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Esta é (apesar de tudo…) uma conversa de férias. Uma conversa sobre vários aspectos do nosso tempo. Sentados eu e os meus leitores, tranquilamente, numa esplanada qualquer, com uma vista de mar ou de rio, de floresta ou montanha, para onde estender o olhar.
Conversa-se hoje tão pouco! Desde logo porque, de forma profundamente perversa, a nossa época atribuiu à conversa a conotação duvidosa de exercício de gente pouco produtiva, que gosta de nada fazer, que substituiu o fazer pelo falar.
Antigamente (que palavra horrível, não é?) conversar era arte e era cultura, era meditação e era enriquecimento intelectual e espiritual em conjunto. Mas… tempo é dinheiro… E assim nasceu a ditadura do trabalho ininterrupto, com os seus seguidores, aqueles que nada sabem fazer senão… trabalhar!
Mas conversa-se cada vez menos porque se está também e cada vez mais na televisão ou na Net. Muitas vezes a conversar. De uma outra maneira mas a conversar, encurtando distâncias que a geografia, a imigração, a doença, a profissão impuseram.
O silêncio é aqui o pressuposto de uma outra forma de diálogo (de monólogo?) com o mundo. Estar sozinho é estar acompanhado de outra maneira.
E o livro, como companheiro?
Por tudo isto, receio que os jovens de hoje não apreciem a literatura com o mesmo interesse e a mesma “paixão” dos jovens do meu tempo, isto é, de há meio século.
Com a revolução da comunicação e dos multimedia, os livros (e os jornais e revistas em papel) deixaram de ser a fonte quase exclusiva de conhecimento e interpretação do mundo. Foram substituídos pela televisão, pela Internet e, mais recentemente, pelas redes sociais.
E pela interpenetração entre eles, como acontece nos debates da TV, onde os telespectadores vão reagindo às ideias expostas, através do Twitter, do Facebook ou similares que o apresentador vai lendo e submetendo a discussão, recebidas no seu tablet…
Neste contexto mediático novo, receio que a escrita se tenha tornado uma forma de expressão menos rica, do ponto de vista do conhecimento da realidade.
Do meramente imaginado passou-se ao visualizado. Do mediato da narrativa e da “distância” entre narrador-e-leitor passou-se ao realismo por vezes cru, ou muito cru, das imagens em directo. Com a pobreza também de que quase nada necessita já de ser imaginado.
A imaginação de outrora não era necessariamente um meio de idealizar a realidade, mas de lhe conferir distância, contexto. E o tempo da apreciação crítica.
O imediatismo informativo que nos governa privou-nos disso tudo, tornando-nos mais vulneráveis à manipulação e à mediocridade, ao basismo dos conteúdos “zero” ou à invasão grosseira da nossa privacidade e do nosso tempo, pela publicidade enganosa. Com a pretensa vantagem de sabermos mais e mais depressa. Vantagem ou não tanto assim?
Conhecemos mais do mundo. Mas como o conhecemos – eis a grande questão.
Bibliófilo confesso…
Foi há menos de uma década que me dei conta de que, na competição entre literatura impressa e jornais e revistas que se desfolhavam com deleite, por um lado; e os novos media por outro, o clássico livro de capa encadernada ou cartonada havia perdido a corrida, em favor do livro digital e das outras formas online de informação e cultura. Um mal ou um bem?
E questões conexas multiplicam-se: o livro em papel vai acabar? As bibliotecas, tais como as conhecemos, serão a prazo encerradas por falta de leitores e votadas a ratazanas vorazes do seu precioso papel?
Para mim, esta foi sempre uma falsa questão. O progresso do conhecimento humano vem ocorrendo com recurso a formas sempre inovadoras – e complementares – de divulgação do que se vai descobrindo e aprendendo. Não é preciso excluir nada, embora a rapidez dos meios digitais tenha resolvido num ápice os constrangimentos da geografia e das… alfândegas, essas barreiras da burocracia e do fisco em que a geografia se divide.
Que o diga a Amazon que se tornou, à escala mundial, num dos negócios mais próspero da distribuição instantânea de produtos culturais e outros. Li há dias que o Senhor Bezos, detentor de dezoito por cento das acções da Amazon, é um dos homens mais ricos do mundo. Et pour cause…
A crueza das imagens
O livro tradicional filtrava a realidade através da “opacidade” do texto escrito. As frases escritas desvendavam só parcialmente a realidade narrada.
O monopólio da imagem despiu o mundo do que havia ainda de pudor e nuance. E assim mata-se em directo, morre-se em directo, faz-se a guerra em directo. Mas também salva-se, e cura-se, reconforta-se e ajuda-se em directo. E reza-se em directo.
Da Praça de São Pedro apinhada de gente aos lugares santos de Meca, das margens do Ganges aos templos budistas e shintoistas do Japão e da China, reza-se em directo. Ao mesmo ser supremo.
As imagens hoje, mais do que nunca, ajudam a consolidar sentidos de vida, definem opções, influenciam comportamentos, constroem visões do mundo. Para bem, mas infelizmente também para mal.
Visões do mundo, disse. As que são forjadas pela Net, por exemplo, nas cabeças de jovens desenraizados, da sua comunidade e dos seus valores tradicionais, e assimilam a violência como panaceia para todos os males.
É a crueza das imagens a impor a sua força persuasiva a jovens frágeis, de espírito receptivo a qualquer demagogia que os tenha como alvo.
Imagens e ideias do Bem
Olho para as cenas que se multiplicam da visita do Papa à Polónia e confirmo naturalmente a força poderosa das cenas filmadas e logo retransmitidas, de uma jornada extraordinária, de convivência com a juventude de todo o mundo.
Na Polónia, a pátria de João Paulo II, um dos ícones incontornáveis do nosso tempo. Como Nelson Mandela e poucos outros.
A força poderosíssima das imagens, veículos de ideias e valores cristãos. Por um mundo melhor. E é por esse mundo melhor que o Papa quer um maior compromisso dos jovens com a solidariedade social e a política.
Menos horas nos computadores e mais horas a ajudar quem precisa, propôs Francisco a milhares e milhares de adolescentes, sedentos de uma palavra de direcção, conforto e esperança.
O Papa, como só ele o sabe fazer, correspondeu com energia, presença e Fé.
Carlos Frota
Universidade de São José