Olhando em Redor

As lições da Assembleia

Os problemas relacionados com o caso Pearl Horizon, acerca da caducidade do lote de terreno que deveria ser explorado em tempo útil, e os terrenos das zonas C e D da Nam Van, que entram em caducidade este ano, estão a pôr a nu as fragilidades de muitos deputados com interesses no sector empresarial.

Pelo seu tom mordaz, bastante crítico e irreverente, Fong Chi Keong parece ser o maestro de uma orquestra com sérios problemas de afinação.

A Lei de Terras é visada neste imbróglio, mais concretamente por causa da alegada promessa de Lau Si Io de que a caducidade dos terrenos não seria um problema no futuro. O então secretário para os Transportes e Obras Públicas terá manifestado esta garantia em várias reuniões da 1ª Comissão Permanente da Assembleia Legislativa.

Ora, sabe-se que a Lei de Terras foi aprovada pelo plenário, na especialidade, a 12 de Agosto de 2013. E sabe-se que as eleições legislativas, pelos sufrágios directo e indirecto, aconteceram no mês seguinte, ou seja, a 15 de Setembro. É caso para questionar: para além da «pressão imensa que vinha do Governo Central» para aprovar a revisão da Lei de Terras, conforme revelou uma fonte ao Hoje Macau, face à proximidade das legislativas, que promessas terão deixado alguns deputados a determinados investidores ou grupos empresariais?

É certo que Raimundo do Rosário não é responsável pelo que aconteceu durante o consulado do seu antecessor na pasta dos Transportes e Obras Públicas. De igual forma, também já reiterou que a sua actuação se pautará pelo estrito cumprimento das leis em vigor.

Um pormenor salta à vista: Lau Si Io foi várias vezes à Assembleia Legislativa, onde o acusaram de pouco ou nada fazer para avançar nas questões que diziam respeito às grandes obras públicas e aos projectos de menor envergadura.

Se esta sua característica já estava identificada à partida, e sabendo de antemão que Lau Si Io era um dos secretários menos populares do Executivo, podendo inclusivamente ser substituído no final do ano seguinte, como terá sido possível que alguém fosse acreditar que ele iria fazer alguma coisa relativa à caducidade dos terrenos?

Sou levado a pensar que uns terão sido levados pela ingenuidade, enquanto outros não estarão a contar todas as peripécias que pintam esta novela algo rocambolesca.

Já se percebeu há muito que o lóbi empresarial criou tentáculos na Assembleia Legislativa, como é o caso a vincada relação que mantém com o poder económico, seja pela via da Saúde, seja pela via da construção civil, do imobiliário ou das operadoras de Jogo. Pelo menos alguns deputados eram mais discretos nos três primeiros mandatos dos dois Chefes do Executivo…

Quanto ao futuro, e vendo os sinais que partem de Pequim, não me admira nada se uma das medidas fortes do Governo da RAEM for a apresentação de uma proposta de lei, na Assembleia Legislativa, para reformular o sistema político vigente, por forma a diminuir o número de deputados eleitos pelo sufrágio indirecto. Aí sim, certamente vai “cair o Carmo e a Trindade” na dita Assembleia.

 

Trocas comerciais

Os dados dos Serviços de Alfândega da China publicados no portal do Fórum Macau revelam que as trocas comerciais entre a China e os Países de Língua Portuguesa (PLP) desceram 25,84% até Novembro último, fixando-se em 90,90 mil milhões de dólares.

No computo geral, a China comprou aos PLP bens avaliados em 57,50 mil milhões de dólares (menos 29%) e vendeu produtos no valor de 33,39 mil milhões (menos 19,68%), mantendo-se o Brasil como o principal parceiro económico do gigante asiático.

É natural que o volume de trocas comerciais continue a decair nos próximos anos, porque a China pretende fomentar cada vez mais o consumo interno com o intuito de equilibrar o modelo de crescimento económico e não estar tão virada, como anteriormente, para as importações e as exportações.

 

Charlie Hebdo

Não venho “puxar a brasa à minha sardinha”, até porque já tenho opinião formada sobre o assunto há muitos meses, mas o comentário do L’Osservatore Romano sobre a capa do jornal satírico Charlie Hebdo, que chegou às bancas na passada quarta-feira, só vem confirmar o quão cego anda o mundo ocidental em geral.

«Sob a bandeira de um secularismo sem compromissos, o semanário francês volta a esquecer o que os líderes religiosos de todas as fés pedem há muito: a rejeição da violência em nome da religião, e que usar Deus para justificar o ódio é uma verdadeira blasfémia», refere o jornal do Vaticano, numa reacção à capa em que se vê um deus de barbas, com vestes ensanguentadas e uma arma às costas, acompanhado da frase: “Um ano depois o assassino continua à solta”.

No fundo, o Charlie Hebdo é o espelho mais elementar da crise de valores que assola um pouco todo o mundo ocidental. Nada justifica a carnificina perpetrada por radicais islâmicos a 7 de Janeiro de 2015, na qual resultaram 12 mortos, vários deles ilustradores do semanário satírico. Contudo, a liberdade de expressão não é um direito ilimitado, nem um salvo-conduto para atropelar, insultar e ofender – neste caso – as crenças religiosas.

PEDRO DANIEL OLIVEIRA

pedrodanielhk@hotmail.com

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