TEOLOGIA, UMA DENTADA DE CADA VEZ (34)

TEOLOGIA, UMA DENTADA DE CADA VEZ (34)

Se Deus é imutável, para quê rezar-Lhe?

Já vimos que Deus é eterno porque não muda; não está sujeito ao passar do tempo. Isto leva-nos a uma nova questão. Se o Seu Ser não muda, nem os Seus pensamentos irão mudar, qual a utilidade de se rezar?

São Tomás de Aquino aborda esta questão na “Summa Theologiae”, em que pergunta se será vantajoso rezarmos. E apresenta três objecções.

1– Parece que rezar é necessário apenas “para fazer com que os nossos desejos sejam reconhecidos pela entidade (divina) a que rezamos. Mas de acordo com Mateus 6:32 – «O teu Pai sabia que tu terias necessidade de todas essas coisas» – não se trata de rezar a Deus.

2– Quando rezamos “‘torcemos’ a mente da entidade (divina) a que rezamos, para que possa fazer o que lhe pedimos. Mas a mente de Deus é imutável e inflexível” – como já vimos. “Assim sendo”, diz Aquino, “não é apropriado que rezemos a Deus”.

3– “É mais liberal dar a quem não pediu, do que a quem pediu. E Deus é supremamente liberal”. Se Lhe pedirmos, não O deixamos ser liberal – parece que O impedimos de voltar a mostrar a Sua generosidade. Logo, parece que será melhor não pedir ou rezar.

São Tomás recorre a Lucas 18:1 – «Devemos rezar sempre e não desfalecer» – para demonstrar três erros relacionados com as orações:

1 – “As questões humanas não são regidas pela Divina Providência, pelo que é inútil de todo rezar e adorar a Deus, porque Deus não pode mudar nada”.

2– “Todas as coisas, mesmo as questões humanas, acontecem necessariamente”. Daí que rezar seja inútil pois ninguém as pode alterar.

3– “As questões humanas são regidas pela Divina Providência e as coisas não acontecem necessariamente”. Esta terceira frase – antagónica à primeira e à segunda – faz crer que a Divina Providência tudo pode alterar pela oração e adoração. Por conseguinte, temos que rezar para que Deus mude de opinião.

São Tomás responde às três objecções da seguinte forma:

1– “Precisamos de rezar a Deus, não para O fazer conhecer as nossas necessidades ou desejos, mas para lembrarmos a nós próprios da necessidade que temos de recorrer ao auxílio de Deus nestes assuntos”. Rezar redime-nos da nossa necessidade e dependência de Deus. Rezar torna-nos humildes.

2– “A intenção da oração não é mudar a opinião de Deus. Mas nos Seus planos Deus decidiu que faria certas coisas acontecerem se a Ele rezássemos por elas”. Ele apenas está à espera do nosso pedido.

3– “Muitas vezes, Deus dá-nos muitas coisas para além da Sua liberalidade, mesmo sem Lhe pedirmos”. Em outras ocasiões, Ele quer que nós peçamos, “de forma que adquiramos confiança por termos recorrido a Deus e que possamos reconhecê-Lo como o Autor dos nossos bens”.

Ainda sobre este tema, devemos acrescentar algo mais. Com certeza que as orações nos ajudam a obter coisas de que precisamos, mas essa não é a única razão para rezarmos.

Somos criaturas: devemos mostrar apreço pelos bens que recebemos – tanto os que conhecemos como os que não conhecemos – e agradecer a Deus por eles.

Somos pecadores: precisamos de pedir perdão pelas nossas ofensas.

Somos filhos de Deus: qual o filho que não fala com o seu pai?

Somos amigos de Deus: a conversação é essencial à amizade. A amizade forma-nos e muda-nos. As nossas orações podem não alterar Deus; podem não alterar outras pessoas; mas seguramente mudam-nos a nós.

Pe. José Mario Mandía

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