Onde pára a Religião e Moral?

RETIRADA DOS CURRÍCULOS NO FINAL DOS ANOS 90, FOI SUBSTITUÍDA POR DISCIPLINA FRACTURANTE

Onde pára a Religião e Moral?

Há vários anos que os alunos do Ensino Público não têm a disciplina de Religião e Moral.

Muitos pais, principalmente católicos, questionam o porquê do Ministério da Educação de Portugal ter retirado a disciplina de Religião e Moral dos currículos, depois de um processo que basicamente se divide em três fases:

A partir do ano lectivo 1998-1999 passou a ser dada a possibilidade aos alunos de escolherem entre as disciplinas de Religião e Moral, e Desenvolvimento Pessoal e Social.

Numa segunda fase, o Ministério da Educação retirou a Religião e Moral dos programas do Ensino Público – os colégios privados, nomeadamente de matriz católica, nunca deixarem de leccionar a disciplina –, por considerar que tal “oferta” não era justa para as restantes religiões. Note-se que Portugal é um país laico e secular, mas com uma forte vertente cultural de origem judaico-cristã.

É então que o Ministério da Educação torna obrigatório a frequência da disciplina de Desenvolvimento Pessoal e Social, sendo nesta gradualmente incluídos conteúdos que hoje fazem parte da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento (em Macau tem o nome de Educação Cívica e Desenvolvimento), que viria naturalmente a substituir a sua predecessora no ano lectivo 2018-2019.

À semelhança do que acontece na Escola Portuguesa de Macau em relação à Religião Católica, em algumas instituições da rede nacional de ensino há grupos voluntários destinados aos alunos que queiram aprender sobre uma determinada religião, o que em muitos casos tem resultado num redundante fracasso. A maioria dos pais queixam-se que os filhos já passam muito tempo na escola e preferem, por exemplo, inscrevê-los nas aulas de catequese aos fins-de-semana, que por norma têm lugar antes ou após a Missa Dominical.

Pais versusMinistério da Educação

No passado mês de Julho, Portugal acordou em choque com a decisão do secretário de Estado para a Educação, João Costa, de fazer retroceder – leia-se, chumbar – dois irmãos, alunos naturais de Famalicão, do 9.º para o 7.º ano de escolaridade e do 7.º para 5.º ano, respectivamente, por não terem frequentando a disciplina de Cidadania e Desenvolvimento, pois os pais destes alunos recorreram ao direito de objecção de consciência, garantido pela Constituição Portuguesa.

Segundo o jornal Observador, trata-se de dois alunos do Agrupamento de Escolas Camilo Castelo Branco, em Famalicão, com média de cinco valores; integram o Quadro de Honra e já venceram múltiplas Olimpíadas educativas.

Segundo o despacho assinado por João Costa, o Ministério da Educação anula a decisão que permitiu aos dois alunos transitarem no ano lectivo 2018-2019, pelo que na prática são obrigados a repetir dois anos de escolaridade e, consequentemente, frequentar a disciplina de Cidadania e Desenvolvimento.

Ainda segundo o Observador, por detrás da decisão dos pais dos alunos famalicenses está o facto de considerarem que alguns dos tópicos abordados, como Igualdade de Género, Interculturalidade, Sexualidade e Media pertencerem sobretudo à responsabilidade educativa da família e não do Estado. Alegam que a ideologia do Estado não está em sintonia com a da família.

Cabe agora aos tribunais decidir da legalidade da decisão do secretário de Estado para a Educação. De acordo com o jornal Público, é bem provável que os pais venham a ganhar este “braço de ferro”, uma vez que o ensino em Portugal permite que os alunos transitem de ano com notas negativas a algumas disciplinas, inclusivamente em áreas tão nucleares para a formação dos jovens como são o Português e a Matemática.

Fundadores da APFN

pronunciam-se

Numa missiva intitulada “Carta aberta aos pais de Famalicão”, Fátima e Henrique Fonseca, pais de sete filhos e fundadores da Associação Portuguesa das Famílias Numerosas (APFN), solidarizam-se com os queixosos.

“Os anos passaram e não nos surpreende que os vossos problemas neste momento sejam a defesa do modelo educativo em que acreditam e a defesa dos direitos dos vossos filhos numa escola pública. A situação em que agora se encontram não nos pode ser indiferente!”, começam por afirmar Fátima e Henrique, ela professora e ele oficial da Marinha de Guerra.

De seguida, referem que hoje são “avós de dezasseis netos, entre os 21 anos e os oito meses”, já estão “na reforma e retirados da primeira fila destas lutas de sempre”. Contudo – sublinham – “queremos dar-vos o nosso apoio moral! Não entendemos o despacho insensato e muito injusto das autoridades para convosco e vossos filhos! Em primeiro lugar, louvamos a vossa coragem em ir contra o politicamente correcto e o silêncio acomodatício”.

Fátima e Henrique baseiam-se em informações que foram obtendo nos últimos anos e não têm pejo em considerar que embora o programa da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento inclua “matérias diversas que recolhem consenso geral – defesa do Ambiente, Sustentabilidade, Segurança Rodoviária, Comportamentos de Risco, etc., – impõe igualmente temas fracturantes como são a Ideologia de Género, a Sexualidade e a Saúde Reprodutiva”.

Neste quadro, os signatários da carta defendem que “é direito e dever dos pais abordarem estes temas quando e como entenderem, e pedirem ajuda da escola se não se sentirem aptos a fazê-lo”. Mas a escola – acrescentam – “não pode nem deve imiscuir-se ou substituir os pais em matérias tão delicadas e marcantes para o resto das suas vidas!”.

A concluir, lembram que “já assim acontece com as aulas de Religião e Moral [quando disponibilizadas pelas escolas privadas e em regime voluntário], que só são frequentadas pelos alunos que quiserem, ou cujos pais os inscrevam. E porquê? Precisamente porque tem a ver com foro íntimo e liberdade de opção dos pais. Uns querem, outros não! E assim está correcto. Se os pais querem, e as crianças e os jovens também, inscrevem-se livremente. Além disso, têm as igrejas, a catequese e o Ensino Privado Católico. Se têm outras convicções, elas são respeitadas”.

José Miguel Encarnação

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