Por meio da Eucaristia, que o Espírito Santo permeie toda a vossa vida!
Nesta economia lenta, diante da inflação, da redução dos rendimentos e do desemprego crescente, nada pode ser dado como certo. Ter um apartamento, um salário fixo e um bom seguro de saúde tornou-se inacessível para muitos. Hoje em dia estamos todos a aprender a valorizar os bens materiais que possuímos. Nós conquistamo-los com o nosso esforço, mas ao mesmo tempo sentimo-nos abençoados por os podermos desfrutar.
Na nossa vida de fé, o “espiritual” é o que mais importa. Também assumimos que “espiritual” é o oposto de “material”, provavelmente porque nas últimas décadas fomos superexpostos ao materialismo que nega qualquer coisa de espiritual. Pensamos, assim, que o espiritual tem a ver exclusivamente com o “imaterial”: sentimentos internos, pensamentos sagrados, imagens mentais ou ideais elevados… No entanto, na maioria das vezes, é através das coisas materiais que experimentamos as graças espirituais de Deus.
No Evangelho de hoje (Lucas 9,11-17), vemos os discípulos também a lidar com um orçamento apertado. No entanto, cinco pães e dois peixes, colocados nas mãos de Jesus e abençoados, partidos e partilhados, tornaram-se milagrosamente o sinal da abundância do Reino de Deus e a prefiguração da Eucaristia. O pão e o vinho, na última ceia de Jesus e nas nossas Eucaristias, também são abençoados, partidos e partilhados para se tornarem sacramento da presença de Cristo. Mas também a água, o óleo, as palavras e os gestos (como a imposição das mãos), e até mesmo as pessoas (no caso do Sacramento da Ordem), constituem a “matéria” essencial para a celebração de todos os Sacramentos: “os sinais e os instrumentos pelos quais o Espírito Santo derrama a graça de Cristo, que é a Cabeça, na Igreja que é o seu Corpo” (Catecismo da Igreja Católica nº 774).
O que faz a diferença é a acção do Espírito, que está no centro de cada celebração sacramental, especialmente na Eucaristia. Ali, o celebrante pronuncia a Epiclesis(palavra grega que significa “invocação sobre”), a intercessão para pedir ao Pai “que envie o Espírito santificador para que as oferendas se tornem o corpo e o sangue de Cristo e para que, recebendo-as, os fiéis se tornem eles próprios uma oferenda viva para Deus” (CIC nº 1105).
A nossa experiência sacramental influencia o modo como nós, católicos, vemos o mundo material. Podemos dizer que algo é verdadeiramente “espiritual” quando é permeado pelo Espírito Santo e útil para nos abrirmos a Deus. Espiritual é qualquer coisa que seja instrumento para nos transformar, tornando-nos pessoas mais semelhantes a Cristo. Portanto, as coisas materiais podem, de facto, tornar-se espirituais.
No caso da Eucaristia, há presente outra “camada” de significado. O pão e o vinho não são apenas “frutos da terra” e dádivas do Criador, mas também “obra das nossas mãos”. Os grãos de trigo devem ser plantados, colhidos, moídos e cozidos para se tornarem pão. Da mesma forma, as uvas devem ser colhidas, prensadas e fermentadas para se tornarem vinho. Quando apresentamos no altar o pão e o vinho que se tornarão o Corpo e o Sangue de Cristo, também neles oferecemos simbolicamente a Deus toda a actividade humana, necessária à nossa vida quotidiana: o nosso trabalho, os nossos estudos, as nossas relações pessoais, o esforço que imprimimos para sustentar as nossas famílias e desenvolver a nossa sociedade, e até mesmo os sofrimentos que carregamos nos nossos corpos quando estamos doentes. Todos estes aspectos “materiais” da nossa vida, juntamente com o pão e o vinho, são apresentados a Deus para serem permeados pelo Espírito Santo, que os transforma em aspectos importantes da nossa jornada espiritual e da nossa participação no plano redentor de Deus para o mundo.
Mesmo o peditório que ocorre durante a Eucaristia não é simplesmente uma contribuição “mundana” para as despesas da Paróquia. Desde o início, os cristãos trouxeram, junto com o pão e o vinho para a Eucaristia, presentes para compartilhar com os necessitados, imitando Cristo que compartilhou a Sua vida connosco (CIC nº 1351). A partilha dos “frutos das nossas mãos”, na Eucaristia e fora dela, é um meio pelo qual caminhamos para o nosso destino real, que é a nossa comunhão final com Deus. A missão de Cristo de transformar o mundo no Reino de Deus exige a nossa participação activa: «Dá-lhes de comer» (versículo 13), diz Jesus no Evangelho de hoje, antes de multiplicar os cinco pães e os peixes.
É lindo saber que todos os aspectos da nossa vida, incluindo os desafios que enfrentamos para nos manter economicamente à tona por meio da labuta diária, não são negligenciados por Deus e podem ser trazidos para a nossa liturgia. Que o Espírito Santo nos ajude a ver em tudo, mesmo no nosso trabalho e nas nossas posses, um nível mais profundo de significado: um sinal da presença e do amor de Deus a ser compartilhado com o mundo.
Pe. Paolo Consonni, MCCJ