DIA DE SÃO MARTINHO

DIA DE SÃO MARTINHO É MUITO MAIS DO QUE APENAS COMER CASTANHAS E BEBER ÁGUA-PÉ

O Santo de Tours que de si ofereceu a Deus

Dia 11 de Novembro é dia de São Martinho de Tours. Além das castanhas, manda o povo em Portugal que no “São Martinho, vai à adega e prova o vinho”. Mas mais do que adágios populares e festividades profanas, São Martinho é uma das figuras mais importantes do Cristianismo, estando na origem de um conjunto de acções de partilha, de ajuda aos pobres e de diluimento das diferenças sociais que a vida mundana impunha. O seu exemplo será dos mais mimetizados, muitas vezes recontado nas lendas de outros santos, principalmente na Idade Média.

Martinho de Tours nasceu em Sabaria (actual Szombathely), na Panónia (aproximadamente a actual Hungria), em 316, indo morrer na Gália (França), uns dizem que em Condate (actual Rennes), outros em Candes(-Saint-Martin), a 8 de Novembro de 397. Começou por ser militar, depois tornou-se monge e, mais tarde, bispo de Tours, sendo considerado santo pela Igreja Católica. No Rito Bizantino, a sua Festa é a 12 de Novembro. Viveu no Século IV, uma época de importantes transformações no mundo, numa fase de declínio do Império Romano e de ascensão do Cristianismo. Martinho de Tours foi um dos agentes dessas transformações religiosas, sendo um dos grandes exemplos de conversão à religião cristã e, depois, tornando-se num dos maiores impulsionadores da cristianização da Europa, cujo processo avançou significativamente no Século IV. Se atentarmos, nasceu três anos após o Edito de Milão, promulgado pelo imperador Constantino (imperador entre 306 e 337), no ano de 313, que concedera liberdade de culto aos cristãos.

Martinho nasceu numa família romana, filho de um oficial da legião. Ter-se-á convertido com dezoito anos de idade, em 334, quando se assinala o seu baptismo cristão. Já era militar, pois entrou para o exército aos quinze anos. Foi educado em Pavia. Em 337 sucede algo que se tornará marcante na sua vida e emblemático na tradição cristã. Estava Martinho em Amiens, quando encontrou perto das portas da muralha da cidade um pobre mendigo a tiritar de frio. O jovem legionário, na sua montada, cortou em duas partes o seu manto, ou capa, e deu uma parte ao pobre mendigo. Narra a lenda que na mesma noite Martinho terá sonhado com Jesus, que se agasalhava na metade da capa que dera ao mendigo e dizia a um coro de anjos que fora o jovem catecúmeno (Martinho) que lhe dera a capa. A arte nunca mais esqueceu este episódio, que é referencial na iconografia do Santo de Tours.

Em 356, Martinho deixou a legião, quando estava aquartelado em Worms (actual Alemanha). A fé cristã falava muito mais alto na sua vida, o que o fez começar a seguir Hilário de Poitiers (315-367, bispo de Poitiers, Doutor da Igreja e teólogo insigne), um grande defensor do dogma trinitário. Era famoso como o “martelo dos arianos”, pela sua luta contra as heresias, em particular o Arianismo. Entre 356 e 361, Hilário foi desterrado para a Frígia (Noroeste da Anatólia) pelo imperador Constâncio II (imperador entre 337 e 361), que estava alinhado com o Arianismo. Martinho empreendeu então uma viagem que o levou à sua cidade natal, onde conseguiu converter a sua mãe, mas não o seu pai, ao Cristianismo.

Rumou depois a Milão, onde entrou em contacto com um grupo de homens que levavam uma vida de retiro, oração e ascetismo. Pouco depois, foi expulso pelo bispo Auxêncio, seguidor das doutrinas de Arrio, mudando-se para a ilha Gallinara, na costa de Génova, onde levou uma vida ascética com um companheiro. Em 361, sabendo do regresso de Hilário à Gália, Martinho vai ao seu encontro em Poitiers. Pouco depois recebe as ordens sacras de diácono e a seguir as de presbítero. Determinado a levar uma vida religiosa, instalou-se na localidade vizinha de Ligugé, onde construiu o primeiro mosteiro conhecido na Europa, permanecendo no cenóbio durante dez anos. O Mosteiro de São Martinho de Ligugé ainda hoje existe, nele habitando uma comunidade monástica beneditina.

Em 371 foi nomeado bispo de Tours. A sua vida pastoral caracterizou-se pela evangelização e pela luta contra os costumes pagãos, além de apreço ao monaquismo. Perseguiu as teorias do gnosticismo e maniqueísmo de Prisciliano (340-385). Este foi acusado de bruxaria e encarcerado. Apesar de ter criticado as suas teses, Martinho liderou o coro de protestos (onde pontificava também o grande teólogo oriental São João Crisóstomo) contra a pena de morte que o imperador Magno Clemente Máximo (imperador entre 383 e 385) definira para Prisciliano. O bispo lusitano Idácio de Mérida foi a favor da execução. Esta acabou por suceder. Martinho, aflito e indignado com esse facto, rompeu relações com Idácio. Mais tarde, reconciliaram-se. Martinho, na sua senda monástica, fundou em 372 a abadia de Marmoutier, próximo de Tours, um alfobre de santidade e de bispos também. Durante 25 anos Martinho viajou pelas regiões de Touraine, Chartres, Paris, Autun, Sens e Vienne. Em 397 Martinho morreu em Candes, onde se fez uma basílica no seu túmulo. Esta foi destruída pelos Normandos no Século V e pelos huguenotes (protestantes franceses) em 1526. A actual basílica de São Martinho de Tours foi inaugurada em 1925. É um dos construtores da Cristandade medieval europeia.

Vítor Teixeira 

Universidade Fernando Pessoa

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