Pela união de católicos e ortodoxos
Depois do dia 11 de Novembro, dia de São Martinho de Tours, das castanhas e do vinho novo no Ocidente, temos, no dia seguinte, a celebração de São Josafat pela Igreja Católica. Mártir do Cristianismo, foi um bispo católico grego ruteno (dos Rus de Kiev) no Século XVII. São Josafat da Lituânia – como também é conhecido – é considerado o padroeiro do regresso à unidade entre os cristãos ortodoxos e católicos, divididos por um cisma histórico que, apesar da passagem dos séculos, exige uma reconciliação definitiva.
Com o nome de baptismo Ivan Kunchych, nasceu por volta de 1580, em Volodymyr, na Volínia, território do reino da Polónia-Lituânia. Viria a morrer a 12 de Novembro de 1623, em Vitebsk, actual Bielorrússia, mas que então pertencia ao reino da Polónia-Lituânia. Josafat pertenceu à Igreja Uniata Rutena (actual Igreja Greco-Católica Ucraniana, em comunhão com a Igreja Católica).
Josafat é um nome de origem hebraica, que significa “Deus é o meu juiz”. Hoje em dia a Lituânia é, em grande parte, uma nação católica – mesmo depois dos setenta anos na antiga União Soviética. Mas tempos houve em que a religião deste país era liderada por cismáticos ortodoxos que não obedeciam ao Sumo Pontífice de Roma. A conversão da Lituânia ao Catolicismo deve-se, em grande parte, a São Josafat, que teve, porém, que derramar o próprio sangue para que os seus compatriotas pudessem abraçar o Catolicismo.
O Santo nasceu em 1580, filho de fervorosos pais católicos. A mãe ensinou-o a olhar de vez em quando para o Crucifixo e a pensar no que Jesus Cristo sofreu por nós, gesto que o comovia muito e o fez descobrir uma vocação eclesiástica, pela qual poderia dedicar a vida para fazer com que o Nosso Salvador fosse mais venerado.
Ainda jovem tornou-se auxiliar de um vendedor de tecidos e nos tempos livres dedicava-se à leitura de livros religiosos. A princípio, o dono da loja não gostou muito disso, mas depois, vendo que o jovem se dedicava com tanto cuidado aos trabalhos que tinha para fazer, percebeu que a leitura piedosa o levava a ser melhor no cumprimento do seu trabalho. O negociante gostou tanto de Josafat que lhe fez duas ofertas: permitir que se casasse com a sua filha e, consequentemente, deixá-lo como herdeiro de todos os seus bens. O jovem agradeceu as ofertas, mas disse-lhe que estava mais determinado a obter outra herança: o céu eterno. Para tal, acrescentou que se iria dedicar à vida religiosa.
Conheceu dois santos padres jesuítas que o orientaram nos estudos e o encaminharam para o mosteiro dos monges basilianos da Santíssima Virgem da Trindade, em Vilnius, hoje capital da Lituânia, tornando-se religioso, corria o ano de 1604. Acompanhou-o para o mosteiro um grande amigo, um indivíduo culto, Benjamin Rutsky, que a partir de então seria o seu eficiente colaborador em tudo.
Antes, em 1595, os principais líderes religiosos ortodoxos da Lituânia propuseram a adesão à Igreja Católica de Roma, mas grupos ortodoxos mais fanáticos opuseram-se violentamente e ocorreram muitos distúrbios nas localidades do País. Mas Josafat tinha acabado de entrar na vida monástica basiliana, ou seja, na vida religiosa, com a qual viria a lutar e se sacrificar para que a sua nação se convertesse à Igreja Católica. Um projecto, contudo, que lhe custaria o próprio sangue.
Josafá foi ordenado sacerdote, mas manteve uma vida de mortificação, consagrando grande parte do dia à oração, ou à leitura e meditação das Sagradas Escrituras e de livros escritos por santos. Como penitência, suportou o terrível frio do Inverno e o calor abafado do Verão, sem se queixar ou procurar mitigar tais inclemências. Oferecia o sofrimento pelos seus pecados, pedia esmola para dar aos pobres, de forma humilde, tudo sempre pelos pecados. Mas a sua especial mortificação era suportar pessoas duras e incompreensíveis, sem nunca demonstrar desagrado ou ressentimento.
Foi nomeado superior do mosteiro de Vilnius, mas vários dos monges que aí viviam eram ortodoxos e anti-romanos. Com muita paciência, muita prudência e caridade, com muita delicadeza e santa diplomacia, Josafat conquistou toda a gente. Tinha o dom do conselho, sendo consultado sobre vários problemas e preocupações, dando sempre sábias respostas, de conforto e de paz. Nas palestras que proferiu convenceu gradualmente outros monges e o povo de que a verdadeira Igreja é a Igreja Católica, que o sucessor de São Pedro é o Sumo Pontífice e que este deve ser obedecido.
Em 1617 foi nomeado arcebispo de Polotsk e descobriu que este Arcebispado estava em completo abandono. Os anos subsequentes foram dedicados a visitar paróquias, a escrever um catecismo, a cuidar dos pobres e palestrar às populações, o que lhe conferiu grande santidade popular. Em 1620 já a Diocese estava diferente, para melhor! E estava mais apetecível para “caçadores” de dioceses, entre sacerdotes carreiristas, como um tal de Melécio, que se autoproclamou arcebispo de Polotsk, em vez de Josafat. Instigou-se uma revolta contra Josafat (indirectamente, contra o Papa de Roma). Muitos sentiram-se perturbados pela denúncia dos seus vícios e maus hábitos.
Com coragem, Josafat rumou a Vitebsk, cidade em fúria contra si. O Santo achou que deveria visitar o burgo e fazer as pazes, mas foi aconselhado a não o fazer, pelo menos sem escolta militar. Estava-se em 1623: o aviso era verdadeiro. Para além de insultos, choveram também pedras, bramiram-se ameaças, uma multidão agressiva cercou-o, e entre gritos a acusá-lo de “amigo do Papa de Roma” começaram a bater nos seus auxiliares, que foram tombando, até chegar a vez de Josafat. Foi espetado, morto a tiro e atirado ao rio Dvina, depois de arrastado pelas ruas. Os seus algozes mais tarde converteram-se à fé católica…
Morreu como mártir, o santo padroeiro da luta pela unidade dos cristãos, sob o primado de Pedro.
Vítor Teixeira
Universidade Fernando Pessoa