TEOLOGIA, UMA DENTADA DE CADA VEZ (223)

TEOLOGIA, UMA DENTADA DE CADA VEZ (223)

A oração é para todos?

Há já algum tempo vimos que por meio da razão o Homem toma consciência da existência de Deus (FILOSOFIA, UMA DENTADA DE CADA VEZ nº 78). O Homem torna-se consciente também do seu relacionamento com a divindade – o Homem é religioso por natureza (cf. TEOLOGIA, UMA DENTADA DE CADA VEZ nº 3; FILOSOFIA, UMA DENTADA DE CADA VEZ nos76-77). Tertuliano (155-220 d.C.) falou sobre o “testemunho da alma naturalmente cristã” (testimonium animae naturaliter christianae, “Apologeticus pro christianis” 17.6; “Patrologia Latina” 1:377).

A relação é caracterizada pela oração. O Homem pode conhecer a existência de Deus por meio da razão, o Homem relaciona-se naturalmente com Deus por meio de alguma religião e, como consequência, o Homem naturalmente reza.

Se podemos encontrar a religião em todas as culturas, também podemos encontrar a oração em todas as culturas. “Mesmo depois da queda, o homem continua a ser capaz de reconhecer o seu Criador, conservando o desejo d’Aquele que o chamou à existência. Todas as religiões e, em especial, toda a história da salvação, testemunham este desejo de Deus por parte do homem, se bem que é sempre Deus que primeiro e incessantemente atrai cada uma das pessoas para o encontro misterioso da oração” (Compêndio do Catecismo da Igreja Católica nº 535).

O Papa Bento XVI explicou este fenómeno universal no primeiro da sua série de discursos sobre a oração, proferido na Audiência de quarta-feira, 4 de Maio de 2011, na Praça de São Pedro. O Santo Padre citou exemplos concretos de oração nas culturas antigas.

Egipto:O Papa Bento XVI citou uma antiga oração. “O meu coração deseja ver-te… Tu que me fizeste ver as trevas, cria a luz para mim. Que eu te veja! Debruça sobre mim o teu rosto dilecto” (A. Barucq – F. Daumas, “Hymnes et prières de l’Egypte ancienne”, Paris 1980).

Mesopotâmia:“Ó Deus, que és indulgente também na culpa mais grave, absolve o meu pecado… Olha, Senhor, para o teu servo arrasado, e sopra a tua brisa sobre ele: perdoa-o sem demora. Alivia a tua punição severa. Livre dos vínculos, faz com que eu volte a respirar; quebra a minha cadeia, liberta-me dos laços” (M.-J. Seux, “Hymnes et prières aux Dieux de Babylone et d’Assyrie”, Paris 1976).

Grécia:Platão escreveu a oração do seu professor Sócrates. “Fazei que eu seja bonito dentro. Que eu considere rico quem é sábio, e que de dinheiro eu só possua quanto o sábio puder tomar e levar. Não peço mais” (Platão. Fedro).

Roma:De um escritor romano: “Tu és santa, tu és em todo o tempo salvadora da espécie humana, na tua generosidade tu dás sempre ajuda aos mortais, tu ofereces aos miseráveis em dificuldade o doce carinho de uma mãe. Nem um dia nem uma noite, nem qualquer instante, por mais breve que seja, passa sem que tu o cumules com os teus benefícios” (Apuleio de Madaura, Metamorfoses IX, 25).

Também em Roma, Marco Aurélio (Imperador de 161 a 180 d.C.) escreveu nas suas Meditações: “Quem te disse que os deuses não nos ajudam inclusive naquilo que depende de nós? Portanto, começa a pedir-lhes e verás” (“Dictionnaire de Spiritualitè” XII/2, col. 2213).

O Papa Bento XVI conclui a sua reflexão com as seguintes palavras: “Nos exemplos de oração das várias culturas, por nós considerados, podemos ver um testemunho da dimensão religiosa e do desejo de Deus inscrito no coração de cada homem, que recebem cumprimento e plena expressão no Antigo e no Novo Testamento”.

Sim, de facto, a oração é para todos.

Pe. José Mario Mandía

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