O compromisso reduz a liberdade?
A liberdade é sagrada e inviolável porque é uma imagem da liberdade de Deus, que… é sagrada e inviolável! É por isso que Deus não permite que nada – nem anjos, nem demónios, nem mesmo Ele próprio – violea liberdade.
Pelo que vimos no ensaio anterior, podemos definir a liberdade como a capacidade de fazer escolhas conscientes e inteligentes.
Como também vimos, a liberdade torna-nos donos das nossas acções. E ao sermos donos das nossas acções, somos também responsáveis por elas. Uma analogia facilita a compreensão do que isto significa: digamos que possuo um carro, participo numa corrida automóvel e o meu carro ganha a corrida. Quem é que recebe o mérito e o respectivo troféu ou prémio? Eu!
Outro exemplo: digamos que estou a conduzir o mesmo carro nas ruas da cidade e ao fazê-lo de maneira descuidada atropelo um pedestre. De quem é a culpa? Quem é punido neste caso? Eu!
“A liberdade implica a possibilidade de escolher entre o bem e o mal, e portanto, de crescer na perfeição ou de falhar e pecar. É ela que caracteriza os actos propriamente humanos. Torna-se fonte de louvor ou de censura, de mérito ou de demérito” (Catecismo da Igreja Católica nº 1732).
Deus quer que ajamos livremente, porque somente quando o fazemos podemos reivindicar um prémio pelas nossas acções. Uma pessoa não pode ser forçada a ganhar o céu, nem forçada a ser condenada ao inferno.
A LIBERDADE É EXERCIDA NOS COMPROMISSOS –Deus quer que ajamos livremente, e agir livremente implica escolher entre várias opções. Ao nos comprometermos com uma das opções disponíveis, direccionamos automaticamente a nossa vida num determinado sentido.“Mas tal não significa que eu perca a minha liberdade?”, podemos questionar. A resposta é “não!”. Não perdemos a liberdade. Na realidade, ao escolhermos uma das opções disponíveis, renovamos a nossa liberdade.
A vida é uma jornada, e como em todas as jornadas vamo-nos deparando com inúmeras encruzilhadas. Perante as encruzilhadas, temos de fazer escolhas. Se optamos por não fazer escolhas, ficamos presos num só lugar – estagnamos, por assim dizer. Só quando decidimos, ou seja, só quando tomamos decisões, é que podemos seguir em frente.
São João Paulo II costumava aconselhar muitos jovens. Muitas das vezes, depois de os ouvir e de falar com eles, dizia-lhes: «Vocês devem decidir». O que está aqui subjacente é a ideia que ao usarmos a nossa liberdade, somos donos na nossa própria vida.
O padre Gerard McGinnity explica: “Quando Michelangelo lascou o bloco de mármore, uma possibilidade morreu a cada lasca, mas pouco a pouco nasceu a Pietà. Se ele não tivesse lascado o bloco de mármore, este teria permanecido até ao fim dos tempos, cheio de possibilidades, mas vazio de realização. Uma boa escolha significa crescimento, mas também significa estreitamento. Para crescer numa possibilidade, devo morrer para outras. Ao contrário do bloco de mármore, sou eu mesmo que devo escolher livremente morrer para todos menos um, ou a minha liberdade para todas as possibilidades tornar-se-á numa armadilha para toda a minha liberdade. Enquanto tentar manter várias possibilidades, nenhuma se tornará realidade” (“Christmen: Experience of Priesthood Today”, Four Courts Press Ltd, 1988).
O Papa Francisco já ressalvou em várias ocasiões que uma das doenças espirituais do nosso tempo é o medo de assumir compromissos. «A cultura de hoje parece encorajar as pessoas a não se relacionarem com nada nem com ninguém, a não confiarem» (Papa Francisco, Encontro com os Bispos, 27 de Setembro de 2015).
Já em 2013, numa das suas missas celebradas na Casa de Santa Marta, o Santo Padre criticou a «cultura do temporário». Na ocasião, afirmou que estamos «apaixonados pelo provisório» e não gostamos das «propostas definitivas» de Jesus.
Infelizmente, há jovens que pensam seguir o Sacerdócio, masraciocinam desta maneira: “Eu seguirei o Senhor até um certo ponto e depois se verá…”. A mesma atitude também se verifica no casamento. Ninguém se quer comprometer com outra pessoa, para assim poder “experimentar” com várias. No Encontro Mundial das Famílias, realizado na cidade de Filadélfia (Estados Unidos) em 2015, o Papa referiu que hoje os jovens casam mais tarde do que anteriormente. Daí que o casamento seja um grito de revolta contra a cultura do temporário.
Neste âmbito, Francisco lançou um desafio durante a Jornada Mundial da Juventude de 2013: «Peço-vos, em vez disso, que sejam revolucionários, que nadem contra a maré; sim, eu estou a pedir-vos que vocês se rebelem contra a cultura que tudo vê como temporário, e que em última análise acredita que vocês são incapazes de assumir responsabilidades, que são incapazes de viver um amor verdadeiro».
Pe. José Mario Mandía