“Missão País”
O número de Junho da revista da Associação de Médicos Católicos portugueses publicou um artigo impossível de escrever há uns anos. O próprio autor, Miguel Cabral, o reconhece: “Se há trinta anos, quando eu era finalista do curso de medicina e assistia às aulas ou fazia as práticas no hospital de Santa Maria (…) não acreditaria”.
Entretanto, tirou a especialidade de oncologia, trabalhou num hospital, fez o doutoramento em Teologia e foi ordenado padre. Não é o percurso mais frequente, mas há outros padres também formados em Medicina, ou Engenharia, ou Direito, ou Economia… O que é verdadeiramente especial, a experiência mais extraordinária, foi a da Missão País. Conta ele: “Se me tivessem dito há trinta anos que sessenta estudantes de medicina (com lista de espera!) abdicavam das férias, durante uma semana por ano, para participar na Missão País, a viver uma experiência marcante da fé católica e a anunciar o evangelho às populações, isso parecer-me-ia ainda mais improvável”.
Desde há vários anos, milhares de jovens de muitas Universidades participam nesta actividade. Este ano foram quatro mil e 200 estudantes, de sessenta faculdades, distribuídos por 73 localidades de Portugal. O padre Miguel Cabral, que acompanha há vários anos alguns grupos de estudantes de Medicina, reconhece: “Seria impensável há umas décadas atrás. No meu curso, desde logo, impossível. Não apenas porque éramos menos, mas também porque menos comprometidos com a Igreja”.
É um milagre, afirma. “Missa diária, Confissão (quase todos aproveitam para se confessar e ter uma conversa mais profunda com o sacerdote), uma tarde de retiro, oração diária de manhã e à noite (não cinco minutos, mas pelo menos meia hora), terço, noite de adoração do Santíssimo, catequese, às vezes via-sacra ou peregrinação de algumas horas a Fátima ou outro santuário, consoante o local da Missão, etc. Além da animação nos lares de idosos, das visitas às casas no ‘porta-a-porta’ (…), do teatro, do convívio com as famílias e comunidades locais e de um longuíssimo etc.”.
E continua: “E não se pense que estão confortavelmente instalados, nada disso. Rapazes de um lado e raparigas noutro lado, dormem no chão, em sacos de camas, apinhados em salas improvisadas, madrugam para poder tomar banho, deitam-se tarde porque o tempo não chega para tudo e as conversas e partilhas entre eles não têm fim”.
Mais: “Os milagres são muitos, em todas as Missões (…): conversões, confissões depois de anos afastados de Deus, choros e risos, regresso à prática cristã, baptismos, crismas, namoros sérios, alguns casamentos (…), algumas vocações para o sacerdócio ou para o celibato apostólico, etc.”.
Confirmo que o mesmo acontece nos cursos de Engenharia. E parece-me que este encontro com Deus é tanto mais forte quanto mais exigente é o curso, porque um ambiente universitário sério é uma óptima oportunidade para se aproximar de Deus. O que o padre Miguel Cabral escreveu a pensar nos médicos aplica-se a toda a Universidade: “Não podemos desperdiçar estas gerações, temos de as continuar a reunir e formar, para criar uma geração de médicos competentes e autenticamente católicos, fiéis aos ensinamentos do magistério da Igreja nos constantes desafios éticos que se apresentam”.
Esta mobilização realmente surpreendente nasceu há 22 anos com três estudantes inspirados no movimento apostólico de Schoenstatt. Até na desproporção dos meios, parece uma provocação de Deus: “Então? Pensavam que Eu estava a dormir? Que já fazia milagres?”.
Os estudantes da Missão País levam por todo o lado reproduções da imagem de Nossa Senhora do Santuário de Schoenstatt, abençoadas e enviadas deste pequenino santuário, e uma cruz inspirada na Cruz da Unidade de Schoenstatt. Uma cruz simplicíssima e uma imagem que nem um mau ladrão se daria ao trabalho de roubar. Contudo, o milagre acontece realmente. E repete-se em maior escala a cada ano que passa.
José Maria C.S. André
Professor do Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa
LEGENDA: A pequena cruz e a imagem de Nossa Senhora que os estudantes levam na Missão País.