EUGÉNIO FONSECA, PRESIDENTE DA CÁRITAS PORTUGUESA

EUGÉNIO FONSECA, PRESIDENTE DA CÁRITAS PORTUGUESA

Comunidade portuguesa de Macau pode ajudar na requalificação de trabalhadores

A Cáritas Portuguesa e a sua congénere em Macau querem colocar os alunos do território que estudam em Portugal a ensinar Mandarim. O projecto é apenas uma das facetas do protocolo de cooperação firmado recentemente pelas duas organizações. A instituição liderada por Paul Pun vai também ajudar a promover o regresso à vida activa de portugueses que se encontrem em situação laboral precária e colaborar com a Cáritas Portuguesa na capacitação da Cáritas Internacional em países como a Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste, explicou Eugénio Fonseca a’O CLARIM.

O CLARIMO protocolo assinado entre a Cáritas Portuguesa e a Cáritas de Macau prevê que as duas organizações cooperem no fomento do ensino do Mandarim em Portugal. De que forma se vai processar esse programa de ensino da língua chinesa? Qual o papel da Cáritas Portuguesa – e já agora também da Cáritas de Macau – neste projecto?

EUGÉNIO FONSECA– Primeiro, é um papel subsidiário. Nós não vamos assumir a expansão da língua chinesa, do Mandarim, em Portugal. O próprio Ministério da Educação, tendo consciência dessa necessidade, já criou em algumas escolas como disciplina opcional o ensino do Mandarim. Agora, porque não é uma opção em todas as escolas do País e também há jovens que já passaram a fase de ensino onde se aprende o Mandarim, vamos – sobretudo nas zonas onde estão concentrados estudantes de Macau – propiciar uma conjugação entre quem possa ensinar e quem queira aprender. Ontem estivemos já a analisar as fases dessa aprendizagem. Não vamos estabelecer nenhum programa certificado. Não vamos atribuir certificados que habilitem as pessoas na língua, mas vamos criar fases de aprendizagem que levem a uma progressiva aproximação da língua, tendo isso a ver com o tipo de formadores. Se, porventura, chegarmos a níveis mais elevados da consolidação da língua, com certeza já não deverá ser suficiente o recurso a estudantes de Macau. Teremos que ir para outro tipo de formadores e, talvez, criar em Portugal uma forma de certificar esses próprios cursos, como são certificados no ensino oficial os alunos que optam pela disciplina.

CLEstá também previsto o desenvolvimento de programas de apoio a desempregados e a pessoas em situação precária em Portugal. De que forma a Cáritas Macau pode contribuir para esse desígnio?

E.F.– Nós gostávamos muito de mobilizar a comunidade portuguesa aqui residente para, através da disponibilização de alguns meios, podermos avançar para a requalificação de trabalhadores desempregados. Refiro-me a pessoas que estão em idade activa, mas que neste momento estão sem trabalho, privilegiando aqueles que já não terão possibilidade de encontrar trabalho na área em que trabalharam durante vários anos. Ao mesmo tempo, se houver a possibilidade – e isso depende também dos meios da própria Cáritas de Macau –, criar auto-emprego; as pessoas gerarem o seu próprio posto de trabalho. Estamos convictos que estaremos a contribuir para a dinamização de uma forma mais ágil de as pessoas obterem rendimentos próprios. A criação de auto-emprego tem que ser muito bem acompanhada por causa da globalização do mercado. Ninguém vive hoje a fazer Tapetes de Arraiolos. O tempo que se leva a fazer um Tapete de Arraiolos, comparativamente ao rendimento, não justifica o rendimento. Temos que investir em áreas em que possam ser aglutinadas produções do mesmo sector para haver uma expansão mais global e, até, pensar no mercado externo. O Governo português, através do Ministério da Economia, devia privilegiar isso. Não é um problema apenas dos que estão desempregados e querem criar o seu próprio emprego. É também um problema das Pequenas e Médias Empresas, que não conseguem competir com as de grande dimensão, pois estas colocam no mercado internacional os produtos a baixo preço e aqueles que têm Pequenas e Médias Empresas não o conseguem fazer em termos de escala.

CLO programa não presume – supomos – mecanismos de intercâmbio que possam trazer mão-de-obra portuguesa para Macau?

E.F.– Essa pode ser uma acção da Cáritas de Macau, mas não é esse o problema. Havendo disponibilidade da parte do Governo de Macau, é possível. Os fluxos migratórios em Portugal estão a acontecer todos os dias. Sabemos que apesar de ter baixado muito a taxa de desemprego, ainda estamos com níveis de desemprego consideráveis em termos comparativos com o resto da União Europeia, e este fenómeno afecta pessoas cuja idade e as habilitações profissionais não favorecem a reentrada no mercado de trabalho. Macau tem níveis de desemprego quase inexistentes, quase que podemos falar de pleno emprego. Mas a Cáritas não pode meter-se na questão da legalização dessas pessoas. Isso já é entre os Governos de Portugal e de Macau.

CLEste protocolo implica também a capacitação das representações da Cáritas Internacional em países como a Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste. Está-se a falar de capacitação, mas em que sentido?

E.F.– Como sabe, são países que estão muito dependentes da comunidade internacional, que dependem da boa vontade de outros países. São muito pobres. E são pobres porque, às vezes, há uma certa inércia em termos de criatividade, fruto, com certeza, de largos, larguíssimos anos de colonização. Não é que esses países não tenham potencial. Têm um enorme potencial endógeno, sobretudo no que se refere a riquezas naturais. Mas precisam também de ter dinâmicas em que se assumam como responsáveis pelo seu próprio desenvolvimento colectivo. Ao capacitarmos estas Cáritas pretendemos interromper uma atitude de subsidiarização constante de actividades que visem o bem estar das pessoas. Estamos, pelo contrário, a ajudar as pessoas a promover mecanismos de criatividade autóctones que possam rentabilizar aquilo que a natureza fornece, aquilo que pode resultar da cooperação entre diferentes países. O nosso propósito é contribuir para que estas Cáritas gozem de uma maior autonomia, ao mesmo tempo que ajudamos os países a terem um progresso autónomo maior, de forma a que não dependam tanto do exterior e possam estar mais livres em termos da co-relação política que existe com os países com os quais cooperam.

CLEssa capacitação passa, então, sobretudo pela formação de quadros qualificados…

E.F.– Sim, sim, sim. A capacitação é essencialmente isso. Com a ajuda da Cáritas de Macau, vamos desenvolver um programa de capacitação para empreendedorismo social. Este programa destina-se a agentes da Cáritas Portuguesa ou a outros que queiram aceitar essa formação proposta pela Cáritas Portuguesa. Se este programa resultar podemos depois fazer programas intensivos nesses países.

Marco Carvalho

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