Tipos de Paz e suas Colunas – 2
Depois de termos descrito a Paz, continuemos a nossa jornada. Reflictamos, pois, sobre os tipos de Paz e as quatro (mais uma) colunas que a sustentam.
TIPOS DE PAZ
Na sua Summa Theologiae (Suma Teológica), São Tomás de Aquino fala de diferentes tipos de Paz. Primeiro, a paz pessoal e social. A paz pessoal é a união entre os apetites e os desejos do indivíduo, enquanto a paz social é a concórdia, ou união de vontades de pessoas diferentes. A paz integral – tanto pessoal como social – é a paz radicada nas profundezas da alma do indivíduo, enquanto pessoa e ser social. João Paulo II acentua a paz social como paz universal: “A paz ou é para todos ou para ninguém” (Sollicitudo Rei Socialis nº 26).
São Tomás também fala da paz verdadeira e da paz falsa. A paz verdadeira “diz respeito apenas ao que é bom”; encontramo-la nas pessoas boas, enquanto a paz falsa está relacionada com as coisas más, sendo fértil no coração dos homens e mulheres ímpios.
O “Doutor Angélico” distingue, finalmente, entre paz perfeita e paz imperfeita. Com Santo Agostinho, ele descreve a paz perfeita como o fim último, a felicidade completa e a posse de Deus no céu. A paz perfeita é a paz escatológica, a paz no fim dos tempos, uma paz que temos de antecipar (ainda que de modo imperfeito) neste mundo, através da nossa pacificação. A paz na terra é, então, uma paz imperfeita, logo, um processo ilimitado em direcção à perfeição, em direcção à paz escatológica, em direcção ao céu.
QUATRO COLUNAS DA PAZ (MAIS UMA)
As quatro colunas clássicas para a construção da Paz são a liberdade, a verdade, a justiça e o amor (Pacem in Terris nº 35).
1– Liberdade: a Paz baseia-se na liberdade, na verdadeira liberdade, que é liberdade para o bem, liberdade para amar. A verdadeira liberdade constrói a Paz, se – na escolha dos meios para atingir um fim pacífico – as pessoas agirem de forma razoável, livre, responsável e não violenta. De facto, “a paz e o progresso só podem ser alcançados se respeitarmos a lei moral universal escrita no coração humano” (João Paulo II, Mensagem, 1 de Janeiro de 2003).
A falsa liberdade, por outro lado, é o abuso da liberdade, a liberdade para fazer o mal: “Eu vos digo solenemente: todo aquele que comete pecado é escravo do pecado” (Jo., 8, 34). Esta é a liberdade que Agostinho tinha antes da sua conversão, ou seja, “a liberdade de um escravo fugitivo” (Confissões).
2– Verdade: Jesus afirmou: «A verdade vos libertará» (Jo., 8, 32). “A verdade é a força motriz da paz porque revela e realiza a unidade do homem com Deus, consigo mesmo e com os outros” (João Paulo II, Mensagem, 1 de Janeiro de 1980). A pessoa humana tem que ser fiel a si mesma. Os seres humanos têm que fazer a jornada de um falso eu (guerreiro, egoísta, lascivo, pecaminoso), para um verdadeiro eu (pacífico, livre, responsável e aberto aos outros na justiça e no amor). A pessoa humana verdadeiramente livre e responsável é obrigada a conhecer a verdade, a dizer a verdade e a praticar a verdade no amor.
A verdade é necessária para construir a Paz: a verdade constrói a Paz se cada indivíduo estiver consciente dos seus direitos e dos deveres para com os outros. Mas atenção: “Aqueles que reivindicam os seus próprios direitos, mas esquecem ou negligenciam totalmente o cumprimento dos respectivos deveres, são pessoas que constroem com uma mão e destroem com a outra” (João XXIII, Pacem in Terris nos 39 e 91).
3– Justiça: Justiça significa dar a cada pessoa o que lhe é devido, ou seja, os direitos humanos fundamentais. Está essencialmente ligada à Paz: «O efeito da justiça será a paz» (Is., 32, 17); «A justiça e a paz beijar-se-ão» (Sl., 85, 10). A Paz é obra da justiça: “Se queres a paz, trabalha pela justiça” (Paulo VI, Mensagem, 1 de Janeiro de 1972). “O dever fundamental do poder é a solicitude pelo bem comum da sociedade” (João Paulo II, Redemptor Hominis nº 17). Bento XVI cita Santo Agostinho em Deus Caritas Est nº 26: “Um Estado que não seja governado segundo a justiça será apenas um bando de ladrões”.
A virtude da justiça obriga todos a denunciarem a injustiça, a praticarem a justiça e a promoverem a justiça. Muitas vezes, parece que a justiça é a virtude e o valor mais importante da vida social. Não é: o amor é-o. Separada do amor, a justiça pode ser uma “justiça injusta”, uma espécie de “olho por olho”. Sem amor, o outro é um estranho, simplesmente um estranho. Consequentemente, não há amor sem justiça, mas também não há justiça sem amor.
4– Amor: A Paz está principalmente ligada ao amor, à caridade (a forma prática de todas as virtudes e valores). João Paulo II: “Quando o bem vence o mal, prevalece o amor, e onde prevalece o amor, aí prevalece a paz” (Mensagem, 1 de Janeiro de 2005). A Paz também é obra da solidariedade. A solidariedade, ou o amor prático pelo próximo, caminhando juntos (sinodal-aliado), está enraizada na justiça. A justiça e o amor são as principais causas da Paz.
Uma definição actual de Paz: “Paz é viver juntos na justiça e no amor. Este amor é universal e prioriza o amor aos pobres e marginalizados. A autêntica paz global é composta por três elementos essenciais: verdade, justiça e misericórdia” (Papa Francisco, Fratelli Tutti nº 227).
Justiça e amor perdoam: “Não há paz sem justiça. Não há justiça sem perdão” (Mensagem 1 de Janeiro de 2002). A Paz implica “dizer não à vingança, reconhecer as injustiças, aceitar desculpas sem procurá-las e, finalmente, perdoar” (Bento XVI, Mensagem, 1 de Janeiro de 2013).
5– A vida humana – a tal quinta coluna da Paz: Esta implica o respeito pela vida humana desde o seu início até ao seu fim, e entre o início e o fim a vida tem de ser digna para todos.
Paulo VI acrescenta: o desenvolvimento autêntico “é o novo nome da paz”. O desenvolvimento integral autêntico é a transição de condições menos humanas para condições mais humanas, a promoção do bem de cada homem e de todo o homem na solidariedade com todos (Populorum Progressio). Bento XVI adverte-nos: o “superdesenvolvimento” pode ser acompanhado pelo “subdesenvolvimento moral”, e nesse caso não se trata de um desenvolvimento autêntico (cf. Bento XVI, Caritas in Veritate nº 29).
A Paz é o objectivo da vida social: Os meios para alcançar a Paz também devem ser pacíficos. Costumava-se dizer (ligado à teoria da “guerra justa”): “Se queres a paz, prepara-te para a guerra”. No entanto, o que deveria ser dito era: “Se queres a paz, prepare-te para a paz”.
“A paz é o caminho para a paz. Não há caminho para a paz, a paz é o caminho” (Mahatma Gandhi).
Pe. Fausto Gomez, OP