemunha que é Deus’ (Santo Agostinho, In epistulam Iohannis ad Parthos tractatus)” (CIC nº 1779).

Por outras palavras: muitas vezes precisamos de “olhar para cima”, para Ele, e de “olhar para dentro” da nossa consciência a fim de alcançarmos a consciência vigilante; e fazer boas escolhas para nós e para os outros, para finalmente desfrutarmos das bênçãos que Deus nos prometeu.

Pe. Paolo Consonni, MCCJ

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