Igreja na Ásia discutiu os caminhos da sinodalidade em Banguecoque
A diocese de Macau esteve representada pelo padre Cyril Law na Assembleia Continental Asiática sobre a Sinodalidade, que decorreu em Banguecoque no passado fim-de-semana. A iniciativa juntou, na Tailândia, delegados de dezassete conferências episcopais. Entre os presentes estiveram o cardeal D. Charles Maung Bo, de Rangum (Myanmar), e o cardeal D. Oswald Gracias, de Bombaím (Índia).
O padre Cyril Law, chanceler da diocese de Macau, representou a Igreja Católica no território durante a Assembleia Continental Asiática sobre a Sinodalidade, certame que decorreu no último fim-de-semana em Banguecoque. O encontro reuniu na capital tailandesa seis cardeais, cinco arcebispos, dezoito bispos, 28 padres, quatro religiosas e dezanove leigos em representação de dezassete conferências episcopais. A iniciativa serviu para que os delegados, provenientes de diferentes quadrantes da Ásia, discutissem os conteúdos da versão final do documento que sintetiza as expectativas que os católicos do continente asiático nutrem em relação ao futuro da Igreja Católica.
O ofício, que vai agora ser submetido à Cúria Romana, serve – a par de outros contributos submetidos pela Igreja no mundo inteiro – como ponto de partida para o concílio que se irá realizar no Vaticano, em Outubro deste ano, e que encerra um longo e abrangente processo de auscultação iniciado na recta final de 2021.
As diferentes assembleias continentais sobre a sinodalidade, explicou o padre Daniel Ribeiro, SCJ, correspondem a uma das últimas etapas de uma longa caminhada que tem como objectivo final definir caminhos comuns. «Este Sínodo sobre a sinodalidade materializa-se em diferentes etapas. Numa primeira fase, tivemos a etapa paroquial, que é a etapa de base e de menor escala. A partir daí, o processo evoluiu para a etapa diocesana, com a análise dos depoimentos e dos conteúdos que foram obtidos a nível paroquial. Segue-se uma outra etapa, na qual estes dados são reunidos, para que se possa fazer uma síntese. É isso que é feito a nível continental. Foi neste encontro que o padre Cyril participou. Esta síntese é depois comunicada ao Vaticano, que é onde serão tomadas as decisões finais», disse o vigário paroquial da Sé Catedral para a comunidade de língua portuguesa, em declarações a’O CLARIM.
Em Macau, no rescaldo do processo de auscultação sinodal organizado pela Diocese, uma ilação houve que se evidenciou: a percepção de que uma Igreja que se predispõe a ouvir é uma Igreja mais consciente das suas limitações e mais aberta ao diálogo.
Dos dez temas inicialmente propostas para discussão pela Cúria Diocesana, o tema “Ouvir” foi o tópico eleito pela maioria dos grupos de acção envolvidos no processo sinodal diocesano e a comunidade católica de língua portuguesa não foi excepção.
«Ouvir», confidenciou o padre Cyril Law a’O CLARIM, foi também uma das palavras de ordem da Assembleia Continental Asiática. Em Banguecoque, o sacerdote e os restantes delegados debateram o formato final de um texto que gira em torno de cinco grandes áreas temáticas: as ressonâncias asiáticas do processo sinodal, as tensões que a Igreja enfrenta no continente asiático, a realidade asiática e a forma como diverge do panorama da Igreja noutras regiões, as lacunas identificadas nas respostas recolhidas junto das comunidades católicas asiáticas, e a resposta a dar às inquietações e expectativas identificadas.
De acordo com o portal Vatican News, o último dos três dias de trabalho ficou marcado por uma animada discussão sobre as correcções a fazer no esboço final do documento que será enviado para Roma. Depois da equipa responsável pela redacção do texto operar as mudanças propostas durante a Assembleia, o texto vai ser revisto pelos membros da Federação das Conferências Episcopais da Ásia e enviado para o Vaticano.
O resultado do processo é um documento que, juntamente com documentos semelhantes de outros continentes, dará forma ao Instrumentum Laboris– o texto oficial da Cúria Romana que é usado como referência na Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos. Isto no que respeita à primeira fase da celebração do concílio sobre a sinodalidade, já na Santa Sé.
CUMPRIR O CONCÍLIO VATICANO II –Tida como a maior consulta universal alguma vez promovida pela Igreja, a viagem sinodal pela qual a comunidade católica global embarcou desde finais de 2021 foi comparada por muitos ao processo de abertura desencadeado pelo Vaticano II, mas para o padre Franz Gassner, SVD, director da Faculdade de Estudos Religiosos da Universidade de São José (USJ), o processo de deliberação sinodal em curso não pode ser dissociado do concílio que mudou a face da Igreja no início da década de 1960. «Não me parece que uma “nova Igreja” possa emergir no rescaldo deste processo. Um sínodo é o método a que a Igreja recorre desde os primeiros tempos para fazer face a questões relevantes. Serve para que possa encontrar soluções conjuntas, em particular com a ajuda e a orientação do Espírito Santo», disse o missionário da Sociedade do Verbo Divino, também a’O CLARIM. «É necessário mais tempo – talvez séculos até – para compreender, digerir e implementar o Vaticano II. Estamos apenas agora a começar a compreender e a viver de acordo com aquilo que o Espírito Santo decidiu em conjunto com todos quantos deram o seu contributo ao Vaticano II. Alguns dos problemas que a Igreja enfrenta hoje surgiram exactamente por causa da incapacidade de estudar profundamente e de compreender a mensagem que emergiu do Concílio Vaticano II. O processo sinodal actualmente em curso é um passe mais que a Igreja Católica dá no aprofundamento do legado do Vaticano II», defendeu o padre Gassner.
Os delegados das dezassete conferências episcopais que se deslocaram a Banguecoque – entre eles, os cardeais de Rangum, D. Charles Maung Bo, e de Bombaím, D. Oswald Gracias – também reflectiram sobre a forma de dar continuidade ao percurso sinodal no contexto específico do continente asiático. Duas grandes questões estiveram sobre a mesa, com a Assembleia a indagar sobre as estruturas eclesiais que precisam ser mudadas ou criadas para melhorar a sinodalidade da Igreja na Ásia, um processo que os delegados gostariam de ver avançar a nível local entre as duas sessões pelas quais se vai distribuir o Sínodo: a de abertura, prevista para Outubro de 2023, e a de encerramento, agendada para Outubro de 2024.
Marco Carvalho