Fontes de água viva
As palavras do Papa Francisco são sempre objecto de cuidadosa atenção, desde logo dentro da Igreja, mas também extramuros, logo que o conteúdo das suas mensagens tem impacto que vai para além das fronteiras da comunidade católica universal.
O exemplo mais recente está na homilia da missa comemorativa da Festa do Corpo de Deus, na Basílica de São Pedro, no passado Domingo, em que o Papa, comentando a descrição do evangelista sobre como os apóstolos foram guiados ao cenáculo por um anónimo carregador de água, reconhecia que se enfraquece cada vez mais, no mundo, a sede de Deus.
O Papa referia-se à sede das coisas essenciais, num mundo dominado pelo supérfluo e pelo transitório. E citava Deus como a resposta a todas as questões básicas e fundamentais, num mundo que prescinde largamente da presença de Deus.
“Sociedades sem Deus” são aquelas por que se batem, desde há quase três séculos, os que deificaram a Razão como nova divindade, procurando na chamada “verdade científica” aquilo que esta claramente não pode dar: a resposta a tudo.
Acrescentaria eu: daí que, como modelo alternativo, se tenham reduzido as sociedades, à escala global, a simples mercados, locais de transacção de produtos e não de relacionamento humano, onde os cidadãos são convertidos em meros consumidores, clientes, vendedores, vítimas de publicidade tantas vezes enganosa, etc., etc.
Qual o preço pago pelas próprias sociedades ao terem-se rendido a tal concepção? Pois o terem erigido o egoísmo consumista em valor absoluto. Quem se mete na engrenagem não pode sair dela.
UMA OUTRA VISÃO
Mas pode sair-se da engrenagem. A fidelidade a valores cristãos é uma das saídas, A ÚNICA SAÍDA para nós, católicos. O que se segue neste texto representa a clara contradição com esta visão mercantilista da vida.
É uma contradição deliberada. Uma forma de protesto contra a ditadura do relativismo, que só encontra uma oposição mole, ou nenhuma oposição, da parte de quem não partilha a concepção mercantilista da sociedade actual, cada vez mais dominante nas sociedades europeias.
Porque há outras maneiras de estar na vida, que não passam necessariamente pela transacção comercial (no sentido literal e simbólico) como expressão máxima do encontro entre seres humanos. Nem tudo é negócio. E sobretudo, nem tudo é negociável. É que há outras maneiras de pensar o destino final do homem, para além da falência do corpo e da inevitabilidade do forno crematório.
Para milhões e milhões há a realidade sedutora e surpreendente do invisível que irmana, ainda hoje, a maioria esmagadora dos seres humanos, para além das línguas locais, nacionais ou regionais e dos sistemas políticos, das culturas e das civilizações. ACREDITAR É AINDA POSSÍVEL.
Mas… acreditar em quê? Pois na vida espiritual, numa outra dimensão que não é a da vida terrena e onde está inscrito o nosso destino final.
NO MEU DEAMBULAR INTERIOR
…quer dizer, pelos caminhos do espírito, imaginei há dias o encontro entre dois santos – e para além de santos místicos – do Catolicismo europeu do Século XX, que nunca de facto se encontraram, ou então apenas nessa pátria ideal, último destino a que todos os crentes aspiram.
Se tal encontro terrestre tivesse ocorrido, o que poderiam ter dito um e outro, um para o outro, esses dois seres de excepção? Refiro-me a Santa Maria Faustina Kowakska e a São Pio de Pietrelcina, ela polaca, ele italiano, em cujas beatificação e canonização o saudoso Papa (e também Santo) João Paulo II teve intervenção decisiva.
O INFINITO COMO COMPANHEIRO
Logo que soube da importância de cada um deles, como testemunhas extraordinárias da relação íntima entre Criador e Suas criaturas, entre o Invisível e o visível, quis saber mais sobre cada um deles. E fui penetrando, passo a passo, no interior de dois universos maravilhosos, onde o espanto inicial da familiaridade de cada um deles com Jesus e Sua Mãe dá lugar a outros espantos, sucessivos esses, os dos efeitos dessa mesma familiaridade nas vidas dos milhares de pessoas que esses santos tocaram.
As duas biografias são tão verdadeiras, são tão genuínas, que o meu primeiro sentimento é o de lamentar a incredulidade, o cepticismo e a recusa pura e simples de acreditar… de quem não acredita!
E outro sentimento se associa a este: o de começar a compreender o quanto uma visão puramente materialista do mundo é uma forma de cegueira, auto-limitativa por definição.
A Fé surge-me assim, neste contexto como em todos os outros, como uma espécie de “óculos de ver ao longe” para quem tem as suas capacidades visuais afectadas, qualquer que seja a razão clínica.
E se a Fé é uma graça de Deus, continua a repetir-se o milagre de Jesus dando a vista ao cego, milagre que ocorre com todos aqueles que, passando a ter essa visão da alma, começam de súbito a ver o que antes ignoravam.
ENCONTRAR JESUS E MARIA NA INFÂNCIA
Ler e editar sobre o Diário espiritual de Santa Faustina é fazer uma extraordinária viagem, por paisagens de uma indescritível altura e profundidade que não constam de nenhum destino turístico.
Santa Maria Faustina Kowalska do Santíssimo Sacramento nasceu como Helena Kowalska, em Glogowiec, condado de Leczyca, noroeste de Lódz, na Polónia, em 25 de Agosto de 1905. Era a terceira de dez filhos de uma família pobre e religiosa.
Faustina sentiu pela primeira vez um apelo interior para a vida religiosa quando tinha apenas sete anos de idade. Depois de terminar os estudos, quis entrar imediatamente para um convento, mas os pais recusaram. Esse foi o início de uma longa e prodigiosa caminhada…
E quanto ao Padre Pio de Pietrelcina? Francesco Forgione nasceu de Grazio Mario Forgione em 25 de Maio de 1887, em Pietrelcina, uma cidade na província de Benevento, na região da Campânia, no sul da Itália. Seus pais eram camponeses.
Francesco aos cinco anos decidiu dedicar toda a sua vida a Deus. Ajudou os pais até aos dez anos, cuidando do pequeno rebanho de ovelhas da família.
Aos quinze anos entrou para o convento dos franciscanos, para uma vida sofrida mas extraordinária de contacto permanente com o Divino. Que o tornou um dos grandes intercessores do seu tempo, erguendo a Deus as múltiplas e profundas misérias do mundo.
POR CAMINHOS SÓ DELES
Faustina falou com Jesus, durante anos e anos, no silêncio do seu coração. As palavras do Filho de Deus e Ele próprio Deus encarnado inscreviam-se com nitidez na mente da humilde religiosa, cozinheira, jardineira e porteira dos conventos onde primeiramente professou. Deus escolhe os humildes… E Faustina “via” Jesus e Maria. Que dela se aproximavam para a estimular, a confortar.
Pio de Pietrelcina não saiu durante cinquenta anos do seu convento e no entanto apareceu a centenas de pessoas, em todo o mundo, protagonista que foi do chamado fenómeno da bilocação, quer dizer, o estar em dois lugares diferentes ao mesmo tempo.
Mas a marca definitiva da profunda união de Pio com Jesus seria simbolizada pelos estigmas, a reprodução real das feridas do Crucificado nas mãos, nos pés e no ombro. Equipas de clínicos famosos debruçaram-se sobre o fenómeno e não conseguiram explicá-lo. Como dizia um autor recente, é preciso ter muita Fé para ser ateu!
Carlos Frota