ADRIANO AGOSTINHO

ADRIANO AGOSTINHO

«Deus chama-nos porque Ele sabe o que é melhor para nós»

Inerente à diaconia, sustenta o futuro sacerdote, está uma atitude de vida que tem por base o serviço ao outro e à Igreja. Depois da cerimónia de ordenação ao diaconado, Adriano Agostinho regressa a Roma, para onde foi enviado pela diocese de Macau com o propósito de estudar Direito Canónico.

O CLARIM – Prepara-se para dar mais um passo na longa caminhada para o Sacerdócio. Vai ser ordenado diácono antes ainda do final do ano. O que é, afinal, ser diácono?

ADRIANO AGOSTINHO – Ser diácono é ser um ministro sacro através da recepção do Sacramento da Ordem (diaconal). Este sacramento imprime carácter sacramental indelével, ou seja, provoca para sempre uma mudança ao nível ontológico, permitindo que um diácono, pela graça de Deus, seja capaz de exercer um serviço especial – a diaconia – na Igreja, nomeadamente na liturgia, na proclamação da Palavra de Deus e na caridade. Mais do que exercer funções e poder fazer certas coisas, como proclamar o Evangelho e pregar homilias nas missas, abençoar casamentos, conceder bênçãos e baptizar, o diaconado implica uma configuração especial a Cristo, que «não veio para ser servido, mas para servir» [Mateus 20, 28]. Há toda uma raiz sacramental que não se pode ignorar, que nunca pode ser apagada e que distingue essencialmente um diácono de um ministro leigo nomeado ou instituído. Mais do que funções, o diaconado traduz-se numa atitude de vida baseada no serviço, que deve continuar mesmo quando um diácono é ordenado padre ou sacerdote. De facto, pela própria natureza do Sacramento, o poder sacro deve ser sempre exercido humilde e responsavelmente como um serviço desinteressado aos outros. No meu caso, como vou ser ordenado diácono com vista à ordenação sacerdotal num futuro próximo, essa atitude de disponibilidade total ao serviço do Reino de Deus inclui o celibato clerical, que na missa da minha ordenação diaconal eu prometo já viver.

CL – Como está a viver estes dias que antecedem a sua ordenação diaconal? Como se está a preparar para esse momento?

A.A. – A preparação mais importante consiste na oração, complementada com leitura e direcção espirituais. Vários assuntos foram meditados, nomeadamente a grandeza e sacralidade do ministério ordenado, sobretudo em profundo contraste com os meus defeitos e limitações. Eu peço a Deus que me ajude, que me faça crescer em humildade, para que eu nunca esqueça de que o Sacramento da Ordem que vou receber é pura graça, imerecida da minha parte. Por isso, é sempre um forte motivo para eu estar profundamente agradecido e contente por ter sido chamado por Deus, mas também com um certo temor perante a grandeza desta vocação e a enorme responsabilidade que requer a minha cooperação com a graça de Deus. Somente com a graça de Deus e confiando n’Ele é que a conseguirei cumprir. Na verdade, Deus é o agente principal na Igreja. Somos apenas os seus instrumentos. E, diga-se de passagem, bastante imperfeitos! É Deus que deve ser louvado e adorado, e não eu. Ou seja, «Ele é que deve crescer, e eu diminuir» [João 3, 30]. Também faz parte da preparação uma formação teórico-prática que incide sobre a forma de celebrar os actos sacramentais e litúrgicos que um diácono pode exercer. Antes de ser ordenado, também se faz um retiro espiritual, para uma melhor preparação, purificação e sedimentação da minha vontade em querer livremente receber este sacramento.

CL – Formou-se em Medicina e só depois entrou no Seminário. Como imaginava que seria a experiência de preparação para o Sacerdócio? Agora, que fica mais perto de assumir esse desígnio, que balanço faz dessa caminhada de preparação. Correu como a idealizou?

A.A. – A vida de Seminário foi uma longa caminhada de formação e discernimento, não sem dificuldades e obstáculos que foram superados, pela graça providente de Deus e a ajuda dos outros. Se calhar essa parte aí não estava muito bem idealizada quando entrei no Seminário. Afinal, quem gosta de problemas? Mas, quer queiramos quer não, fazem parte de qualquer crescimento. Agora olhando em retrospectiva, todo esse processo formativo, com momentos mais difíceis do que outros, foi importante para eu crescer como pessoa e como filho de Deus, que é chamado a confiar cada vez mais em Deus Pai, que nos cuida, protege e ama. Trabalho pastoral, nomeadamente junto da comunidade portuguesa na Sé, e os estudos em Filosofia, Teologia e línguas proporcionaram-me uma boa estrutura intelectual e prática para o futuro ministério de cura de almas. Foi para mim uma bênção especial poder trabalhar na comunidade onde eu cresci, onde recebi uma boa parte da minha instrução catequética em Português. Foi na Sé que fiz a minha Primeira Comunhão e o Crisma. Foi ligado a esta comunidade que aprendi as manifestações locais de piedade popular, com raízes históricas profundas, que certamente influenciaram a forma como exprimo a fé católica. Agora, se Deus quiser, também será na Sé a minha ordenação diaconal. Que alegria e emoção! E o mais importante na formação é que a minha relação pessoal com Deus se tornou mais profunda e sólida, com alargamento de horizontes e uma experiência mais forte de Deus, de quem Ele é, de como Ele age no meio de nós. A formação do Seminário não apagou, antes integrou o meu “background” cultural e formação anterior, que inclui um curso superior em Medicina em Portugal, o ensino escolar português e a instrução catequética em Macau, da qual guardo boas e estruturantes memórias. Agora, por desígnios insondáveis de Deus, fui enviado pelo Senhor Bispo a Roma para estudar Direito Canónico, em Italiano. É certamente uma nova fase da minha formação, que, sinceramente, não estava à espera. Mais uma coisa que não estava idealizada quando entrei no Seminário.

CL – Neste ano que a diocese de Macau dedica às vocações e ao fomento das vocações, que mensagem gostaria de deixar aos jovens que se sentem, eventualmente, chamados ao Sacerdócio ou à vida religiosa?

A.A. – Não tenham medo! Deus não nos chama para nos chatear ou irritar. É verdade que, por vezes, pode ir contra os nossos planos de vida e o nosso conforto pessoal momentâneo. É verdade que pode gerar dificuldades e até conflitos com os pais, familiares e amigos que nem sempre compreendem esta escolha radical de consagração a Deus. Porém, tenhamos fé: Deus chama-nos porque Ele sabe o que é melhor para nós. Ele é omnisciente e omnipotente. Ele sabe o que é melhor para nós, qual é o caminho particular que devemos trilhar para alcançar a nossa felicidade. Deus só quer que sejamos felizes. Não tenham medo de dizer sim a Deus! Se Deus chama, Ele também ajudará. Aquilo que Ele começou, Ele vai acabar. Só precisamos de confiar n’Ele e estar aberto à Divina Providência. Não esqueçamos que Jesus fez essa promessa: «Todo aquele que tiver deixado casas, irmãos, irmãs, pai, mãe, filhos ou campos por causa do meu nome, receberá cem vezes mais e terá por herança a vida eterna» [Mateus 19, 29]. Reparem bem: não vamos receber esta recompensa só no Céu, mas já aqui na Terra! E, por experiência pessoal, posso-vos garantir de que vale a pena. Aquilo que sacrificamos para seguir este caminho, que no início parece muito, na verdade não tem comparação com as inúmeras graças, paz interior, amizades e consolações que Deus nos dá se seguirmos a nossa vocação, esse misterioso e magnífico chamamento de Deus.

Marco Carvalho

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