Tempo de unir esforços
Nos meus tempos de adolescente aprendi nos bancos da escola que os mouros eram infiéis e que os portugueses os expulsaram do território que delimita Portugal. Durante anos a fio olhei com desconfiança para qualquer maometano, e só consegui mudar de opinião após aturada pesquisa, apenas desenvolvida por uma assaz curiosidade em conhecer a fundo o mundo onde estou inserido.
Posso agora dizer que me ensinaram uma História deturpada, cheia de vícios e preconceitos, que poderão ter contribuído para que muitos outros compreendam pouco os muçulmanos e ostracizem, no seu pensamento, quem segue o Alcorão.
Nada mais errado, porque muitas vezes católicos e muçulmanos fomentaram alianças ao longo dos tempos, sendo disso exemplo a registada entre D. Afonso Henriques e Ibn Qasi, grande mestre do sufismo (corrente mística do Islão), que fundou o movimento dos muridinos e conquistou as taifas de Sines e de Mértola, combatendo, para isso, os almorávidas.
No mundo islâmico também podemos encontrar concepções erradas que têm levado à intolerância, havendo inclusivamente perseguições étnicas e religiosas contra quem não professa a lei do profeta Muhammad ibn Abdullah (Maomet).
O recente surgimento em força da organização sunita da ISIS, que auto-proclama um califado denominado Estado Islâmico, prevendo inclusivamente que a Península Ibérica possa ser reconquistada dentro de cinco anos, é a essência mais pura do fanatismo religioso.
As ameaças são para levar a sério, pois o desenvolvimento civilizacional do século XXI já não tem espaço para as atrocidades cometidas pela ISIS, em tudo semelhantes ao que sucedia há mais de quinhentos anos, como são os casos das brutais mortes colectivas de quem os jihadistas do Estado Islâmico consideram infiéis, sejam muçulmanos (xiitas e sunitas) ou não (yazidis e cristãos).
Há inclusivamente casos de crucificações e degolações de cristãos no Iraque e na Síria, assim como de famílias inteiras enterradas vivas, por se recusarem a converter ao islamismo. Ademais, também muitos muçulmanos estão a fugir dos locais controlados pela ISIS, porque não querem que os seus filhos vejam os horrores, nem estão para viver mediante as brutais políticas da sharia (lei islâmica) implementadas pelos jihadistas do auto-proclamado Estado Islâmico.
As atrocidades cometidas no Iraque e na Síria levaram recentemente o grande mufti Sheikh Abdulaziz Al al-Sheikh, a maior autoridade da lei religiosa da Arábia Saudita (país de maioria sunita e um dos mais restritos em termos de liberdade religiosa no mundo muçulmano) a considerar os grupos militantes da ISIS e da al-Qaeda como «inimigos número um do Islão», porque as suas revoltas violentas em nada estão de acordo com a fé.
A tomada de posição é bastante significativa, porque a Arábia Saudita é a casa espiritual do wahhabismo, corrente islâmica inspirada no clérigo do século XVIII, Muhammad ibn Abd al-Wahhab, de quem geralmente se diz ser o pai do fundamentalismo islâmico.
Mensagem
A ideologia da ISIS é totalmente desprovida de sentido e está contra a crença de Maomet, que na verdade até celebrava os seus amigos cristãos. No “Ashtiname” (Livro da Paz), ratificado pelo profeta islâmico, foram garantidas protecções e privilégios aos clérigos cristãos do Mosteiro de Santa Catarina, no Monte Sinai.
«Esta é a mensagem de Muhammad ibn Abdullah, como pacto dos que adoptaram a cristandade, perto e longe, estamos com eles. Na verdade eu, os servos, os ajudantes e os meus seguidores defendemos-lhes, porque os cristãos são meus cidadãos; e por Alá! Resisto contra qualquer coisa que lhes desagrade», refere o documento.
«(…) Ninguém os força a viajar ou os obriga a lutar. Os muçulmanos são para lutar por eles. Se uma mulher cristã é casada com um muçulmano, não é para ser sem o seu consentimento. Ela não pode ser privada de visitar a sua igreja para rezar. (…) As suas igrejas são para serem respeitadas. (…) Ninguém da nação [muçulmana] pode desobedecer ao pacto até ao Último Dia [fim do mundo]», continua o original do pacto, que se encontra no Museu de Topkapi, em Istambul (Turquia).
Com efeito, está na hora de muçulmanos e cristãos unirem esforços e, conjuntamente, lutarem contra a principal ameaça que mina as duas religiões: o fanatismo e o extremismo a qualquer preço, sem respeito pelos valores humanos e desprendido de qualquer tipo de ética. Convém também que o Ocidente conheça melhor o mundo muçulmano, a começar pelos bancos da escola.
Acima de tudo, o Ocidente não pode impor as suas vontades e conceitos em países ou civilizações com uma outra forma de viver e de se relacionar. Há que cooperar, promovendo o entendimento mútuo, em vez de a salvo de interesses dúbios e manipulativos querer controlar o mundo através dos ideais democráticos, que não mais servem do que alimentar a indústria do armamento, a cobiça em torno do petróleo ou as ambições políticas de uns quantos, sempre em detrimento dos interesses maiores das nações onde foram eleitos. No fundo, a ISIS é o resultados de todas estas “distracções”.
PEDRO DANIEL OLIVEIRA
pedrodanielhk@hotmail.com