O cuidador de Macau
O “santo silencioso” comemora-se a 19 de Março, o Dia do Pai na tradição da Igreja Católica, embora se estenda já para além desta. Em Macau, São José tem presença especial no seio da comunidade, em particular entre a população católica. Para além da igreja de São José (erigida a partir de 1728, pela Companhia de Jesus) e do Seminário homónimo, junto à mesma, o Santo Silencioso é o patrono da Universidade que lhe leva também o nome (Universidade de São José, mais conhecida por “USJ”), bem como da rede do Colégio Diocesano de São José, constituída por seis estabelecimentos de ensino, que abrange desde o Pré-escolar até ao Secundário, sendo uma das instituições educativas de maior prestígio no território.
“Ser pai é apresentar ao filho a experiência da vida, a realidade. Não o detenham, não o aprisionem, mas tornem-no capaz de escolhas, de liberdade de partida” (Papa Francisco in “Patris Corde”). Poderia ser esta a forma como São José cuida de Macau, na dimensão educativa do pai, que prepara os filhos e que os ensina a caminhar. Da mais pura e tenra infância, até à graduação universitária, Macau é como um filho do pai protector que é São José, inspirador na educação e formação, na preparação para a vida, além de protector e patrono da Igreja de Cristo.
José é um nome de origem hebraica, significa “Deus cumula de bens”. Todos os que se colocam sob a protecção de José conhecerão as bem-aventuranças dessa filiação, da confiança no carpinteiro que silenciosamente aceita a sua missão e guia, por desertos e por perigos, pelas veredas da vida em demanda dos trilhos de esperança e de segurança.
São José é lembrado na Igreja Católica pelo seu SIM à paternidade do Menino, bem como à esponsalidade da Virgem Maria, de forma corajosa e determinada. Mas também é recordado como santo operário, patrono dos trabalhadores, a 1 de Maio. Como é recordado noutros dias, porque noutros ritos cristãos, mas sempre como Pai e Esposo: no Rito Bizantino no Domingo a seguir ao Natal; a 3 de Janeiro no Rito Moçárabe (Hispânico); ou a 20 de Julho no Rito Copta.
Esposo da Virgem Maria, modelo de pai e esposo, protector da Sagrada Família, São José foi escolhido por Deus para ser o patrono de toda a Igreja. Viveu no século I a.C., não se conhecendo a sua data de morte, que terá sido antes da Paixão de Cristo. A maior parte dos estudiosos refere que terá morrido entre os cinquenta e os sessenta anos de idade, antes do começo da vida pública de Jesus. Todavia, a história de José o Carpinteiro (compilação bizantina de textos sobre o Santo, efectuada no Egipto nos Séculos VI e VII, em Grego) refere que terá morrido no dia 20 de Julho de 18 ou 19 d.C., com 111 anos de idade. Epifânio, outro biógrafo, refere que morreu com noventa anos. Terá nascido em Belém de Judá, como Jesus, e morrido em Nazaré da Galileia, onde viveu boa parte da vida com a Sagrada Família e exercido a profissão de carpinteiro, artesão, ou simplesmente “operário”.
A Escritura traça a figura de José com absoluta sobriedade, mas o personagem é absolutamente real, nada tendo sido inventado ou sequer fazendo parte do imaginário. Era um artesão conhecido, apontado por todos, socialmente, como o pai de Jesus. Os evangelhos apócrifos surgem como fonte para enriquecer as escassas notas das Escrituras. Em particular, o Proto-Evangelho de Tiago, que narra extensivamente o casamento de José com Maria e que impõe para os séculos seguintes a sua imagem como um homem idoso, viúvo e com outros filhos, de casamento anterior. Na tradição patrística o seu papel é já secundário, mas a sua castidade é reafirmada e, pela sua função de cuidador e educador, de quem alimenta, torna-se numa espécie de “candidato” a protector de toda a Igreja. Surgem novos apócrifos (Evangelho da Infância, História de José Carpinteiro, Evangelho da Natividade) que enriquecem as lendas, como a do casamento ocorrido aos 89 anos (morrendo mais tarde, aos 110), a presença de filhos do primeiro casamento, ou o acompanhamento dos anjos da alma de José rumo ao céu.
São José, acima de tudo, colocou as acções antes das palavras: agiu mais do que falou. Sofreu e chorou como qualquer mortal, mas o Verbo Divino não podia vir ao mundo “órfão” e José foi o exemplo abnegado e presente de um verdadeiro pai. José não se perdeu em declarações pomposas, mas cumpriu zelosamente a vontade de Deus. Obediente e corajoso, foi para onde Deus o enviara, cumprindo com amor a tarefa que Deus lhe havia pedido. Como Pai e como Esposo, como Protector da Igreja.
Vítor Teixeira
Universidade Fernando Pessoa