Diversificação pouco conveniente
É sobejamente conhecida a necessidade de diversificar o tecido económico de Macau, medida que o Governo da RAEM se comprometeu a pôr em prática e conta com o apoio de Pequim.
Resta saber o porquê de tantos obstáculos!? Embora conheça algumas razões acessórias, não vou descrevê-las, pois há algo mais interessante para ser abordado: nos dias que correm, ao contrário do que se possa imaginar, a não diversificação até é um bom sinal para Macau.
Olhando para a realidade de Hong Kong, percebe-se que o “establishment” (e as oligarquias vigentes) domina vários sectores cruciais daquela economia, razão pela qual se torna difícil implementar qualquer medida fortemente “inspirada” pelo Poder Central, porque a acontecer iria contra os interesses instalados.
Para fazerem prevalecer os seus intentos, são forças que não têm pejo em provocar graves prejuízos na ex-colónia britânica, até mesmo apoiando movimentos separatistas, o que em abono da verdade pode levar a repercussões imprevisíveis no continente chinês.
Tal realidade é impossível de suceder na RAEM, graças à legislação sobre o Artigo 23º da Lei Básica, não invalidando, porém, que o “establishment” local procure outras formas de fazer prevalecer os seus interesses.
E porque o motor da economia de Macau assenta na indústria do Jogo, é preciso entender que a liberalização do sector veio espartilhar o poder até então concentrado num determinado grupo de interesses. Torna-se assim mais fácil de perceber por que razão até nem é muito grave se não avançar nos próximos tempos a tão ambicionada diversificação económica. Em suma: até 2019 há um bem superior a zelar!
Em qualquer um dos casos, no futuro, a diversificação económica servirá sempre para proteger a RAEM contra agentes externos e contra a consolidação do poder em alguns grupos, embora recentes, mas existentes. Afinal, até há males que vêm por bem…
Para além da Lei de Terras
Cada vez menos percebo o que se passa em Macau e por que razão algumas personalidades adoptam certo tipo de posições sobre algumas matérias com inegável reflexo na sociedade.
Parece que a vigente Lei de Terras não só é um bicho papão, como tem feito muito mal à economia e, por arrasto, a todos nós. Os argumentos são conhecidos. Todavia, permita-me o leitor que o ajude a compreender melhor o que ainda foi pouco explicado.
De acordo com o Artigo 36º do Decreto Lei 79/85/M, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) tem certos prazos – entre trinta e sessenta dias – para se pronunciar sobre as diferentes etapas por que passam as obras de construção.
De igual forma, “o director da DSSOPT, em despacho fundamentado, que será notificado ao requerente, poderá prorrogar os prazos, antes de terem expirado, até ao seu dobro”.
Já o Artigo 37º é esclarecedor: “Não havendo resolução dentro dos prazos fixados no artigo anterior, o requerente poderá dar início às obras projectadas, trinta dias após comunicação por escrito feita à DSSOPT, sujeitando todavia os projectos a tudo o que se encontra disposto no presente regulamento ou quaisquer outras disposições aplicáveis e ficando sujeito a todas as penalidades previstas, com excepção da falta de licença”.
Nesta linha de ideias, “a falta de resolução no prazo fixado para tal fim relativamente ao ante-projecto de obra não dispensa o requerente da apresentação do respectivo projecto de obra”.
Por outro lado, ao dar uma olhadela no Código do Procedimento Administrativo percebi, pela leitura do Artigo 101º, que “se a decisão não for proferida no prazo estabelecido por lei, as autorizações ou aprovações solicitadas apenas se consideram concedidas nos casos em que leis especiais prevejam o deferimento tácito”.
E “quando a lei não fixar prazo especial, o prazo de produção do deferimento tácito é de noventa dias a contar da formulação do pedido ou da apresentação do processo para esse efeito”, sustenta a disposição legal, acrescentando que “os prazos previstos nos números anteriores suspendem-se sempre que o procedimento estiver parado por motivo imputável ao interessado”.
Mais elucidado fiquei com o Artigo 102º: “sem prejuízo do disposto no artigo anterior, a falta, no prazo fixado para a sua emissão, de decisão final sobre pretensão dirigida a órgão administrativo competente confere ao interessado, salvo disposição em contrário, a faculdade de presumir indeferida essa pretensão, para poder exercer o respectivo meio legal de impugnação”.
Em termos gerais, se os donos das obras ou quaisquer interessados nos aproveitamentos dos terrenos quiserem mesmo avançar, têm armas para forçar o Governo a decidir. Claro que se os pedidos dos interessados não couberem dentro dos termos da lei – e dos contratos de concessão publicados no Boletim Oficial – então nada haverá a fazer. Posto isto, afinal do que se queixam Gabriel Tong e Manuela António?
PEDRO DANIEL OLIVEIRA