Os meus filhos são únicos. São mesmo únicos e, apesar do esforço para que as regras e os valores sejam iguais para todos, não é verdade que eu sou a mesma mãe para todos e que a nossa educação é igual para todos. Educar é ajudar a crescer e, para crescer, cada filho precisa de coisas distintas, com ritmos diferentes, em doses específicas. Talvez, por isso, importe ir parando para olhar para cada um deles com toda a atenção.
Todos são completamente diferentes em temperamento, modo de fazer, nível de confiança e apetências (pelo menos, naqueles que já é possível apreciar este tipo de questões), mas todos têm algo que me transporta para mim própria, que me transporta para o meu marido ou para algum familiar mais próximo.
O meu mais velho, por exemplo, lembra-me o meu pai, por estar, frequentemente distraído, por não dar grande importância a detalhes, por gostar de fazer os outros felizes. Ao mesmo tempo, tem uma insegurança que recorda os meus tempos de infância e de juventude. Uma sensação permanente de incapacidade e de inferioridade, que é combatida sendo generoso e dedicado.
O meu segundo faz-me lembrar o meu tio, pelo charme no olhar e pela confiança sedutora que transmite. Faz lembrar aquelas pessoas que tão bem estão em grupo, como em solidão se o grupo não lhe for atractivo. Tem uma curiosidade insaciável, porque quer saber de tudo para poder falar de tudo e estar por cima de todas as conversas. Tudo isto com bastante charme, o que chateia e inebria, simultaneamente.
A terceira tem um temperamento forte, que olha o detalhe e que memoriza tudo. Tem uma veia dramática, rasando o teatral que me lembra o meu pai e a mim própria, porque ambos gostamos de teatralizar e de dar efeito a determinadas histórias. Também me faz lembrar outra pessoa de família, pela forma como se enreda numa certa dose de teimosia, mesmo que para isso tenha de ser algo fria ou demasiado pragmática.
O quarto é um “mix” de doçura e meiguice, com aspereza e impulsividade. Às vezes, parece que é metade criancinha de quatro anos, com rapaz de doze. Lembra-me o meu marido, até por semelhanças faciais e pela capacidade de comer a qualquer hora, mas também por esta simbiose estranha entre afecto e rijeza. Agora que falo, lembro-me do meu sogro. Tem um olhar semelhante, de quem sente bem a ternura, mas também de quem está sempre pronto para a agarrar o toiro.
Mas este meu filho também tem algo de mim. Ambos somos medricas. Já o era quando criança e há certas coisas que ainda se mantêm. Este meu filho tem medo de qualquer cão ou gato e fica apavorado face a qualquer mascarado. Corre logo para a saia da mãe em alto pranto. O melhor disto é que este meu filho dá os melhores abraços do mundo e arredores.
O quinto ainda é muito pequenote, mas faz-me lembrar o segundo e, sobretudo, faz-me lembrar o meu avô paterno. Um olhar claro super atraente, que nos derrete de alto a baixo, acompanhado de uma esperteza, de quem vê muito para lá do que é visível e de quem sabe o que quer.
Para já, os recursos disponíveis são os normais para a idade. A birra com lágrima e tudo mais que não vale a pena nomear. As dentadinhas pequeninas, mas que ultrapassam toda a grossura do vestuário e que doem muito. A fuga com os brinquedos dos outros ou com as peças do jogo que os mais velhos estavam a tentar empreender. E, para além disso, tem um olhar para o tecto que é qualquer coisa.
Ainda que a longo prazo este facto me assuste um pouco, se calhar os nossos filhos têm mais de nós e da nossa família do que pensamos. Apavora-me que eles venham a cometer erros que já cometemos, que já vimos, de que já nos falaram, mas, certamente, que haverá coisas que conseguiremos e poderemos evitar, mas outras haverá que não terão grande escapatória!
Tudo a seu tempo.
RITA GONÇALVES
Professora