Frustração valeu bilhete para Leiria
A última jovem que O CLARIM entrevistou no Instituto Politécnico de Leiria chama-se Chen Jiahui. Veio de Xangai mas gosta de ser conhecida como Teresa, nome português que escolheu quando começou a estudar a língua de Camões.
Nascida a 31 de Agosto de 1997, a dois anos da transferência de soberania de Macau para a República Popular da China, não se lembra do processo e do sentimento nacionalista que se viveu nessa altura. No entanto, diz que se lembra que olhou para Macau como um excelente exemplo da convivência sã entre as culturas ocidental e oriental.
Chegou a Portugal no dia 13 de Setembro de 2016 e logo aproveitou ao máximo a oportunidade que teve, através do Instituto Politécnico de Macau (IPM), de estudar em Portugal. «Foi sempre um sonho» desde que ingressou por esta variante académica.
Antes de ter estudado em Macau fez o percurso do Ensino Secundário em duas das mais prestigiadas escolas de Xangai, a Kaiyuan Middle School e a Shixi High School, tendo já nessa época uma grande paixão por aprender línguas estrangeiras. A primeira que apareceu foi naturalmente o Inglês, mas como as suas notas no exame nacional de acesso ao Ensino Superior da China não foram famosas, foi colocada de parte a ambição de entrar na Shanghai International Studies University (SISU). Este percalço deixou-lhe marcas, pois ficou muito triste por não conseguir entrar naquele que é, muito provavelmente, o local mais conceituado para o estudo de línguas estrangeiras em toda a China. «O Inglês era uma paixão, era o primeiro trabalho de casa que fazia», recorda Teresa com alguma nostalgia.
Embora triste com a impossibilidade de ingressar na SISU, descobriu que o IPM iria realizar uma sessão de esclarecimento e de apresentação dos seus cursos num local perto da casa onde residia com os pais. Com alguma curiosidade e sem nada a perder, decidiu ver as opções que iriam ser apresentadas. Foi então que ficou a saber que o melhor curso da instituição era o TICP (Tradução e Interpretação Chinês-Português).
Apesar de não ter qualquer conhecimento prévio da Língua Portuguesa, mas tendo gosto em aprender línguas ocidentais, decidiu experimentar e aceitar o desafio. Submeter a candidatura foi o primeiro passo, algo que fez sem grandes esperanças, mas foi aceite. Algum meses depois estava de malas aviadas para Macau onde iria passar os próximos três ou quatro anos. Não fazia a mínima ideia que um dos anos seria vivido na cidade de Leiria, em Portugal.
Quando foi informada que no programa do TICP estava incluído um ano de aprendizagem em Portugal, sentiu um misto de apreensão e excitação. Afinal, Portugal era do outro lado do mundo e a viagem mais longa que tinha feito, até então, havia sido entre Xangai e Macau.
Teresa espera vir a ser professora ou tradutora. Contudo, não descarta outras opções que possam vir a surgir depois de terminar o curso. Como sempre afirma: «As opções são muito variadas e todas elas bastante atraentes para uma jovem em fim de curso».
De Portugal leva uma excelente experiência. Gostou, especialmente, de conhecer de perto os portugueses, que lhe deram a oportunidade de aprofundar os conhecimentos de uma forma que, em Macau ou na China, seria completamente impossível.
Meio tímida, confessa que ficou «surpreendida» com o facto dos portugueses que conheceu lhe dizerem que o seu nível de Português «era muito bom». Na sua opinião, tal «apenas reflecte a excelência do ensino da língua no IPM». Quando chegou a Portugal tinha vergonha de falar em Português, mas ao aperceber-se que não havia grandes problemas de comunicação “disparou” a falar Português.
Teresa diz que regressa «apaixonada pelos supermercados portugueses, que têm de tudo! São enormes e bem abastecidos». Para nossa surpresa, elogiou os restaurantes chineses em Portugal, os quais considera que «em nada ficam atrás dos da China».
Nos meses que passou em Leiria aproveitou para viajar, tendo visitado Lisboa, Porto, Aveiro e outros locais. Não podia deixar de o fazer, pois não sabe quando poderá regressar.
Desta vivência leva também memórias inesquecíveis. Fez amigos por todos os locais onde passou, guardando num cantinho especial do coração as senhoras da cantina do Instituto Politécnico de Leiria, que sempre a ajudaram e com quem aprendeu muito sobre a cultura portuguesa. Foram também elas que quase todos os dias a incentivavam a falar em Português, reconhecendo que foi essa «uma das principais razões» porque o seu nível linguístico «evoluiu imenso em tão pouco tempo».
Ciente de que os estudantes têm de aproveitar estas oportunidades, desde o primeiro dia que recusou ficar dentro da residência estudantil. «Ficava ali apenas para dormir ou quando tinha de estudar com mais concentração. De resto, – segundo nos explicou – andava sempre na rua a visitar coisas, a fazer amigos e tentar integrar-me o mais possível na cultura e no modo de vida dos portugueses».
No futuro, agora que o curso está a chegar ao fim, espera «vir a contribuir para o fortalecimento das relações entre Portugal e a China» e que «o papel de Macau continue a ocupar um lugar de relevo no estreitar de laços entre os dois países».
JOÃO SANTOS GOMES